O modelo brasileiro que deu certo

Sesc Pompeia, em São Paulo. Foto: Lalo de Almeida

Sistema do Sesc ganha elogios ao redor do mundo, e reflete desenvolvimento do Brasil no novo século.

Ao redor do mundo as organizações culturais estão apertando seus orçamentos e reduzindo as produções. Mas Danilo Miranda enfrenta um desafio diferente, que faz dele o alvo da inveja de seus colegas. Como o diretor da entidade líder em financiamento artístico no Brasil, seu orçamento está crescendo em 10% ou mais anualmente, e ele precisa descobrir maneiras de gastar essa recompensa, equivalente a US$ 600 milhões anuais.

“Nosso princípio fundamental é usar a cultura como um instrumento de educação e transformação, para melhorar a vida das pessoas, e estamos na posição de cumprir essa missão, graças a Deus”, diz Miranda. “Durante a última década o nosso orçamento vem dobrando a cada seis anos. É incrível, não?”

O Sesc deve sua posição invejável em grande parte a um modelo de financiamento que seus líderes acreditam ser único no mundo. Como uma entidade privada sem fins lucrativos cujo papel é consagrado na Constituição nacional, a organização deriva seu orçamento a partir de um imposto sobre os salários de 1,5% cobrado por empresas brasileiras, logo, assim como a força de trabalho no país de quase 200 milhões de pessoas se expande, cresce também o orçamento da organização.

“O Brasil está crescendo, e assim as nossas necessidades, e as dos nossos trabalhadores, também estão crescendo”, diz Abram Szajman, presidente da Câmara de Comércio do Estado de São Paulo. “Eles querem ter acesso não apenas a instalações esportivas e de saúde, mas também a arte, música e outras atividades culturais, seja do Brasil ou do exterior, e isto é parte de nossa atuação”.

“Os brasileiros estão nadando em dinheiro”, diz Jennifer P. Goodale, diretora do Trust for Mutual Understanding, que trabalha com o Leste Europeu e países asiáticos em programas de intercâmbio cultural. “Com os Jogos Olímpicos e tudo mais, é sua vez, o seu momento.”

Cultura no mundo globalizado

O Sesc não é a única entidade se esforçando para expandir suas atividades e elevar o perfil cultural do Brasil internacionalmente. O Ministério das Relações Exteriores e os Estados e municípios têm programas de assistência a passeios de músicos no exterior e promovem filmes e outras obras, e o governo federal estuda maneiras de reforçar a lei que dá incentivos fiscais a corporações que financiam programas de artes.

“O dinamismo cultural, a estabilidade monetária, o processo de inclusão social – tudo isto dá à cultura brasileira um caminho muito válido para o exercício do poder suave, uma maneira de tornar nossa sociedade mais conhecida e melhor compreendida pelos outros”, disse Celso Lafer, um ex-ministro de Relações Exteriores que também é escritor e membro da Academia Brasileira de Letras.

O Sesc é, no entanto, a organização de artes mais ativa no Brasil, operando em todos os 27 Estados do país, financiando não apenas programas de artes, mas também atividades recreativas, cursos educacionais e clínicas de saúde. Em São Paulo, que tem 41 milhões de pessoas e é o Estado mais populoso e próspero do Brasil, um quarto do orçamento estadual do grupo é gasto em “expansão e renovação” de suas artes e centros de recreação, com outros 20% indo diretamente para programas culturais, e o restante dividido entre outras atividades, diz Miranda. Ele recebe para os programas culturais quase tanto quanto o National Endowment for the Arts gasta em todos os Estados Unidos.

Hoje não há praticamente nenhuma área das artes no Brasil em que o Sesc não está envolvido. A organização tem sua editora de livros, bem como uma gravadora e um canal na TV a cabo, e também opera galerias de arte, teatros, cinemas e salas de concerto, muitas vezes como parte de complexos maiores, que incluem restaurantes e instalações esportivas.

“O modelo Sesc é um modelo maravilhoso que devemos ter em todo o mundo”, diz Nan van Houte, diretor do Instituto Holandês de Teatro e ex-presidente da Rede Internacional de Artes Performativas Contemporâneas. “Ter teatros, piscinas, bibliotecas, restaurantes, oficinas e museus, todos juntos, é muito inteligente. Faz parte da cultura da vida cotidiana, não é algo distante.”

O Sesc foi fundado em 1946, uma época na qual os setores comercial e industrial do Brasil estavam preocupados com a possibilidade de que trabalhadores fossem atraídos para o comunismo. Como o Brasil é o maior país católico do mundo, a doutrina social cristã defendida em documentos papais como Rerum Novarum, que pregavam uma maior solidariedade social e uma relação mais harmoniosa entre o capital e o trabalho, também foi uma influência importante.

O Brasil e o mundo mudaram desde então. Não só o comunismo entrou em colapso, como a economia do Brasil também é maior do que a do Reino Unido, a da Itália ou a da Rússia. Ainda assim, os líderes empresariais brasileiros continuam a ver grande benefício e utilidade no sistema do Sesc, e nenhum dos mais de 20 partidos políticos do país se opõe a ele.

“Parte do retorno é social, no sentido de que é importante para nós, como empresários, que a sociedade veja que estamos participando”, disse Szajman. “Mas há um retorno prático também: nossos trabalhadores vão para seus empregos como cidadãos mais informados, com uma melhor formação, e mais felizes, o que os torna mais produtivos.”

* Larry Rohter é jornalista, autor de Deu no New York Times e Brazil On The Rise.

** Publicado originalmente no site Opinião e Notícia.