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Elevação do nível do mar afoga o turismo em Camarões

Um pescador em Kribi, em Camarões, explicou que esta é a única parte da praia com espaço suficiente para ancorar suas canoas. Foto: Monde Kingsley Nfor/IPS
Um pescador em Kribi, em Camarões, explicou que esta é a única parte da praia com espaço suficiente para ancorar suas canoas. Foto: Monde Kingsley Nfor/IPS

 

Kribi, Camarões, 28/7/2014 – Pierre Zambo é gerente de um hotel em Kribi, um balneário na região sul de Camarões. Antes, contou, recebia “mais de cem turistas por semana. Agora, se consigo ter 50 ao mesmo tempo, é um grande negócio”. Localizada no Golfo da Guiné, Kribi é uma cidade balneária com cerca de 50 mil habitantes que vivem da agricultura, pesca e turismo.

Mas o aumento do nível do mar e as ondas gigantescas causaram a erosão da praia de Kribi. Agora é uma estreita faixa de barro. Os restaurantes, bares e hotéis locais sentem o impacto do fenômeno diretamente em seus caixas, porque há cada vez menos visitantes. “Os turistas que vêm estão cada vez menos interessados em nossas praias e preferem desfrutar das atrações da selva”, detalhou Zambo.

Emmanuel Founga é um botânico que também tem um hotel em Kribi. “A erosão costeira chegou a ficar entre 50 e cem metros desde 1990. É evidente pelas árvores arrancadas pela raiz pelas ondas, mas que há alguns anos estavam terra adentro”, explicou à IPS. A população local perde uma importante fonte de renda com a diminuição dos turistas; bares e restaurantes começam a fechar, acrescentou.

“A enorme degradação costeira tem grandes consequências sobre o turismo na região. A elevação do nível do mar não causou apenas erosão, mas contaminou a costa. O mar lança muito lixo do Oceano Atlântico na praia e as ondas provocam a erosão dos bancos de areia, deixando a costa barrenta.

“A mudança climática tem um efeito devastador em Camarões, e a costa de Kribi é um exemplo perfeito do problema do aumento do nível do mar e do enorme impacto sobre a segurança e as fontes de renda da população”, explicou à IPS Tomothé Kagombet, coordenador para o Protocolo de Kyoto do Ministério de Ambiente, Proteção Natural e Desenvolvimento Sustentável. O Protocolo de Kyoto é o único instrumento internacional contra o aquecimento global, que comprometeu desde sua entrada em vigor, em 2005, até seu vencimento, em 2012, o Norte industrializado com a redução de suas emissões de gases-estufa.

A mudança climática não só causou problemas costeiros em Camarões, como teve grande impacto em todo o seu território: chove pouco e irregularmente, há pragas e doenças nas plantas, erosão, altas temperaturas, seca e inundações. A economia desse país da África central tem uma forte dependência em setores sensíveis às variações climáticas, principalmente agricultura, energia e silvicultura; 70% da população dependem diretamente de cultivar a terra.

O Ministério de Turismo utiliza fundos de um projeto da Organização Mundial do Turismo chamado ST-EP (sigla em inglês de Turismo Sustentável-Eliminação da Pobreza) para iniciativas contra a mudança climática na costa, mas não basta. Por meio do ST-EP são implantados vários programas na praia de Kribi e na selva, além de outras áreas costeiras como as cidades de Douala e Limbe, para que as pessoas se adaptem à variabilidade climática e desenvolvam sua localidade para o turismo.

“Devido à degradação costeira, incentivamos a população local a desenvolver outros locais turísticos, como a selva com os pigmeus baka e sua rica cultura, que nos últimos tempos se converteu em uma grande atração. Entregamos fundos para restaurar e gerir as praias de Kribi até Limbe, bem como outros lugares”, declarou à IPS o diretor de sítios turísticos do Ministério do Turismo, Muhamadu Kombi.

Mas é só um projeto. Falta implantar estratégias de adaptação à mudança climática em escala nacional devido à escassez de fundos. O Plano Nacional de Adaptação à Mudança Climática (Penacc) oferece estratégias e medidas para mitigar seus efeitos, mas Kagombet apontou que Camarões não se beneficia de fundos da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC).

“Um dos principais obstáculos para Camarões e outras nações em desenvolvimento tem a ver com os problemas de implantação. Dependemos de fundos dos países ricos para implantar melhor esse elaborado plano de ação para a adaptação”, explicou Kagombet. “No documento do Penacc, a vulnerabilidade de Camarões é considerada por setor, e as ações de adaptação são formuladas segundo essas especificidades. Com o ecossistema costeiro, por exemplo, são necessários tanto meios mecânicos (construir diques) como biológicos (plantar mangues)”, ressaltou.

Uma das medidas que o país tomará é incluir o tema da mudança climática no currículo escolar, e para isso já estabeleceu os primeiros programas. No plano de ação também se prioriza medidas nos setores industrial e de transporte, além da gestão do lixo. “É um pacote com todos os requisitos: capacidade, tecnologia e outros recursos necessários para se adaptar e mitigar os efeitos da mudança climática”, destacou Kagombet.

Camarões prevê implantar e levar adiante projetos de Redução de Emissões por Desmatamento (REDD), mas os atrasos operacionais podem prejudicar os compromissos nacionais de mitigação da mudança climática. Por outro lado, as pessoas que não se beneficiam dos projetos de adaptação em Kribi sentem que não só suas fontes de renda estão em risco, mas que sempre pagam de seu bolso a adaptação à variabilidade climática.

“As ondas gigantes trouxeram outros problemas. Tenho que encher sacos de areia em agosto e deixar até outubro, quando o mar está bem alto, para evitar que a terra tenha mais erosão e que minhas paredes venham abaixo”, lamentou Zambo. Envolverde/IPS