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A contaminante fumaça do vizinho

Nações Unidas, 11/7/2011 – Quase seis milhões de pessoas morrerão este ano por causa do cigarro no mundo, e 10% dessas mortes serão de fumantes passivos, segundo um informe apresentado na semana passada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Se a tendência atual continuar, as mortes anuais poderão aumentar para oito milhões até 2030, diz o “Informe OMS sobre a epidemia mundial de tabagismo 2011 – Advertência sobre os perigos do tabaco”.

Mais de 80% dessas mortes acontecerão em países de renda média e baixa. “Temos os meios para prevenir esta tragédia desnecessária. A vontade política é a chave”, disse à IPS o encarregado de Comunicações da OMS, Timothy O’Leary. O estudo se centra na proliferação da proibição de fumar em locais de trabalho, restaurantes, bares e outros espaços públicos fechados. E destaca que, embora cerca de 154 milhões de pessoas já não estejam expostas à fumaça do cigarro nestes lugares, esse número representa apenas 5,4% da população mundial.

“Embora isto seja um avanço, o fato de mais de 94% das pessoas continuarem desprotegidas pelas leis contra o cigarro mostra que é preciso trabalhar muito mais a respeito”, disse o subdiretor-geral de Doenças Não Transmissíveis e Saúde Mental da OMS, Ala Alwan. “É necessária uma ação urgente para proteger a população da morte e das doenças causadas pela exposição à fumaça do cigarro”, disse em um comunicado. Em 2005, os países se uniram para aprovar o primeiro tratado mundial de saúde pública: o Convênio Marco da OMS para o Controle do Tabaco, que também foi o primeiro tratado negociado pela OMS. Mais de 170 países e a União Europeia agora são partes do mesmo.

“O tratado propõe para os dirigentes passos específicos que abordam o uso do tabaco. Estes passos são bons pontos de partida para qualquer governo que queira criar consciência sobre os perigos do uso do tabaco”, disse à IPS Francis Thompson, diretor de Políticas na Aliança para o Convênio Marco, uma organização não governamental que apoia o tratado.

Para permitir que os países cumpram as obrigações estabelecidas no Convênio Marco, a OMS introduziu em 2008 o MPOWER, um pacote de seis medidas para controle do cigarro baseadas em evidências, que demonstraram reduzir o consumo desse produto. O informe estuda em detalhe a importância de advertir para os perigos do tabaco, uma das medidas MPOWER mais importantes. Emprega duas estratégias principais: inclusão de rótulos de advertência nos maços de cigarro e campanhas antitabagismo nos meios de comunicação.

Atualmente, um bilhão de pessoas em 19 países veem esse tipo de rótulo nos produtos que contêm tabaco, quase o dobro de dois anos atrás. Ao mesmo tempo, cerca de 28% da população mundial vive nos 23 países que realizam pelo menos uma campanha antitabagismo forte na mídia. Dessas nações, apenas sete são consideradas ricas. Partindo da premissa de que muitas pessoas continuam sem saber das consequências do tabaco, nos últimos anos os rótulos de advertência se tornaram cada vez mais agressivos. Aproximadamente três em cada dez ex-fumantes disseram que esses rótulos os levaram a abandonar o vício, e mais de um quarto disse que os rótulos os ajudaram a manter a abstinência, segundo o informe.

Como disse Thompson à IPS, “as advertências gráficas nos maços de cigarro podem ser uma motivação extra para quem deseja parar de fumar”. Além disso, “pelo menos nos países onde isto foi estudado, a esmagadora maioria dos fumantes lamenta, em primeiro lugar, ter começado a fumar”, acrescentou. O informe também diz que, graças a esses rótulos e à conscientização sobre o tema, outras medidas – como a criação de ambientes livres de fumaça – tendem a ser aceitas mais facilmente pelo público. Quanto às campanhas nos meios de comunicação, os anúncios que mostram, por exemplo, pessoas doentes sofrendo ou morrendo, são uma das maneiras mais eficazes de fazer com que os fumantes queiram abandonar o vício, segundo o estudo.

Após uma campanha publicitária antitabagismo realizada pelo programa municipal de controle do tabaco na cidade de Nova York, quadruplicaram os telefonemas de pessoas que buscavam ajuda e conselhos sobre como parar de fumar. Contudo, seria impossível fazer um acompanhamento destas duas estratégias – as campanhas na mídia e as advertências nos maços –, a não ser por outra das seis medidas baseadas nas evidências: o monitoramento.

“Os êxitos do monitoramento do uso do tabaco e as políticas de controle do tabaco são cruciais para entender e reverter a epidemia e garantir o sucesso das outras cinco medidas MPOWER”, diz o informe. Os bons sistemas de controle (pesquisas sobre uso do tabaco e implantação de medidas de controle deste produto, entre outras coisas) são praticados em 59 países com uma população somada de 3,2 bilhões de pessoas, metade da população mundial.

O informe está sendo divulgado dois meses antes da Cúpula das Nações Unidas sobre Doenças Não Transmissíveis, cujo objetivo será chegar a um acordo sobre uma estratégia mundial para abordar esses males. Entre as patologias não transmissíveis figuram câncer, problemas cardiovasculares, doenças respiratórias crônicas e diabete. Em todas elas, o uso de tabaco pode ter um papel significativo.

A Aliança para o Convênio Marco também defende que um uso reduzido de tabaco esteja na agenda mundial de saúde e desenvolvimento. “Ist inclui fazer com que uma implementação acelerada do Convênio Marco da OMS para o Controle do Tabaco seja uma prioridade na próxima reunião de alto nível das Nações Unidas sobre doenças não transmissíveis”, disse Thompson à IPS. Envolverde /IPS