Rio+20: ruptura ou ajuste?

Riocentro, onde ocorrerá a Rio+20.

Se você entende que há alguma razão para a mudança, manifeste-se. A Rio+20 é uma obra em construção. Ainda há tempo.

Diante do risco de a mais importante conferência do ano se transformar em uma “terapia de grupo”, onde o falatório e a papelada possam resultar em um novo acordo político genérico, convém prestar atenção desde já no posicionamento dos diferentes segmentos que marcarão presença na Rio +20.

Reunidos na PUC-RJ durante a conferência, aproximadamente 500 cientistas deverão compartilhar novas avaliações sobre o estado de fragilidade e degradação dos ecossistemas que  fornecem água, matéria-prima e energia à humanidade. De lá deverá surgir mais um grito de alerta em favor da vida sem nenhuma conotação política ou religiosa. Quem usa a ciência para medir os estragos causados pelo atual modelo de desenvolvimento é basicamente um cético: se orienta apenas e tão somente pelas evidências que a metodologia científica lhe revela.

Os povos indígenas causarão enormes constrangimentos aos organizadores da Rio+20. Representantes das etnias que sobreviveram a sucessivos massacres no Brasil e no exterior denunciarão o absurdo do uso insustentável da terra.

Os empresários engajados exibirão os resultados contábeis da ecoeficiência e assumirão novos compromissos em defesa da inovação tecnológica e da redução do desperdício. Haverá entre eles os que fazem maquiagem verde (falam de “sustentabilidade”, mas não praticam), os neo-convertidos, que ajustaram procedimentos mais por conveniência (do que por convicção) e os que, de fato, estão convencidos da necessidade de mudanças e conseguem enxergar mais além do lucro imediato.

A constelação das ONGs deverá confirmar o tamanho e a diversidade das múltiplas correntes de pensamento que não cabem na moldura da ONU, mas que emprestam densidade e legitimidade a uma das pautas mais importantes da Rio+20: governança. Os tomadores de decisão já reconhecem a força do terceiro setor num mundo onde as articulações em rede robustecem a democracia, oxigenam as instituições e promovem a transparência e a justiça.

Caberá às organizações civis e às mídias (todas as mídias, de todos os tamanhos) aquecer a panela de pressão onde os chefes de estado vão cozinhar o texto final da Conferência. Sem isso, será mais do mesmo. Obnubilados pelos afazeres e interesses mais imediatos, de curtíssimo prazo, os chefes de estado não conseguirão justificar mudanças estruturais de longo prazo sem que haja uma boa razão para isso. Se você entende que há alguma razão para a mudança, manifeste-se. A Rio+20 é uma obra em construção. Ainda há tempo.

* André Trigueiro é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ onde hoje leciona a disciplina Geopolítica Ambiental, professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livro Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um dos autores do livro Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia, lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio, pela Editora FEB, 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor-chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário da Rádio Rio de Janeiro.

** Publicado originalmente na edição de março 2012 da Revista GQ e retirado do site Mundo Sustentável.