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África terá presença mínima em negociações climáticas

Mercy Hlordz, Akos Matsiador e Mary Azametsi (da esquerda para a direita) são vítimas da mudança climática. Foto: Jamila Akweley Oekrtchiri/IPS
Mercy Hlordz, Akos Matsiador e Mary Azametsi (da esquerda para a direita) são vítimas da mudança climática. Foto: Jamila Akweley Oekrtchiri/IPS

 

Iaundé, Camarões, 16/10/2014 – Tudo faz pensar que a África terá uma representação mínima nas próximas negociações da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudança climática: a COP 20, que acontecerá em dezembro em Lima, no Peru, e a crucial COP 21, um ano depois, em Paris.

A Comissão de Florestas da África Central (Comifac) terá uma reunião preparatória este mês com especialistas e delegados de seus dez países membros, informou Martin Tadoum, subsecretário-geral da organização, “mas o grupo só poderá enviar um ou dois representantes às reuniões da COP” (Conferência das Partes) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a mudança climática, acrescentou.

No entanto, a Rede Pan-Africana de Parlamentares sobre a Mudança Climática (PAPNCC) tem a esperança de educar os legisladores e cidadãos africanos sobre o problema para que tomem decisões informadas. “Os parlamentares africanos têm um papel importante ao influírem nas decisões do governo sobre a mudança climática e defender as reclamações dos diversos grupos do continente”, apontou à IPS Awudu Mbaya, legislador camaronês e presidente da PAPNCC.

Essa rede, com sede em Camarões, opera em 38 países africanos. Além de colaborar com os governos, trabalha com grupos de jovens e da sociedade civil em favor dos objetivos climáticos. Modelos inovadores de colaboração entre o Estado, a sociedade civil, centros de pesquisa e o mundo acadêmico também poderiam fortalecer a posição dos governos e a capacidade dos negociadores.

A Comissão Econômica das Nações Unidas para a África observou que as negociações entre as partes acontecem cada vez mais fora dos espaços formais, por isso a África deve estar preparada para participar das diferentes plataformas para não ficar excluída. A sociedade civil elabora várias estratégias de campanha para a COP 20 e a COP 21. A Aliança Pan-Africana de Justiça Climática (PACJA), uma coalizão de mais de 500 organizações e redes, utiliza as plataformas nacionais e coordenadores locais para planejar uma semana de atividades em novembro.

“A Semana de Ação da PAJCA é uma iniciativa anual em toda a África destinada a estimular as ações e reforçar os esforços para exercer o poder da ação coletiva antes das COPs. Haverá atividades como piquetes, manifestações, marchas e outras formas de ação em escolas, comunidades, locais de trabalho e espaços públicos”, explicou Robert Muthami Kthuku, representante da organização, na sede da mesma no Quênia.

A Iniciativa da Juventude Africana sobre a Mudança Climática e a Aliança da Juventude Africana também planejam estratégias semelhantes para proporcionar uma plataforma de participação aos jovens nas discussões sobre o clima e a agenda de desenvolvimento pós-2015. “Temos a intenção de enviar cartas aos negociadores, divulgar declarações, utilizar as redes sociais, as mídias eletrônicas e impressas e realizar fóruns públicos. Também estamos adotando lemas para melhorar a campanha”, ressaltou Kithuku.

A vulnerabilidade da África diante da mudança climática gerou uma onda de colaboração Sul-Sul no continente. O capítulo da PAPNCC em Camarões se associou à PACJA para defender um compromisso maior com o tema mediante o plantio de árvores em quatro localidades do país. Também dialoga com legisladores da região sobre a forma de incorporar a mudança climática à legislação local.

Em junho, os prefeitos da África central se reuniram em Camarões para planejar sua participação na COP 21 na capital francesa. Sob a bandeira da Associação Internacional de Prefeitos de Francófonos da África Central sobre as Cidades e a Mudança Climática, as autoridades buscam maneiras de adaptar suas cidades às consequências da mudança climática e fomentar o desenvolvimento mediante a mitigação das emissões de dióxido de carbono.

O Grupo Africano de Negociadores reconheceu em um painel realizado em maio que as negociações oferecem oportunidades à África para fortalecer sua capacidade de adaptação e de avançar para o desenvolvimento econômico baixo em carbono. Apesar da escassez de recursos financeiros, o continente tem uma vantagem comparativa em termos de recursos naturais como as florestas, e as energias hidrelétrica e solar.

Nessa ocasião, o ministro de Ambiente e Florestas da Etiópia, Belete Tafere, exortou os negociadores a serem ambiciosos para pressionar os maiores emissores de gases-estufa a assumirem compromissos vinculantes para reduzir suas emissões. Também os aconselhou a priorizarem a mitigação como uma estratégia para demonstrar a contribuição do continente para uma solução mundial.

Mas os obstáculos persistem. A África tem menos recursos financeiros para enviar delegados às COPs, junto com um nível de conhecimentos relativamente baixo para entender as questões técnicas das negociações. “A África é apenas mais um dos representantes nas negociações e tem pouca capacidade para influir nas decisões que forem tomadas”, pontuou Tomothé Kagombet, um dos principais negociadores de Camarões.

“A maioria de nossos problemas é de caráter financeiro. Por exemplo, nas negociações, Camarões está sentado junto ao Canadá, que vem com uma delegação com uma centena de pessoas, enquanto haverá apenas dois representantes camaroneses, e esse é o caso dos demais países africanos”, detalhou Kagombet. Os países industrializados podem rodar seus delegados e especialistas, enquanto os africanos, por seu pequeno número, devem permanecer na mesa de negociações por longos períodos sem um descanso, acrescentou.

Como uma estratégia para melhorar a capacidade dos delegados, a Cofimac contratou consultores para capacitar os representantes de seus dez países membros sobre as diversas questões técnicas das negociações. “Para reduzir o problema do número, a estratégia é que um país seja designado para representar o grupo em um dos temas em negociação. Por exemplo, o Chade poderia continuar debatendo sobre a adaptação, Camarões sobre mitigação, República Democrática do Congo em matéria de financiamento”, explicou Tadoum.

“A Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática patrocina um ou dois representantes do Sul em desenvolvimento, mas o conjunto da África pode não superar a quantidade de delegados de um só país desenvolvido”, enfatizou Kaombet. Envolverde/IPS