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Aplicativos de celular para garantir a segurança de mulheres na Índia

Um grande número de mulheres na Índia baixa “aplicativos de segurança” em seus telefones celulares, como forma de ser protegerem contra agressões e violações. Foto: vgrigas/CC-BY-SA-2.0
Um grande número de mulheres na Índia baixa “aplicativos de segurança” em seus telefones celulares, como forma de ser protegerem contra agressões e violações. Foto: vgrigas/CC-BY-SA-2.0

 

Nova Délhi, Índia, 19/11/2014 – Eram 21h45 quando a jovem Manira Chaudhury, que cursa o último ano de seu mestrado em Nova Délhi, voltava para casa e apertou um botão de seu telefone celular que envia mensagem de emergência para suas duas melhores amigas. Imediatamente a jovem recebeu duas chamadas desesperadas. “Estou bem”, tranquilizou-as Chaudhury, de 23 anos, que começou a utilizar o VithU, um aplicativo para o celular lançado pelo Channel V há um ano.

O aplicativo é acionado quando se pressiona duas vezes um ícone na tela, que imediatamente transmite uma mensagem pré-determinada aos contatos de emergência selecionados. “Estou em perigo. Preciso de ajuda. Por favor, sigam minha localização”, seguida de informação sobre o paradeiro do emissor.

As duas companhias telefônicas e algumas organizações privadas começaram a difundir aplicativos semelhantes na Índia após a violação em grupo de uma estudante de 23 anos em um ônibus em movimento, no dia 16 de dezembro de 2012. O fato gerou protestos em massa nesse país de 1,2 bilhão de pessoas. Os manifestantes pediam leis mais duras, mais medidas de segurança, maior sensibilização da polícia nesses casos e ações mais fortes do governo para frear a violência sexual sofrida pela população feminina.

O governo indiano também prevê lançar seu próprio aplicativo no final deste mês, como serviço adicional ao 181, o número especial para mulheres em dificuldades, que foi criado depois do ataque de 2012. “O novo aplicativo facilitará a denúncia prévia à ocorrência do crime em função de uma ameaça recebida”, explicou Khadijah Faruqui, advogada especializada em direitos humanos e defensora dos direitos das mulheres, que está à frente do projeto da linha 181.

Legisladores e dirigentes responderam à tragédia de 2012 com a Ordenança de Emenda ao Código Penal de 2013, que incorporou vários crimes sexuais e penas mais duras por assédio e espreita. Também foram criados seis novos tribunais para julgamentos rápidos de casos de violação, e, segundo especialistas, criou-se o debate público sobre a segurança das mulheres.

Porém, a população feminina vive com medo, e a frequência e a brutalidade das violações não parecem ter mudado com o endurecimento das leis. Os últimos dados divulgados pelo Escritório Nacional de Registro de Crimes de 2012 indicam 24.923 violações ao ano. Além disso, a polícia registrou em várias cidades um aumento das agressões entre 2013 e 2014.

O centro econômico da Índia, Mumbai, que costumava ser considerada uma cidade segura, registrou aumento de 43% no número de violações denunciadas este ano, em comparação com 2013, segundo a polícia local. Já na capital indiana, as agressões sexuais aumentaram cinco vezes em 2013, de acordo com dados policiais.

A Microsoft Índia lançou há pouco tempo o Guardian para telefones com sistema operacional Windows. As usuárias selecionam a opção “rastrear” para que seus amigos e familiares possam localizá-las em tempo real. Também tem uma função de alerta e outra opção que permite gravar um ataque.

Também se destaca o Circle of 6, que ganhou o desafio de Aplicativos Contra o Abuso em 2011, patrocinado pelo governo dos Estados Unidos. O aplicativo tem vários ícones através dos quais a usuária pode enviar aos seus “círculos” selecionados mensagem de ajuda, de interrupção ou de conselho.

O programa foi criado para os Estados Unidos, mas, após observar aumento de 1.000% nos downloads desse aplicativo a partir da Índia depois da agressão de 2012, os desenvolvedores decidiram traduzi-lo para o híndi e adaptá-lo à Índia. Segundo seus criadores, o aplicativo está programado para sincronizar permanentemente com a linha especial para mulheres de Nova Délhi e com os serviços de apoio e assessoria da organização não governamental Jagori. A usuária que se sentir incomodada com a polícia também pode se comunicar com o Coletivo de Advogados, que oferece assessoria legal.

Durante o governo anterior, de Manmohan Singh, o Ministério das Finanças aprovou diversas propostas para otimizar o trabalho policial em relação aos serviços legais e móveis, e foi criado um fundo de US$ 16 bilhões para projetos que procurem garantir a segurança das mulheres.

Uma iniciativa do Ministério do Interior, desenhada em coordenação com o Ministério de Tecnologia da Informação, tem o objetivo de integrar a polícia com a rede de telefonia móvel para rastrear uma denúncia de forma rápida e responder a um pedido de auxílio. Além disso, esta última pasta enviará um guia aos fabricantes de celulares para que incluam um botão de alerta em todos os aparelhos. O programa será lançado em 157 cidades e em duas etapas.

Outra iniciativa, por ora conhecida como “desenho e desenvolvimento de um dispositivo eletrônico de segurança pessoal acessível”, cuja elaboração está a cargo do Instituto de Tecnologia da Índia, busca lançar um sistema de segurança independente, em forma de relógio de pulso. Além disso, o Ministério do Transporte lançará um programa em 32 cidades, cada uma com um milhão de habitantes, onde o transporte público terá dispositivos de GPS para melhorar a resposta da polícia às agressões.

Porém, é preciso muito mais do que um aplicativo para resolver o problema da violência contra as mulheres na Índia, onde há, em média, 57 denúncias diárias de violação, segundo a Iniciativa de Direitos Humanos da Comunidade (CHRI). “Não estou segura de sua eficácia e temo que as companhias aproveitam a insegurança das mulheres para fazer dinheiro”, opinou Rimi B. Chatterjee, escritora e ativista de Kolkata, que ensina inglês na Universidade de Jadavpur e encabeça um protesto contra a agressão sofrida por uma estudante em setembro.

“Nunca recomendei às minhas estudantes”, afirmou Chatterjee. “A solução para a segurança das mulheres está no trabalho com os homens e não em desenvolver aplicativos. O problema não está nas mulheres, mas nos homens e em mudar sua mentalidade, pois os jovens aprendem com os mais velhos a faltarem com o respeito às mulheres”, acrescentou.

No dia 25, se aproveitará a celebração do Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres para conscientizar sobre as carências dos aplicativos existentes e garantir que as mulheres que sofrerem um problema possam encontrar ajuda a tempo. Envolverde/IPS