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Agricultura urbana dá renda e alimentos a jordanianos pobres

A agricultura urbana está em moda na Jordânia. Foto: Qtea/CC BY 2.0
A agricultura urbana está em moda na Jordânia. Foto: Qtea/CC BY 2.0

 

Amã, Jordânia, 16/12/2013 – Flores crescem em pneus velhos, enquanto plantas de pimenta enchem embalagens de plástico reutilizadas e ervas surgem de antigos canos. Tão utilitário quanto alegre, esse terraço é um dos vários projetos de agricultura urbana que melhoram de modo significativo o sustento dos moradores pobres da Jordânia. A agricultura urbana é um fenômeno que cresce sem pressa, mas sem parar, nesse país, e tem um vasto potencial em matéria de redução da pobreza e melhoria da segurança alimentar.

Também tem o benefício agregado de tornar verdes e limpos mais setores deteriorados das cidades. Mas o sucesso da agricultura urbana depende de componentes fundamentais, que cada vez são mais difíceis de garantir: terra e água. O espaço para plantar diminui dia a dia no país, que sofre uma perpétua escassez hídrica. Embora esses problemas sejam importantes, também obrigam os jordanianos que praticam a agricultura urbana em Amã a criar respostas inovadoras e eficientes.

Quanto maior o êxito dessas respostas, mais valiosa se torna a agricultura urbana na Jordânia, onde dois terços dos 160 mil habitantes que sofrem insegurança alimentar vivem em cidades e onde 13% da população sobrevive abaixo da linha de pobreza. Para essas pessoas a agricultura urbana não é uma solução completa, mas alivia a pobreza e, no longo prazo, seus benefícios indiretos poderão se generalizar.

Um aumento demográfico sem barreiras e desenvolvimento urbano relativamente sem planejamento transformaram Amã, de uma aldeia na década de 1940, em uma vasta metrópole de mil quilômetros quadrados no século 21. Com 2,3 milhões de habitantes, a capital possui 312 habitantes por quilômetro quadrado, mais de quatro vezes a densidade nacional.

Embora a urbanização caótica não tenha criado a mais funcional das cidades, a descontrolada expansão resultante, na realidade, combina de modo bem harmônico com o conceito de agricultura urbana. Aproveita os espaços vazios que há entre as casas e os parapeitos das janelas, bem como sacadas e terraços, para plantar verduras, ervas e outras plantas que as famílias possam consumir ou vender para melhorar a renda.

Amã iniciou seu programa oficial de agricultura urbana em 2006, segundo Hesham al Omari, o engenheiro que está à frente do escritório do programa na Municipalidade da Grande Amã, como parte de uma iniciativa do internacional Centro de Recursos sobre Agricultura Urbana e Segurança Alimentar.

Embora criar hortas domésticas não seja algo novo na Jordânia, o programa da Municipalidade buscou multiplicá-las e torná-las mais eficientes, ajudando a população a começar a plantar em suas casas, dando-lhe, inclusive, os materiais para fazê-lo e organizando cursos para ensinar a cultivar a maior quantidade possível ao menor custo.

“Escolhemos materiais baratos para as pessoas”, disse Omari. Nos cursos ensina-se a reutilizar materiais como lata, saco plástico e madeira velha para plantar. Nos primeiros projetos foram plantadas algaroba e oliveira em uma área pobre do leste de Amã para prevenir a desertificação, e foram capacitadas mulheres de outro distrito no cultivo de ervas aromáticas e resistentes às secas.

Atualmente, o escritório organiza essas instâncias de capacitação em escolas e organizações de mulheres. “As frutas e as verduras nos mercados são caras, por isso se as pessoas podem produzi-las em suas cassas poderão economizar”, pontuou Omari. Ele estima que na capital existam pelo menos 400 hortas em terraços, e espera que um dia passem de mil.

Nos países árabes, que importam a maior parte de seus alimentos, e inclusive se espera que comprem mais nas próximas décadas, a segurança alimentar está sujeita ao constante aumento no preço dos alimentos. Assim, a agricultura urbana é uma maneira de melhorá-la, afirma um estudo do Centro Internacional para os Estudos Agronômicos Avançados no Mediterrâneo (Ciheam).

“Apesar de praticada há tempos, a agricultura urbana é pouco reconhecida por cientistas agrícolas, políticos, pesquisadores e inclusive pelos que a exercem”, segundo o Centro Internacional de Pesquisa sobre o Desenvolvimento, que financiou o trabalho do Ciheam, destacando o pouco valor que às vezes se dá ao cultivo nas cidades.

No terceiro país com maior escassez hídrica do mundo, gastar a preciosa água em hortas domésticas parece um luxo que os jordanianos não podem se dar. Por isso, a Municipalidade da Grande Amã também está ensinando os agricultores urbanos a fazer uso eficiente da água, mediante sistema de reciclagem de “água cinza” (as residuais das casas que não são de vasos sanitários), técnicas de irrigação e coleta de água da chuva. “No verão, temos pouquíssima água”, contou Jawla al Amayra, que vive na aldeia de Iraq al Amir, nos subúrbios do oeste de Amã, onde a Municipalidade realizou um de seus projetos de capacitação.

A fragmentação agrária e a urbanização também afetam de modo significativo a agricultura. Em regiões onde a redução da terra cultivada é mais severa, incluída Amã, entre 1975 e 2007, a terra destinada ao cultivo de grãos teve redução de 65%, e ao plantio de verduras 91%, segundo pesquisa do Programa Mundial de Alimentos e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O preço da terra também aumenta, por isso, se alguém tem um terreno vazio, o incentivo para vendê-lo é muito mais forte do que para trabalhá-lo, afirmou Omari.

Apesar desses desafios, o Centro Internacional de Pesquisa sobre o Desenvolvimento elogiou Amã, onde “o forte apoio municipal incentivou o desenvolvimento” da agricultura urbana. Além disso, uma vez que os participantes tenham terminado o curso de capacitação, transmitem os conhecimentos que adquiriram a vizinhos e amigos que não participaram do programa, ressaltou Omari.

O sucesso obtido em Amã cimentou o caminho para que outras cidades embarcassem em projetos semelhantes. Da população jordaniana, 82% é urbana, o que significa que a vasta maioria pode participar desse tipo de agricultura e colher os mesmos benefícios: renda extra, mais segurança alimentar e acesso a produtos frescos.

Um informe final do Centro de Recursos sobre Agricultura Urbana e Segurança Alimentar, a propósito de um dos projetos da Municipalidade da Grande Amã que financiou, se mostrou otimista sobre as perspectivas desse fenômeno, não só na capital, mas também no resto do país. E destacou que a agricultura urbana “se converteu em parte integral da agenda da Municipalidade, e a legislação se tornou mais amigável” com essa prática.

Graças à Municipalidade – observa o informe – a agricultura em cidades teve o apoio de altas esferas do governo. Na semana passada, o Ministério de Agricultura decidiu começar a vender árvores frutíferas jovens para o público a preços irrisórios, “para aumentar os espaços verdes na Jordânia, especialmente com cultivos e árvores que são economicamente viáveis”, enfatizou Nimer Haddadin, porta-voz do Ministério.

Entretanto, do ponto de vista de Omari, o governo não pode fazer tudo para difundir a agricultura urbana, embora tenha iniciado novos projetos em Jerash, no norte de Amã, e em Ain al Basha, no nordeste. “É necessária a ajuda do povo”, disse, sorrindo. Envolverde/IPS