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Gaza sob fogo: um desastre humanitário

Após um ataque aéreo israelense, jovens palestinos inspecionam o prédio onde viviam suas famílias. Foto: Khaled Alashqar/IPS
Após um ataque aéreo israelense, jovens palestinos inspecionam o prédio onde viviam suas famílias. Foto: Khaled Alashqar/IPS

 

Gaza, Palestina, 23/7/2014 – Os 15 dias de bombardeios israelenses contra o norte de Gaza já obrigaram milhares de civis a fugirem de suas casas em busca de abrigo nas escolas coordenadas pela Agência da Organização das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA). Entre os mais afetados estão as crianças, que vivem com medo e em perigo constantes, segundo Sami Awaida, psiquiatra infantil do Programa de Saúde Mental de Gaza, uma organização humanitária especializada em traumatismos derivados da guerra e problemas de saúde mental.

“As crianças de Gaza sofrem ansiedade, medo e insegurança, como consequência desta situação de guerra. O desafio que enfrentamos agora como profissionais da saúde mental é o “transtorno por estresse pós-traumático”, explicou Awaida à IPS. Este tipo de problema se caracteriza por sintomas específicos que surgem após a exposição a um fato estressante, extremamente traumático, que envolve um dano físico ou uma grave ameaça para a pessoa em questão.

“As crianças de Gaza já sofreram duas recentes experiências violentas e traumáticas em 2009 e 2012”, recordou Awaida, se referindo às duas últimas ofensivas de Israel que deixaram mais de 1.150 mortos e milhares de feridos no território palestino. “Agora este trauma volta a gerar a dor e o choque anteriores, e também conduz a um estado mental de medo e insegurança permanente”, ressaltou.

Desde o dia 7, Israel submete a Faixa de Gaza a uma forte ofensiva militar e ataca as facções palestinas em uma nova rodada de violência no Oriente Médio.

O Ministério da Saúde palestino divulgou até agora o número de 230 mortos, em sua maioria famílias inteiras que morreram pelo bombardeio de suas casas, enquanto o número de feridos subiu para 2.500. Muitas das vítimas são crianças. Mas os dados de fontes situadas em Gaza indicam que as vítimas mortais já passam de meio milhão.

Por outro lado, os centros sanitários sofrem grave escassez de suprimentos, equipamentos e pessoal para fazer frente à emergência. Ashraf Al Qedra, porta-voz do Ministério da Saúde de Gaza, apelou à comunidade internacional para que “apoie os hospitais com suprimentos médicos de urgência, pois Israel continua com seus ataques militares que deixaram mais de 800 moradias totalmente destruídas e 800 famílias desamparadas”.

As forças militares israelenses foram acusadas de realizar uma política de destruição de casas palestinas e de massacre de civis desde que Israel começou sua atual ofensiva. Adnan Abu Hasna, assessor de imprensa e porta-voz da UNRWA, disse à IPS que a agência “pediu oficialmente que Israel respeite o direito internacional humanitário e a neutralidade dos civis na operação militar”.

A “UNRWA insiste na necessidade de cumprir o apelo do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, de cessar imediatamente a violência, devido ao crescente número de crianças e mulheres mortas pelos ataques e bombardeios de Israel sobre Gaza”, acrescentou Hasna.

Assam Yunis, diretor do Centro Al Mezan para os Direitos Humanos em Gaza, falou à IPS sobre as violações aos direitos humanos e a necessidade urgente de justiça.

“A situação atual é catastrófica em todos os aspectos”, afirmou. As violações dos “direitos humanos por parte de Israel são incríveis e incluem ataques contra equipes médicas e jornalistas, além de crianças e mulheres”, enfatizou Yunis. “São violações claras do direito internacional, bem como crimes de guerra. Israel deve ser considerado legalmente responsável em nível internacional”, insistiu.

O analista político Ibrahim Ibrash opinou que “Israel nunca conseguirá acabar com o movimento islâmico Hamas nem com a resistência palestina de Gaza. Por outro lado, os combatentes palestinos jamais conseguirão destruir e derrotar Israel”. As consequências para os palestinos no plano interno depois de terminar o conflito militar serão essenciais, incluída a “divisão entre a população e a Autoridade Nacional Palestina. Muitos ficarão indignados com o governo, e isto, naturalmente, deixará Gaza em um estado deplorável”, acrescentou.

O conflito acontece no contexto do bloqueio imposto por Israel à Faixa de Gaza, com desemprego generalizado, pobreza extrema, cortes de eletricidade, fechamento de fronteiras e passagens desde 2006, infraestrutura destruída e uma economia paralisada. Tudo isto se combina com a falta de progressos políticos na mediação entre israelenses e palestinos.

Ninguém pode negar que a população civil de Gaza seja a verdadeira vítima deste conflito. Envolverde/IPS