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O que fazer e o que não fazer sobre drogas

O fórum realizado em Bogotá é o terceiro de uma série proposta em Havana pela mesa de negociação entre o governo da Colômbia e as guerrilheiras Farc. Foto: Andrés Bernal/Pnud
O fórum realizado em Bogotá é o terceiro de uma série proposta em Havana pela mesa de negociação entre o governo da Colômbia e as guerrilheiras Farc. Foto: Andrés Bernal/Pnud

 

Bogotá, Colômbia, 30/9/2013 – A erradicação de cultivos para elaborar drogas “é um mito do folclore”. O único efeito que tem é que um produtor de coca está há sete anos na Presidência da Bolívia, disse a especialista norte-americana Kathryn Ledebur, em um fórum de três dias realizado na semana passada nesta capital. É a demanda no exterior que o impulsiona”, acrescentou Ledebur, diretora da Rede Andina de Informação, entidade não governamental com sede na cidade boliviana de Cochabamba, que estuda os impactos da guerra contra as drogas promovida pelos Estados Unidos.

As conclusões do Fórum Nacional Sobre a Solução Para o Problema das Drogas Ilegais, realizado, entre os dias 24 e 26 deste mês, pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela estatal Universidade Nacional, serão levadas à mesa de negociações entre o governo de Juan Manuel Santos e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), instalada há um ano em Havana.

O empresariado não participou do encontro, evidenciando seu descontentamento com a ONU, pelo fato de esta ter apoiado o protesto camponês de Catatumbo, região limítrofe com a Venezuela, e mediado a subsequente greve nacional dos trabalhadores agropecuários e mineiros.

A greve em Catatumbo durou 53 dias até que, no começo de agosto e com mediação das Nações Unidas, o governo foi forçado a negociar pontes, estradas e a não fumigação de cultivos de coca, entre outros pontos. A greve nacional de atividades rurais começou em 19 de agosto e ainda está latente, embora o governo dialogue com a Mesa Nacional Agropecuária e Popular (MIA), que reúne 60% dessa mobilização.

Sobre esse não comparecimento, o coordenador residente da ONU na Colômbia, Fabrizio Hochschild preferiu destacar que se tratou de uma “oportunidade perdida para contribuir com soluções”, e afirmou à IPS que “o tema das drogas ilícitas, queiramos ou não, é muito relevante para a segurança no campo e o desenvolvimento agrário”.

“Participaram mais de mil pessoas, 800 delas dessas regiões (de cultivos ilegais) e teria sido uma grande oportunidade para os sindicatos empresariais explicarem seus pontos de vista e propor soluções e ouvir outras opiniões”, pontuou Hochschild. “Para chegar a boas soluções é muito importante ter intercâmbios com diferentes pontos de vista, não boicotando ou evitando eventos. Isso não leva a parte alguma”, ressaltou.

Rafael Mejía, presidente da Sociedade de Agricultura da Colômbia e da mesa diretora do Conselho Sindical Nacional, rechaçou que a ausência dos empresários foi um boicote. “Simplesmente não fomos”, declarou à IPS, pois só foram comunicados pela ONU com oito dias de antecedência. Mejía discutiu dois dias com outros sindicatos sobre a participação, mas então a greve se agravou em diferentes regiões e a ONU interveio como mediadora. “Justo ou não, legal ou ilegal, a institucionalidade foi desrespeitada”, opinou.

Além disso, parece que “essas paralisações são organizadas pelas Farc. É o que nos informa a Inteligência” (agentes de segurança do Estado), contou Mejía. “Quando se olha no mapa onde estão os cultivos de substituição (das plantações ilícitas), se o transporte para levar o produto até o mercado não é subsidiado, não é sustentável. Por isso se deve buscar alternativas, não soluções simplistas”, acrescentou.

Para Ledebur, não se deveria “confundir o narcotráfico, um negócio multinacional de milhares de milhões de dólares, com as pessoas que tem alguma conexão por necessidade, para alimentar sua família, por serem excluídas”, ressaltou à IPS, questionando, como o general da reserva Rafael Colón, a forma de medir os resultados da luta antidrogas.

“O sucesso se mede não na quantidade de hectares erradicados, nem em droga apreendida, nem em gente detida ou processada, mas em indicadores de serviços básicos como bem-estar social, acesso à saúde, à educação e à nutrição pela população”, disse Ledebur. Para o norte-americano Adam Isacson, especialista do não governamental Escritório em Washington para Assuntos Latino-Americanos, “deve-se deixar de fumigar e seguir a pista do dinheiro, que é a melhor maneira de desmontar as redes criminosas”.

No Fórum houve apelos para diferenciar entre a coca (vegetal andino de cosumo tradicional com importantes propriedades alimentícias) e a cocaína, a droga elaborada a partir dessa planta. Se a ideia é substituir a produção por outros cultivos, é fundamental contar com a participação do produtor nas alternativas e, inclusive, considerar que sejam mantidas as plantações para drogas enquanto são consolidadas outras colheitas.

O especialista colombiano Ricardo Vargas, do Transnational Institute, expôs um tema que não consta da agenda de negociação entre o governo e as Farc, que só fala de produção, fabricação, exportação e consumo de drogas e de substituição de seus cultivos. Vargas afirmou que o governo está interessado em que as Farc abandonem as atividades do narcotráfico, “sobretudo os cultivos e a pasta básica e o controle territorial (necessário) para isso”.

Entretanto, o narcotráfico também apoia ativamente a estratégia contrainsurgente. Nas décadas de 1980 e 1990 pagou treinamento estrangeiro, armas e milícias de ultradireita para combater a guerrilha, e “isso mudou toda a dinâmica da guerra”, disse Vargas à IPS. Em 40 anos de narcotráfico na Colômbia, a sociedade está permeada por “práticas de cultura mafiosa que levam a pular a lei e instrumentalizá-la para benefício privado, e essa é a herança mais difícil de solucionar”, ressaltou.

No entanto, “já foram instaurados controles mafiosos que diversificam fontes de renda. Seus comportamentos são legitimados em múltiplas regiões, onde estão intatos esses poderes que concentram terra, controlam o poder político e financiam campanhas eleitorais”. Envolverde/IPS