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Estados Unidos debatem quando e como intervir na Síria

Soldados rebeldes sírios. Foto: FreedomHouse/CC by 2.0
Soldados rebeldes sírios. Foto: FreedomHouse/CC by 2.0

 

Washington, Estados Unidos, 28/8/2013 – Cresce o debate nos Estados Unidos sobre quando deveria ser realizada e qual alcance deveria ter uma eventual ação militar na Síria, o que parece cada vez mais inevitável. Por um lado, os “falcões”, os mais belicistas de Washington, afirmam que a credibilidade internacional do presidente Barack Obama está em jogo. Estes pressionam o presidente a agir, sobretudo depois que seu secretário de Estado, John Kerry, afirmou que o presidente sírio, Bashar al Assad, deveria ser responsabilizado pelo ataque com armas químicas em um subúrbio de Damasco, que teria matado centenas de pessoas.

Há apenas um ano Obama advertia o regime de Assad de que o uso dessas armas cruzaria uma “linha vermelha” e “mudaria as regras do jogo”, forçando Washington a reavaliar sua política de não dar ajuda militar direta aos rebeldes e de evitar intervir no conflito. Depois que a inteligência norte-americana confirmou, no começo deste ano, que as forças de Assad usaram em várias ocasiões limitadas quantidades de armas químicas contra rebeldes, o governo de Obama anunciou que começaria a fornecer armas às forças de oposição sírias, embora os insurgentes se queixem de que esse apoio ainda não se concretizou.

Os falcões também apontam que uma ação militar norte-americana é necessária para deixar claro que massacres como o denunciado nos últimos dias não ficarão impunes. O bombardeio no subúrbio de Damasco teria sido o mais mortal já feito com armas químicas desde o massacre de Halabja, em 1988, por parte das forças do Iraque contra a população curda. Na época, os Estados Unidos não denunciaram a matança.

A ação militar contra a Síria deve ser “suficientemente grande para passar a mensagem de que as armas químicas, bem como as de destruição em massa, simplesmente não podem ser usadas com impunidade”, disse no dia 26, em teleconferência com jornalistas, o presidente do independente Conselho de Relações Exteriores, Richard Haass. Os falcões, cuja posição conta com o forte apoio de Grã-Bretanha, França, Israel e dos países do Golfo, claramente têm o vento a seu favor. Mas as “pombas”, menos belicistas, não se rendem.

Alguns recordam os erros e as distorções da inteligência norte-americana à véspera da invasão do Iraque em 2003, e por isso alertam para os perigos de agir de forma precipitada na Síria. Portanto, aconselham a esperar o fim dos trabalhos da equipe de especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU) enviada à Síria para investigar o uso de armas químicas, para dessa forma, ao menos, convencer outros governos de que Washington não está evitando novamente um processo multilateral, como fez no caso do Iraque.

A ação militar poderia desatar uma escalada bélica que os Estados Unidos não necessariamente estão em condições de controlar, alertou o destacado analista neoconservador Eliot Cohen no jornal The Washington Post. “Os jogadores de xadrez que pensam em um movimento antes do tempo geralmente perdem. O mesmo acontece aos presidentes que creem poder ganhar lançando um ataque durante um ou dois dias e depois se retirar”, escreveu Cohen, que foi conselheiro da ex-secretária de Estado Condolezza Rice.

Na mesma linha opinou o coronel da reserva Lawrence Wilkerson, que serviu por 16 anos como chefe do Estado Maior. “O que acontecerá se Obama lançar mísseis cruiser contra uns poucos objetivos e Assad não fizer nada e disser ‘ainda estou ganhando’?. O que fazer nesse caso?”, perguntou. “Automaticamente se intensifica o ataque e se estabelece uma zona de exclusão aérea, com os desafios que isso implica. E o que acontece, então, se isso não incomodar Assad?”, acrescentou. “Certamente, há interesses mais vitais no Irã do que na Síria. Não se pode negociar com o Irã se estiver bombardeando a Síria”, ressaltou o militar.

Com ele concorda o presidente do Conselho Nacional Iraniano-Norte-Americano, Trita Parsi. “Há uma verdadeira oportunidade para uma diplomacia de sucesso no assunto nuclear iraniano, mas essa oportunidade pode ser minada ou arruinada por completo se a intervenção na Síria colocar Estados Unidos e Irã em um enfrentamento direto”, advertiu Parsi à IPS. Além disso, afirmou, Washington deve considerar assuntos humanitários antes de lançar a intervenção.

Seja como for, em Washington se dá como certo que haverá uma ação militar contra a Síria, provavelmente aérea, já que mesmo os falcões mais agressivos, como os senadores John McCain e Lindsay Graham, do opositor Partido Republicano, descartam uma incursão terrestre. O que se debate é se Washington primeiro deve solicitar ao Conselho de Segurança da ONU que aprove a ação militar, embora seja muito provável que China e Rússia vetem uma resolução nesse sentido.

“Cada vez que evitamos o Conselho por temor de um veto russo ou chinês cravamos uma estaca no coração da segurança coletiva”, afirmou Daryl Kimball, diretor-executivo da Associação para o Controle de Armas. “Isso não está dentro de nossos interesses de longo prazo”, destacou. Entretanto, os falcões, tanto dentro quanto fora do governo, cobram de Obama que siga o precedente da campanha aérea da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) na Guerra de Kosovo, em 1999.

O então presidente Bill Clinton (1993-2001) ignorou a ONU e convenceu seus aliados na Otan a apoiarem uma intervenção militar na ex-Iugoslávia argumentando razões humanitárias. Depois de um bombardeio que durou 78 dias, o então presidente iugoslavo, Slobodan Milosevic (1997-2000) retirou suas tropas da maior parte da província de Kosovo, mas não antes de a Otan ameaçar enviar tropas por terra.

Estima-se que Obama estaria disposto a autorizar apenas ataques com mísseis cruiser, lançados de fora de território sírio para minimizar os riscos aos pilotos norte-americanos, mas não está claro quais seriam os objetivos. Alguns falcões, incluindo McCain e Graham, propõem que seja destruída a frota aérea da Síria e sua capacidade balística, mas que também sejam criadas zonas de exclusão aérea e áreas seguras para civis e rebeldes.

Entretanto, outros alertam que a oposição síria está cada vez mais dominada por islâmicos radicais, alguns filiados à rede Al Qaeda, e afirmam que os objetivos da intervenção devem incluir também o de impulsionar as forças mais moderadas. Envolverde/IPS