Internacional

Caribe define “linha vermelha” para a cúpula climática de Paris

Por Kenton X. Chance, da IPS –

Uma mulher compra pescado em um mercado de Kingstown, em São Vicente os governantes da Comunidade do Caribe afirmam que a pesca é um dos setores mais importantes que já sofre as consequências da mudança climática. Foto: Kenton X. Chance/IPS
Uma mulher compra pescado em um mercado de Kingstown, em São Vicente os governantes da Comunidade do Caribe afirmam que a pesca é um dos setores mais importantes que já sofre as consequências da mudança climática. Foto: Kenton X. Chance/IPS

 

Castries, Santa Lúcia, 4/5/2015 – Quando terminou a cúpula sobre mudança climática no Peru, em dezembro do ano passado, os 15 membros da Comunidade do Caribe (Caricom), um grupo político e econômico de pequenos Estados insulares em desenvolvimento, vulneráveis à variação climática, partiram com “o mínimo necessário para continuar enfrentando o fenômeno”. 

“O Acordo de Lima decidiu que as partes deveriam continuar trabalhando nos elementos do Anexo para criar um texto para negociar no novo tratado”, disse à IPS Carlos Fuller, funcionário de ligação do Centro de Mudança Climática da Caricom. “Queríamos uma declaração mais forte de que esses eram os elementos que seriam usados no rascunho do texto a negociar”, acrescentou. 

Segundo Fuller, “não obtivemos uma menção específica de que perdas e danos seriam incluídos no novo acordo, mas tampouco que não seriam. A respeito das contribuições previstas e determinadas em nível nacional (CPDN), acordamos que todas as partes enviariam suas contribuições para o novo acordo durante o ano de 2015”. 

“Mas perdemos todos os pontos que notificariam as partes sobre o que enviar. Perdemos o processo de revisão para as CPDN e só as partes que assim o desejarem responderão às consultas de esclarecimento”, acrescentou Fuller. 

As negociações de Lima formam parte das prévias à 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), com 196 membros, que acontecerá em dezembro deste ano em Paris. 

A CMNUCC compreende o Protocolo de Kyoto, assinado nessa cidade japonesa em 1997 e ratificado por 192 Estados parte. O objetivo dos dois tratados é estabilizar a concentração de gases-estufa na atmosfera em um nível que evite uma interferência humana perigosa com o sistema climático. Espera-se que as partes assinem na capital francesa um acordo vinculante que mantenha o aumento da temperatura global, causado pelas atividades humanas, em um nível que, segundo os cientistas, evite uma mudança climática catastrófica. 

Os negociadores da Caricom tentam evitar que se repita a situação de Lima e identificar a “linha vermelha” de assuntos que seja “sacrossanta” para suas populações enquanto se preparam para a cúpula do fim de ano. Nesse contexto, os negociadores se reuniram no dia 21 de abril para preparar a reunião que manterão as autoridades da Caricom com o presidente da França, François Hollande, em Martinica, no dia 9 de maio. 

“Creio que o presidente Hollande deseja se reunir com os líderes da Caricom para conhecer as principais preocupações dos pequenos Estados insulares em desenvolvimento (PEID) do Caribe e para saber como aproveitar a oportunidade e conseguir algum consenso com vistas à cúpula de Paris”, afirmou à IPS o ministro de Serviço Público, Desenvolvimento Sustentável, Energia e Tecnologia de Santa Lúcia, James Fletcher. 

Serge Letchimy, presidente do Conselho Regional da Martinica, disse à IPS que a cúpula regional nesse país “objetiva a preparação e a mobilização para” a COP 21 e reunirá Estados e territórios caribenhos. A cúpula regional procura elaborar uma lista de iniciativas do Caribe “que devem integrar uma “agenda de soluções adaptada às especificidades de seus territórios”, explicou Maité Cabreral, oficial de comunicações da organização da reunião de Martinica. “Também objetiva contribuir a escrever o ambicioso acordo global vinculante que será adotado na COP 21”, disse Cabrera à IPS.

O ministro de Serviço Público, Desenvolvimento Sustentável, Energia e Tecnologia de Santa Lúcia, James Fletcher, diz que um acordo sobre mudança climática favorável ao Caribe ajudará a proteger o turismo. Foto: Kenton X. Chance/IPS
O ministro de Serviço Público, Desenvolvimento Sustentável, Energia e Tecnologia de Santa Lúcia, James Fletcher, diz que um acordo sobre mudança climática favorável ao Caribe ajudará a proteger o turismo. Foto: Kenton X. Chance/IPS

 

Fletcher também comentou que “nossos representantes participaram das negociações, a primeira foi em Genebra esse ano. Ainda há várias negociações sobre diversos assuntos, adaptação, fundos climáticos, perdas e danos, a CPDN e outras questões”. 

Um terceiro elemento da reunião de Castries teve a ver com a preparação da cúpula do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, e os governantes da Caricom, em Barbados no próximo mês de julho. “Buscamos desenvolver uma posição que permita aos nossos governantes levar uma posição única em matéria de mudança climática à reunião com Ban, que, uma vez mais, tem a ver com esse fenômeno e com os fundos climáticos”, acrescentou Fletcher. 

O ministro, que participou de várias COP 21, como a de Varsóvia em 2013 e a de Lima em 2014, é otimista quanto aos progressos com vistas à COP 21 e acredita que a região “está muito unida em sua posição sobre a mudança climática”. Mas, também acredita que existem áreas onde a região pode melhorar as negociações com vistas à cúpula de Paris, e acrescentou que a coordenação funcionou bem na Terceira Conferência Internacional sobre Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, realizada em Samoa no ano passado.

Fletcher disse à IPS que em Samoa “houve uma forte presença caribenha e uma excelente coordenação para garantir que apresentássemos uma só voz e participamos muito em todas s reuniões, e isso é o que pretendemos que aconteça na França este ano”. O resultado da cúpula de dezembro terá um impacto direto nos habitantes do Caribe, ressaltou. 

Segundo o ministro, “há tempo dizemos que a mudança climática representa uma ameaça à existência dos PEID, que precisamos limitar o aquecimento global a menos de 1,5 grau centígrado com relação à era pré-industrial”. 

Fletcher acrescentou que “acima dessa temperatura a elevação do nível do mar será catastrófica, aumentará a temperatura do oceano cujas águas sofrerão uma acidificação com consequências para a pesca e o turismo, diminuirá a disponibilidade de água com consequências para a agricultura, a vida das pessoas, e também a disponibilidade e acessibilidade a ela”. 

“Acima de 1,5 graus significará um aumento da severidade e da frequência dos eventos climáticos extremos, como tempestades e furacões. Teremos muito em jogo em Paris e não podemos permitir que o acordo seja tal que o clima esquente com consequências catastróficas para nós”, ressaltou Fletcher. Envolverde/IPS