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Investigação de madeira ilegal nos Estados Unidos com possível impacto mundial

Apreensão de madeira ilegal na localidade de Ayun, no distrito paquistanês de Chitral. Foto: Imran Schah/IPS
Apreensão de madeira ilegal na localidade de Ayun, no distrito paquistanês de Chitral. Foto: Imran Schah/IPS

 

Washington, Estados Unidos, 9/10/2014 – Organizações ecologistas aumentam a pressão para que as autoridades dos Estados Unidos concluam a investigação de uma empresa acusada de importar madeira ilegal e determinem as responsabilidades no caso, o que poderá repercutir no comércio madeireiro internacional. Em setembro de 2013 as autoridades invadiram dois dos escritórios da Lumber Liquidators, maior empresa de piso de madeira no país, suspeita de violar a lei ao importar madeira cortada ilegalmente da Rússia.

Naquele momento, a organização independente Agência de Investigação Ambiental (EIA) publicou um detalhado informe sobre as acusações, que incluíam numerosas evidências sugerindo que a Lumber Liquidators realizou a ilícita operação comercial por meio de um fornecedor chinês. Em maio, o Greenpeace voltou a questionar os negócios da companhia com fornecedores supostamente vinculados ao corte ilegal na Amazônia.

Atualmente, a empresa é investigada por três órgãos dos Estados Unidos. Uma investigação internacional tão complexa exigiria pelo menos um ano, segundo os observadores, mas nos últimos dias os grupos ambientalistas aumentaram a pressão para que Washington determine as responsabilidades no caso.

“Há motivos reais para crer que a Lumber Liquidators violou a lei, e estamos particularmente interessados em que este caso seja investigado”, afirmou Jesse Prentice-Dunn, do Sierra Club, um dos maiores grupos ecologistas desse país. “Estivemos educando nossos membros sobre a lei norte-americana a respeito dessa questão. E agora uma grande quantidade deles pede ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que faça cumprir cabalmente as leis”, explicou.

No dia 3 deste mês, o Sierra Club anunciou que mais de cem mil de seus sócios apresentaram petições nas quais alertam que “muitas empresas não tomarão medidas para que suas cadeias de fornecimento sejam sustentáveis enquanto não virem uma rigorosa aplicação da lei”.

Preocupação semelhante expressava uma carta enviada no final de setembro por organizações ambientalistas e trabalhistas às três autoridades do governo norte-americano encarregados da investigação da Lumber Liquidators. Porém, a empresa em questão anunciou uma nova política de sustentabilidade no começo deste mês, que inclui testes de DNA da madeira cortada, auditorias internas e externas, bem como a intenção de adquirir materiais na América do Norte e não em “regiões consideradas com menor supervisão”.

Mas o anúncio da Lumber Liquidators, que defende sua inocência, indignou os grupos ativistas ao sugerir que seus erros passados tiveram a ver mais com a comunicação do que com problemas sistêmicos. “É certo que nos concentramos mais em nossos esforços de sustentabilidade do que em comunicá-los de maneira ampla”, afirmou Ray Cotton, vice-presidente da companhia, em um comunicado publicado na nova página da empresa na internet.

Quando a imprensa canadense perguntou se alguma vez havia usado madeira “adquirida de forma ilegal no extremo oriental da Rússia”, a companhia respondeu que não, em um comunicado oficial proporcionado pela EIA. Também afirmou que o informe da EIA “continha inexatidões fundamentais e afirmações sem fundamento”, e que esta nunca alegou que a Lumber Liquidators tivesse violado a lei norte-americana.

A “declaração da Lumber Liquidators é extremamente preocupante”, respondeu Alexander Von Bismark, diretor do escritório norte-americano da EIA. “Isso não dá às pessoas confiança no plano de sustentabilidade da empresa, se o enfoque geral se limita simplesmente à melhoria das comunicações. O primeiro passo para uma ação substancial teria que ser assumir uma posição sóbria sobre o que realmente ocorreu”, destacou.

A lei no centro das investigações é a chamada lei Lacey, aprovada em 2008 e considerada uma peça pioneira na matéria, a ponto de algumas fontes afirmarem que já teve repercussões mundiais, em particular na China. O país mais povoado do planeta se converteu nos últimos anos em um dos principais intermediários da indústria mundial da madeira, tanto legal quanto ilegal.

Na última década as exportações da China de produtos de madeira cresceram ao ritmo de 30% ao ano. Atualmente, este país é o maior exportador de produtos de madeira, com mais de 12% do mercado mundial, avaliado em cerca de US$ 12 bilhões em 2012. Também se diz que o setor é um dos menos transparentes com os quais os Estados Unidos comercializam.

Porém, Bismarck apontou que as mudanças começaram a acontecer agora que as autoridades chinesas decidiram lidar com o problema da lavagem da madeira ilegal. Também afirmou que isso é o que torna o caso Lumber Liquidators, e a possível reação das autoridades norte-americanas, tão importante.

Apesar de Pequim, pela primeira vez, começar a discutir o corte ilegal nos fóruns internacionais, sua resposta é incompleta, segundo Bismarck. Isto se deve em grande parte ao grau com que as empresas continuam sendo capazes de ignorar o regime jurídico, como a lei Lacey, acrescentou.

“Isso permite à indústria chinesa considerar que não precisa mudar suas práticas porque a madeira continua entrando”, disse Bismarck. “Por isso toda a situação está por um fio, e o caso Lumber Liquidators é um sinal fundamental para as associações industriais chinesas que estão por decidir qual caminho seguirão. Isso decidirá se, em uns poucos anos, teremos uma nova lei para o comércio madeireiro”, ressaltou.

Alguns ambientalistas criticam a lei Lacey, mas Bismarck opinou que a investigação atual é a prova de que essa lei funciona. “O fato de o governo norte-americano estar investigando um caso que implica o corte ilegal em um país e a fabricação em outro antes de chegar aos Estados Unidos é um sinal muito positivo para a eficácia geral da lei”, enfatizou.

Segundo Bismarck, “a madeira ilegal não pode ser escondida e esses produtos não podem ser lavados com a mesma facilidade com que se fazia no passado, e isso poderia provocar uma mudança radical na indústria. É provável que ainda nem todos os rincões da indústria madeireira mundial o tenha assimilado, mas o farão”. Envolverde/IPS