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Vigília pelas baleias do Atlântico Sul

Baleia franca do Atlântico Norte. Foto: IFAW CC-BY-NC

 

Buenos Aires, Argentina, 2/7/2012 – A criação de um extenso refúgio para as baleias do Oceano Atlântico, chave para o turismo sustentável, será apresentada para votação da comunidade internacional, no Panamá, e a América Latina luta por sua aprovação. Hoje, começa a reunião da Comissão Baleeira Internacional (CBO), integrada por 88 países, que deverá decidir sobre a criação do Santuário Baleeiro do Atlântico Sul, proposta que é apresentada desde 2001. A votação acontece no primeiro dia de deliberações da CBI, que continuarão até o dia 6.

“As baleias são as florestas dos oceanos e, por nós e pelas futuras gerações, devemos protegê-las”, disse à IPS, do Panamá, a argentina Roxana Schteinbarg, coordenadora-executiva do Instituto de Conservação de Baleias. “Os santuários são a ferramenta de manejo mais eficaz para dar às baleias um lar seguro nos oceanos”, pontuou a ativista, que integra o grupo da sociedade civil que participou das deliberações prévias ao encontro oficial.

Em 1979 a CBI criou o Santuário Baleeiro do Oceano Índico, e, em 1994, o do Oceano Austral. Contudo, desde 2001, a rejeição à proteção das baleias, liderada pelo Japão, impede a criação de uma área semelhante no Atlântico. Apesar da resistência de Tóquio, a CBI aprovou, em 1982, uma suspensão da caça comercial, que entrou em vigor em 1986. Porém, o Japão continua capturando sob a polêmica autorização para fins científicos, concedida pela CBI.

“Desde a moratória, o Japão capturou mais de oito mil exemplares no Santuário do Oceano Austral, convertendo suas águas em cenário de um massacre de baleias que devem ser protegidas”, denunciou à IPS a chilena Elsa Cabrera, também desde o Panamá. Cabrera, diretora-executiva do Centro de Conservação Cetácea do Chile, alertou que o santuário Atlântico permitiria ampliar a extensão protegida ali onde se praticou a maior caça comercial em grande escala antes da moratória.

A área proposta compreende toda a extensão leste-oeste do Atlântico, desde o extremo norte do Brasil até o sul da Argentina, e desde a Guiné Equatorial, na África, até o ponto mais austral da África do Sul. Desta forma, seriam protegidas 54 espécies que representam mais de 60% dos cetáceos do planeta, dos quais sete espécies intensamente migratórias, pois se alimentam na região antártica e se reproduzem em águas subtropicais, tropicais e temperadas, explicou Cabrera. “Por isso, para preservar estas espécies a área deve ser extensa”, destacou.

Embora o apoio à iniciativa cresça sistematicamente, os ativistas temem que os países que apoiam a caça comercial novamente travem o projeto, que exige maioria de três quartos dos votos. Schteinbarg afirmou que uma “corrupta política de compra de votos por parte do Japão” freou outras vezes a criação do santuário. Em 2011, Brasil e Argentina apresentaram novamente a iniciativa, que esteve perto de ser aprovada. Entretanto, um grupo de países aliados do Japão abandonou o recinto no momento da votação e bloqueou a assembleia que se viu obrigada a adiar a decisão até este ano, no Panamá.

Os santuários são áreas “livres da caça de baleias, onde são proibidas atividades que possam hostilizar” os animais e que permitem garantir sua proteção no longo prazo, explicou à IPS o brasileiro José Truda Palazzo, também entrevistado por telefone, desde o Panamá. Conservacionista de extensa carreira e ex-chefe da delegação oficial brasileira na CBI, Truda ressaltou que “nos santuários as baleias encontram o ambiente necessário para sua reprodução, criação, amamentação, alimentação ou migração, sem a ameaça da caça”.

Não são áreas completamente restritas, já que se permite a pesquisa não letal e incentiva-se o turismo de observação, que cresceu ao ritmo de 11,3% ao ano desde 1998, beneficiando cerca de 500 comunidades em todo o mundo, acrescentou Truda. “É anacrônico continuar pensando em comercializar a carne dessas espécies. Uma baleia viva pode ser vista e revista ao longo de sua vida. Já a indústria baleeira esgota o recurso e beneficia uns poucos”, enfatizou.

Os três especialistas consultados coincidiram em afirmar que a sociedade civil e os governos da América Latina somaram esforços para esta iniciativa já que o santuário favorece interesses de muitas comunidades que vivem do uso não letal das baleias. Schteinbarg observou que, por meio do Grupo de Buenos Aires, criado em 2006 na capital argentina, os países latino-americanos se colocaram como um coletivo “muito ativo” em favor da conservação e de uma radical mudança na estratégia da CBI. Envolverde/IPS