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Costa Rica neutra em carbono: apenas um slogan?

Floresta nublada na Costa Rica. Foto: Germán Miranda/IPS
Floresta nublada na Costa Rica. Foto: Germán Miranda/IPS

 

San José, Costa Rica, 5/2/2014 – Cumprir a meta que a Costa Rica se impôs, de até 2021 ser o primeiro país do mundo com carbono neutro, dependerá da prioridade que lhe der o vencedor do segundo turno da eleição presidencial, em abril. Ser neutro em carbono significa retirar da atmosfera tanto dióxido de carbono quanto se lança. Mas os especialistas duvidam sobre o futuro do chamado plano de carbono neutro, ausente da campanha eleitoral, que terminou no dia 2, sem que nenhum dos candidatos à Presidência conseguisse 40% dos votos necessários para evitar nova votação.

Mais de três milhões de eleitores escolherão, em 6 de abril, entre o centro-esquerdista Luis Guillermo Solís, do opositor Partido Ação Cidadã (PAC), que obteve 31% dos votos, e Johnny Araya, de centro-direita, do governante Partido Libertação Nacional (PLN), que ficou com 29% dos votos, segundo dados oficiais não definitivos.

“Os estudos dizem que a meta de 2021 não é alcançável. Devemos caminhar para essa meta, mas, realisticamente, é provável que estejamos falando de 2025”, disse à IPS a assessora ambiental do PAC, Patricia Madrigal. Para ela, a neutralidade em carbono não deve ser vista de maneira isolada, mas como um eixo orientador de toda a política pública dos próximos governos, com mandatos de quatro anos.

Em 2007, a Costa Rica decidiu se converter em pioneira mundial em carbono neutro e se impôs a meta de fixar tanto dióxido de carbono (CO2) quanto o que emitir até 2021, ano em que será comemorado o bicentenário de sua independência.

Especialistas e funcionários governamentais ouvidos pela IPS reconhecem que o governo que tomar posse em 8 de maio deverá assumir desafios complexos em transporte, energia, ordenamento institucional e agricultura caso desejo cumprir esse prazo. Além disso, acrescentam que é necessária uma vinculação da economia nacional com a luta para mitigar e se adaptar à mudança climática.

“A meta de carbono neutro, por não estar vinculada com o setor de transporte – que é o maior gerador de emissões – ficou no slogan para arrecadar fundos internacionais”, criticou Mónica Araya, diretora da organização Costa Rica Limpa e uma das negociadoras governamentais sobre mudança climática até meados de 2013.

René Castro, ministro de Meio Ambiente e Energia assegurou à IPS que a meta de carbono neutro avançou entre “75% e 80%”. Mas, também reconheceu que a dívida no setor de transporte “é notória”, pois representa 42% das emissões nacionais de CO2. Uma prioridade para avançar mais é reduzir a dependência dos hidrocarbonos e modernizar o obsoleto sistema de transporte público costarriquenho, composto por centenas de linhas de ônibus e um trem recém-inaugurado, que une as quatro maiores cidades.

Os partidos dos dois candidatos à Presidência propõem instalar um trem elétrico na capital e renovar a frota de ônibus e táxis. Este país da América Central, de 51.100 quilômetros quadrados e 4,4 milhões de habitantes, também tem pontos fortes, como o notável avanço na cobertura vegetal, que passou de 21% do território, em 1983, para 52%, em 2012. Este êxito se deve principalmente ao estatal Programa de Pagamento por Serviços Ambientais, precursor local da iniciativa para a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação das Florestas (REDD) no Sul em desenvolvimento.

Entretanto, segundo o documento Estado da Nação 2013, Desafios para 2014-2018, encomendado pelo Conselho Nacional de Reitores de universidades públicas, a pegada de carbono do país cresceu 43% entre 2002 e 2012, quando as emissões de CO2 chegaram a 16 milhões de toneladas. Essa pegada representa o território ecologicamente produtivo necessário para absorver as emissões de carbono.

Os dois partidos que disputarão a possibilidade de governar a partir de maio concordam que é preciso reformar o ordenamento institucional. Atualmente, a autoridade do setor é a Direção de Mudança Climática, vinculada ao Ministério Meio Ambiente e Energia (Minae). O PAC quer um “supraministério”, que coordene a atuação frente à mudança climática, enquanto o PLN propõe adotar uma estratégia nacional específica.

Dentro do aparelho estatal também há atores que pedem urgência na renovação da estrutura institucional, corroída por uma dissociação entre a tarefa encomendada às instituições e o poder real que têm. “A agenda de mudança climática deve se converter em uma agenda de desenvolvimento e que não seja uma responsabilidade exclusiva do Minae, que é frágil e com recursos limitados”, afirmou à IPS o diretor de Mudança Climática do ministério, William Alpízar.

Para ser neutra em carbono, a Costa Rica deve reduzir ao máximo suas emissões de CO2 e compensar as remanescentes mediante a absorção por novas florestas. O setor privado participa do esforço mediante certificações de carbono neutro. A Direção de Mudança Climática já certificou oito empresas e outras quatro estão com o processo em análise.

Durante a 19ª Conferência das Partes (COP 19) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, realizada em novembro em Varsóvia, a Costa Rica apresentou o projeto do primeiro banco de CO2, destinado a negociar bônus de carbono entre empresas emissoras e donos de terrenos com florestas que os capturem. Os números oficiais mostram que o país emitirá cerca de 21 milhões de toneladas de carbono até 2021, das quais espera compensar 75% com a captura por suas florestas, uma quantidade praticamente igual à de suas emissões atuais.

“De acordo com um exercício que fizemos há cerca de nove meses, temos um buraco para preencher de 5,2 milhões de toneladas. Isso é o que temos de reduzir e se divide em transporte, agricultura e resíduos”, pontuou Alpízar. A crítica a esse modelo diz que destina a carga de reduzir as emissões à cobertura florestal, sem propor uma mudança real de políticas para um desenvolvimento plenamente adaptado à mudança climática.

“Em nome do carbono neutro deixamos tudo o que temos de fazer com a mudança climática”, apontou à IPS o auditor ambiental Jorge Polimeni, da Fundação Bandeira Ecológica, promotora de uma adaptação mais integrada aos embates do fenômeno. O estudo Impacto Econômico dos Fenômenos Hidrometeorológicos na Costa Rica, coordenado pelo pesquisador Roberto Flores, concluiu, no ano passado, que, entre 2005 e 2011, os efeitos da mudança climática custaram ao país US$ 710 milhões. Envolverde/IPS