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Fida destaca autogestão comunitária do sul rural peruano

O presidente do Fida, Kanayo Nwanze, e, à sua direita, o ministro da Agricultura do Peru, Milton von Hesse, compartilham com representantes da comunidade os frutos da missão participativa. Foto: Milagros Salazar/IPS
O presidente do Fida, Kanayo Nwanze, e, à sua direita, o ministro da Agricultura do Peru, Milton von Hesse, compartilham com representantes da comunidade os frutos da missão participativa. Foto: Milagros Salazar/IPS

 

Quequeña, Peru, 7/8/2013 – Cerca de 40 barracas multicoloridas levantadas como pequenos laboratórios de desenvolvimento rural, na praça principal deste distrito do departamento do sul peruano de Arequipa, mostraram ao presidente do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), Kanayo Nwanze, os frutos da colaboração de 20 anos entre a agência e este país.

Pratos preparados à base de quinoa, fungos comestíveis processados a mais de quatro mil metros de altitude, porquinhos-da-índia gordos e vestidos de cores muito vivas, mel de abelhas, queijos e maquetes simulando povoados, rios e passagens estreitas entre montanhas, foram apresentados ao som de uma banda de música popular.

Durante sua primeira visita ao Peru, o especialista nigeriano que preside o Fida percorreu, no dia 3, a localidade de Quequeña, epicentro de um mercado vigoroso, aonde chega o que é produzido por comunidades de Arequipa e dos vizinhos departamentos de Moquegua, Cusco e Puno.

“Não é de estranhar o Peru ter sido o laboratório onde decidimos empreender estas iniciativas”, disse à IPS a dominicana Josefina Stubbs, diretora da Divisão da América Latina e do Caribe do Fida. Stubbs, que acompanhou Nwanze, explicou que a intervenção mediante o Comitê Local de Destinação de Recursos, desenvolvida no sul peruano, chamou a atenção de países como Vietnã, Camboja e Indonésia.

Os técnicos peruanos viajarão em breve à China para compartilhar sua experiência, que se baseia fundamentalmente em atender a demanda das comunidades e a transparência no manejo dos recursos, explicou Stubbs. O dinheiro que o Fida entrega ao governo peruano é transferido para a conta bancária dos produtores da comunidade, detalhou.

Este projeto em andamento no sul do Peru é o mais antigo dos três que o governo executa com empréstimos e assessoria técnica do Fida em outras zonas rurais. Em Arequipa, as comunidades propõem e executam iniciativas produtivas que as ajudam a gerar renda para atender suas necessidades fundamentais. Melhoria de cultivos, criação de porquinhos-da-índia e de gado, elaboração de tecidos e gastronomia com produtos autóctones são alguns dos empreendimentos.

“O Fida apoia os esforços do governo para que as pessoas sejam capazes de produzir o suficiente ou que possam comprar o que necessitam para se alimentar por elas mesmas”, ressaltou Nwanze à IPS. No dia seguinte, Nwanze continuou pelas comunidades alto-andinas de Sibayo e Callalli, também em Arequipa, e, finalmente, no dia 5, regressou a Lima e seguiu para a Colômbia, onde são replicadas experiências como as dos povos reunidos em Quequeña, a uma hora de carro da capital do departamento.

O Fida, uma agência da Organização das Nações Unidas (ONU), conta a cada três anos com US$ 300 milhões a US$ 400 milhões para conceder empréstimos dirigidos ao desenvolvimento agrícola e rural na América Latina, onde patrocina projetos de diferentes tipos em quase todos os países. Nwanze acrescentou que o próximo passo do trabalho no Peru será garantir a descentralização do manejo dos projetos para “que as autoridades regionais assumam diretamente a responsabilidade do programa e do financiamento”. Como exemplo, disse que a organização que preside já trabalha na Argentina e no Brasil.

Nesse sentido, Stubbs informou à IPS que a ideia é que mais localidades se apropriem destas iniciativas. Com este objetivo, as autoridades do Fida se reuniram, no dia 3, com o presidente do governo departamental de Arequipa, Juan Manuel Guillén. O que acontecerá agora será a formação de um grupo de trabalho que coloque para andar esta nova etapa, acrescentou.

Por sua vez, o ministro da Agricultura do Peru, Milton von Hesse, destacou que os maiores acertos do Fida são considerar o camponês “o mais qualificado para decidir que tipo de assistência técnica precisa” e fomentar a articulação dos mercados. O importante é que o que é produzido pelos camponeses finalmente cruze as fronteiras de sua comunidade e inclusive do país, destacou. “Foram 20 anos de aprendizagem contínua, também erramos. Mas o importante é que aquelas experiências que deram certo já foram incorporadas nas políticas e continuaremos fazendo isso com todas as lições aprendidas”, disse o ministro à IPS.

O Fida continua dando empréstimos, mas, sobretudo, assistência técnica aos países de renda média com o Peru porque, como pontuou Stubbs, “a estabilidade macroeconômica não é suficiente para o desenvolvimento”. E acrescentou que, “pela primeira vez, tenho o privilégio de ver que todos os governos, de qualquer tendência política, realmente entenderam que fechar as brechas de desigualdade é conveniente a todo o mundo”, ressaltou.

Juan Moreno, gerente de programas da Divisão da América Latina e do Caribe do Fida, informou à IPS que a agência conta com US$ 25 milhões para trabalhar com o Peru até 2015. “Não se trata de termos US$ 1 bilhão como o Banco Mundial… A América Latina não precisa do dinheiro do Fida, mas do conhecimento do Fida”, ressaltou Stubbs. Como exemplo citou o caso da Argentina, que há dois anos executou um projeto de US$ 150 milhões, dos quais o Fida entrou com apenas US$ 7 milhões. A maior parte foi colocada pelo governo.

Em meio a um crescimento econômico regional baseado nas indústrias extrativistas, Stubbs destacou que deve haver maior vigilância dos governos e da sociedade civil sobre a forma como acontecem estas atividades para conservar as fontes de água e as terras, das quais dependem as populações mais pobres para sua subsistência. Para Stubbs, cada país deve empreender seu desenvolvimento segundo seu ecossistema.

Por sua vez, Nwanze destacou que os governos devem investir em infraestrutura como a construção de estradas para gerar novas oportunidades de desenvolvimento local. Isto dá lugar ao empoderamento econômico e, quando isto ocorre, sobretudo com as mulheres, “a comunidade começa a mudar”, enfatizou.

É difícil descrever em uma linha como enfrentar a pobreza, mas o acesso a serviços básicos é crucial para trabalhar com as comunidades mais desfavorecidas de uma perspectiva de direitos humanos, apontou Nwanze. “Os direitos fundamentais estão basicamente em tudo, não consistem apenas em as pessoas terem liberdade de se expressar”, destacou o especialista nigeriano antes de encerrar sua viagem ao Peru. Envolverde/IPS