Rio: uma nova missão ao lado de velhos problemas

Rio-de-Janeiro“Se os países do mundo andam em ritmo muito lento, as cidades podem ir mais rápido”. Este bem que poderia ser o lema do C-40 (Cities Climate Leadership Group), grupo que reúne as mais importantes cidades do mundo comprometidas em buscar soluções para as mudanças do clima que afetam todo o planeta.

Impacientes com a morosidade da ONU em coordenar ações em nível global para o enfrentamento do problema, prefeitos de 58 cidades (São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba são as únicas do Brasil) compartilham conhecimento, experiências e contabilizam até o momento 4.734 ações em diferentes frentes (aumento das áreas verdes, menos automóveis, mais transporte público e ciclovias, reciclagem de lixo, apoio às construções sustentáveis etc).

À frente do C-40, o prefeito de Nova Iorque, Michael Bloomberg (que será sucedido no cargo pelo democrata Bill de Blasio), veio ao Brasil durante a Rio+20 para anunciar aquela que talvez tenha sido a maior notícia do evento. Enquanto os chefes de Estado reunidos no Riocentro se esforçavam em sorrir para a foto oficial sem nenhum resultado importante, Bloomberg anunciava no Forte de Copacabana a meta coletiva das cidades de reduzir 1,3 bilhão de toneladas de gases estufa até 2030 – com medidas mensuráveis e comprováveis – o equivalente às emissões de Canadá e México juntos no mesmo período. Foi o maior feito da história da organização até hoje.

Se fosse possível reuni-las em um único país, as cidades do C-40 seriam o mais rico do mundo (18% do PIB) e o terceiro mais populoso (544 milhões de pessoas). Prefeito não remunerado – por opção – de Nova Iorque, o milionário Bloomberg colocou dinheiro de sua própria fundação e de outras igualmente importantes, como a Fundação Clinton, para estruturar administrativamente a organização e deixar o C-40 em melhores condições de navegabilidade para seu sucessor nesse grupo, o prefeito do Rio, Eduardo Paes. É a primeira vez que um prefeito de um país em desenvolvimento assume o cargo.

“É uma prova de que o Rio de Janeiro está em evidência”, me disse Paes ao voltar de Nova Iorque, onde esteve com Bloomberg para acertar detalhes da passagem do bastão. Mesmo sem tempo suficiente para cuidar de todos os problemas da segunda maior cidade do país, Paes terá que dar conta a partir de fevereiro (quando assume oficialmente o cargo) de uma estrutura que mobiliza 70 funcionários, dois escritórios (um em Nova Iorque, outro em Londres) e U$ 30 milhões de orçamento anual.

Já há pelo menos uma discordância entre Bloomberg – que continuará liderando o comitê diretor da instituição – e o novo presidente do C-40. “Bloomberg acha que devemos aceitar o convite da ONU para marcar presença da Conferência do Clima que acontecerá em 2015 em Paris. Eu ainda não estou convencido disso”, diz Paes, que não esconde o ceticismo em relação aos rumos do multilateralismo. “Tenho medo de ser engolido pela ONU”, confessa o prefeito, preocupado em abrir caminho para que as cidades possam captar recursos diretamente do Banco Mundial e de outros órgãos de fomento internacionais que só costumam negociar diretamente com os países.

Duplamente exposto (por ser prefeito da cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e agora presidente do C-40), Paes admite que o Rio precisa avançar muito em várias áreas. “Ainda sofremos com a incapacidade de nos planejar. Há problemas em relação à ocupação das encostas, drenagem urbana, uma pressão imobiliária excessiva”,reconhece.

Apesar de tudo isso, o Rio recebeu há duas semanas em Barcelona o prêmio de “Cidade mais inteligente do ano” (World Smart City 2013) por algumas iniciativas reconhecidas internacionalmente. As restrições à circulação de automóveis, a expansão das linhas de BRT, a aplicação de multas para quem joga lixo no chão e a revitalização da zona portuária são algumas das medidas que levaram Michael Bloomberg e o ex-presidente Bill Clinton (a Fundação Clinton apóia o C-40) a comunicar a Paes, ainda em novembro do ano passado, o interesse em tê-lo à frente da organização pelos próximos três anos.

Entre os novos desafios, o prefeito do Rio deseja incrementar a participação das cidades dos países pertencentes aos BRICS (China, índia, Brasil, Rússia e África do Sul) no C-40 e contar com o apoio de mais empresas e fundações que ajudem o grupo a crescer.

Da “cidade maravilha, purgatório da beleza e dos caos”, para o C-40 foi um salto importante para o Rio, que aos olhos do mundo, é uma síntese do Brasil. Não faremos a Copa do Mundo mais sustentável que já se viu (nem o Maracanã representa o que há de mais avançado em design ecológico). Os Jogos 2016 não serão os mais verdes da História e a cidade ainda é uma das mais desiguais do planeta, com indicadores preocupantes de mobilidade urbana e saneamento básico. Que a avalanche de obras em curso ajude a mudar essa realidade. À frente do C-40, a bola está com o Rio.

* André Trigueiro é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe-UFRJ onde hoje leciona a disciplina geopolítica ambiental, professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livro Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um dos autores dos livros Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia, lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, pela Editora FEB, em 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário da Rádio Rio de Janeiro.

** Publicado originalmente no site Mundo Sustentável.