A década da educomunicação?

Em dezembro de 2011, a Universidade de São Paulo (USP) organizou, como já tem virado um costume, o III Simpósio Brasileiro de Educomunicação, que reúne profissionais e pesquisadores da interface entre a educação e a comunicação de diversas partes da América Latina. Participei de uma mesa de debates cujo título chamava a atenção para a década da educomunicação que se fechava (2001/2011), que teria começado quando a USP começou a sistematizar esse novo campo, assim chamado por eles, e a sociedade civil, em organizações como as que compõem a Rede CEP, iniciado a disseminação da prática Brasil afora.

Achei simpático o nome da sessão (“A década da educomunicação”), mas tentarei aqui levar meu pensamento para além disso.

Sim, as práticas de comunicação e educação jamais estiveram tão presentes em escolas e comunidades. O último levantamento do MEC aponta que cerca de cinco mil instituições adotaram as mídias escolares como ação dentro do programa Mais Educação – uma ação que nasceu no bojo da Rede CEP. Em outro campo, comunidades por todo o país tem revalorizado o caráter educativo intrínseco a seus membros, estruturas e aparelhos, por meio de programas que, como o bairro-escola, resgatam a relevância social que a educação informal e não formal perderam para o currículo escolar nas últimas décadas.

No entanto, olhando atentamente para a história, o papel da universidade no campo da educomunicação parece percorrer um caminho contrário ao que exerce naturalmente: tem organizado uma prática um tanto quanto “mundana” e mais antiga que o conceito.

Na verdade, os acadêmicos têm exercido o papel importante de dar contorno a um novo campo e sistematizar ações que estão ativas muito anteriormente à criação desse novo conceito. Ou seja, as práticas (agora chamadas educomunicativas) datam da década de 1950 no Brasil, por meio das comunidades eclesiais de base; só em 2001 passaram a frequentar as salas de aula nas pós-graduações.

Considerá-las existentes a partir de 2001 seria o mesmo que passar a acreditar que o grafite nasceu em meados dos anos 1980, quando algumas galerias de Nova York chamaram seus artistas para expor, levando ao Olimpo esta forma de arte. Na verdade, já tinha vinte anos à época.

O mais interessante no caso não diz respeito ao passado, mas ao futuro. Quem acredita que esta década foi a da educomunicação pode não estar preparado para o que há de vir de dentro das empresas – estas ainda pouco lembradas como atores importantes dentro do campo.

Se considerarmos o olhar da educomunicação como um comprometimento com uma comunicação de qualidade, este movimento só está nascendo no ambiente corporativo. Cada vez mais empresas emprestarão sua credibilidade e marca apenas para a comunicação que tiver o mínimo de comprometimento com seus processos, fruto de uma onda de responsabilidade social corporativa que iniciou-se há mais de quinze anos. Está nascendo uma espécie de curadoria de qualidade.

Por outro lado, o desafio permanente das empresas de aproveitar ideias e talentos de todos os envolvidos para melhor desenvolver o negócio pode enxergar na educomunicação uma ferramenta muito útil na área de sua gestão.

Considerando passado e futuro, a década da educomunicação não foi e nem é; me parece que o conceito está começando a se emaranhar na sociedade e as surpresas maiores ainda estão mesmo por vir.

* Publicado originalmente no site Portal do Aprendiz.