Finanças da Espanha: Pânico

Espanhóis aguardam para entrar num centro de ofertas de emprego, em Madri, nesta segunda-feira 4. Foto: Dominique Faget / AFP

Na sexta-feira 25, o governo espanhol anunciou que estava injetando mais 19 bilhões de euros (US$ 23,8 bilhões) no Bankia, efetivamente nacionalizando o segundo maior banco do país em depósitos. Em 28 de maio, o rendimento da dívida do governo atingiu seu nível mais alto este ano. Isso reflete os temores do mercado de que haverá mais ajudas aos bancos. E, especialmente, que um plano do governo para financiar o resgate por meio de uma troca da dívida sugeria que ele não conseguiria levantar nos mercados sequer esta quantia relativamente pequena (equivalente a menos de 2% do PIB).

Se isso fosse verdade, o país simplesmente não poderia encontrar as centenas de bilhões de euros necessários para os repagamentos da dívida e gastos orçamentários nos próximos anos, pelo menos não sem uma ajuda externa maciça. Como era previsível, os investidores entraram em pânico e o custo da dívida espanhola disparou, enquanto eles liquidavam o país. Não será fácil atraí-los novamente.

O primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy, insistiu que não há necessidade de um resgate internacional aos bancos de seu país, acrescentando que o Bankia teria falido se o governo não tivesse agido. “Não vamos deixar nenhum governo regional cair, ou nenhum banco cair, porque eles não podem. Se isso acontecer o país cairá”, admitiu. A Catalunha, região que responde por um quinto da economia espanhola, pediu a ajuda do governo central para pagar o serviço de suas dívidas, enquanto os fundos no mercado continuam mais raros e caros.

O resgate do Bankia agitou os mercados, e o rendimento dos papéis de dez anos da Espanha passaram de 6,5% na segunda-feira, perigosamente perto dos 7% que provocaram os planos de socorro para Portugal, Irlanda e Grécia, e que seriam impossíveis para as finanças do governo, já muito forçadas.

Hoje a Espanha paga por sua dívida mais de 5 pontos percentuais a mais que a Alemanha. Isso reflete em parte antigos temores de que os problemas bancários da Espanha se revelem muito piores do que se admite: uma bolha imobiliária estourada já deixou os credores com créditos podres de 180 bilhões de euros, que o governo vem tentando fazer os próprios bancos pagarem, forçando-os a aumentar maciçamente suas reservas, assim como a se fundirem em um número menor de bancos maiores. No entanto, há temores de que os preços dos imóveis possam cair ainda mais e que o desemprego acima de 24% aumente o número de pessoas incapazes de pagar seus empréstimos. O banco de investimentos Nomura reconhece que o governo terá de encontrar mais de 50 bilhões de euros para apoiar os bancos, e alguns analistas do setor calculam que o número é o dobro disso.

Incapaz de se financiar?

Por si só, o Bankia já está fazendo a estimativa do Nomura parecer conservadora: o governo agora pretende injetar um total de 23,5 bilhões de euros no banco para ter uma participação de cerca de 90%. Isso poderia ter sido necessário para evitar a ameaça de corrida aos depósitos, mas o que realmente preocupou os mercados foi a aparente admissão de que o governo talvez não conseguisse levantar esse dinheiro sozinho. Durante o fim de semana foi traçado um esquema para injetar 19 bilhões de euros de dívida do governo no banco quando ele se recapitalizar em junho ou julho, em troca de participação no BFA, a companhia matriz do Bankia. O BFA poderia então depositar esses títulos no Banco Central Europeu em troca de liquidez.

O esquema foi aprovado por alguns analistas como um possível modelo para futuros resgates de bancos da Zona do Euro. Mas o mercado o viu como uma confissão do governo de que não poderia encontrar financiamento comercial mesmo para uma quantia relativamente modesta. Enquanto os custos da dívida disparavam, Rajoy rapidamente se afastou da ideia na segunda-feira passada, dizendo que uma emissão de títulos do governo seria a maneira mais provável de financiar o resgate. Mas o dano à confiança do mercado estava feito. A Economist Intelligence Unit estima que a Espanha precisará levantar cerca de 400 bilhões de euros nos mercados nos próximos dois ou três anos, levando em conta o custo dos resgates dos bancos. Se não consegue levantar menos de 20 bilhões para socorrer um banco, então certamente não poderá levantar centenas de bilhões de euros entre credores privados. Sem um socorro internacional, portanto, não conseguirá saldar suas dívidas maiores.

Tranquilizando os investidores

Em curto prazo, a concentração será para tranquilizar os investidores levantando a quantia limitada necessária para financiar o resgate do Bankia e o socorro aos outros bancos. Isto pode ser manejado confortavelmente pelos atuais fundos de resgate da UE, talvez em combinação com o FMI. A Espanha deve esperar que seja suficiente para traçar uma linha embaixo da crise atual, deixando um país com uma economia estagnada mas um peso da dívida que parece administrável, em cerca de 90% do PIB, mesmo levando em conta o provável custo dos resgates de bancos (Itália e Grécia têm dívida pública equivalente a cerca de 120% do PIB). No papel, enfrentar a crise bancária imediata poderá bastar para tornar sustentáveis as finanças espanholas.

O problema é que ainda não está claro como serão tratados os socorros aos bancos. Isso manterá os mercados preocupados. Igualmente, poucos acreditam na ambiciosa promessa da Espanha de esmagar o déficit de gastos abaixo de 3% do PIB no ano que vem, de notáveis 8,9% em 2011. Enquanto o país descumprir suas metas de gastos e a economia continuar em recessão, as dúvidas do mercado aumentarão. Com ajuda externa a Espanha poderá atacar seus problemas bancários. Mas resta ver se e quando poderá acalmar os nervos dos investidores privados o suficiente para evitar a necessidade de um pacote de resgate mais amplo.

* Publicado originalmente no site da Carta Capital.