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A cura da Terra já existe

Uxbridge, Canadá, 6/6/2012 – O Ártico alcançou uma concentração recorde de dióxido de carbono de 400 partes por milhão (ppm). A última vez que a Terra registrou níveis semelhantes foi há três milhões de anos, durante a era do Plioceno. Então, as temperaturas do Ártico eram entre 10 e 14 graus mais altas e, as globais, quatro graus mais elevadas. Nesta primavera boreal, todos os centros de pesquisa no Alasca, na Groenlândia, Noruega, Islândia, e inclusive Mongólia, registraram níveis superiores à barreira dos 400 ppm pela primeira vez, informaram cientistas.

Entretanto, a média mundial é de 392 ppm, e para chegar aos 400 ainda falta muito. Se os níveis de dióxido de carbono (CO2) não baixarem, ou, pior, aumentarem, o planeta inevitavelmente alcançará temperaturas mais altas, e para isto não serão necessários milhões de anos. Se não houver grande redução nas emissões de gases gerados por combustíveis fósseis, quem nascer hoje poderá viver em um mundo superaquecido em quatro graus quando for adulto. Este aumento fará com que a maior parte da Terra fique inabitável. Um mundo mais quente significará a morte para muitas pessoas no mundo, afirmou Chris West, do Programa de Impacto Climático, da britânica Universidade de Oxford.

Esta semana, a Agência Internacional de Energia informou que as emissões mundiais de CO2 cresceram 3,2% em 2011, com relação a 2010. Esta é precisamente a direção errada: as liberações de gases devem diminuir 3% ao ano para se ter alguma esperança quanto a um futuro de clima estável. Até 2050, em um mundo com mais habitantes, as emissões de carbono deveriam cair pela metade. Isto é impossível? Não. Várias análises diferentes mostram como isso pode ser alcançado.

Por exemplo, a consultoria holandesa Ecofys publicou em 2010 um estudo técnico intitulado O Informe de Energia, no qual demonstra como o mundo poderia usar somente fontes renováveis até 2050. O Greenpeace tem um plano denominado (R)evolução Energética, e a Agência Internacional de Energia conta com o seu próprio estudo, chamado Cenário 450. Não existe carência de conhecimento técnico sobre como reduzir as emissões.

Alguns países já começaram a tomar medidas. A Alemanha obteve mais de 30% de sua energia com a luz solar de um único dia claro na última semana de maio. Em lugar de utilizar suas 20 ou mais centrais de carvão, este país empregou energia de mais de um milhão de painéis solares localizados em casas, edifícios e ao lado de estradas. Embora não se caracterize por ter um clima quente, a Alemanha conta com mais painéis solares do que o resto do mundo somado. Atende 4% de suas necessidades anuais de eletricidade graças à energia solar. Inclusive, poderia aumentar sua produção solar entre 5% e 10%, segundo especialistas, sobretudo graças às últimas reduções no custo dos painéis.

A diferença na Alemanha é a liderança. A revolução das energias renováveis nesse país foi iniciada em 2000, pelo então ministro da Economia, Hermann Scheer, que promoveu durante anos esta política para impedir que os sucessivos governos a deixassem de lado. Morreu repentinamente em 2010, mas outros líderes alemães, apoiados por grupos ambientalistas e pelo público em geral, continuam pressionando por mais apoio às energias renováveis.

A chefe de governo, Angela Merkel, reverteu sua política de apoio ao setor nuclear depois do acidente na central japonesa de Fukushima, no ano passado. A Alemanha anunciou que fechará suas 17 usinas atômicas até 2022 e adotou o ambicioso plano de energias renováveis chamado Agora Energiewende. Se obtiver sucesso, o programa fará com que pelo menos 40% da energia do país proceda de fontes renováveis, até 2022. Representantes do poderoso setor energético expressaram seu descontentamento com o plano de Merkel, e a chanceler disse que precisará de forte apoio público para seguir adiante.

O setor das energias renováveis na Alemanha emprega mais pessoas do que o automotivo. No mundo, as energias renováveis empregam atualmente cerca de cinco milhões de trabalhadores, mais do que o dobro no período de 2006-2010, segundo estudo divulgado na última semana de maio pela Organização Mundial do Trabalho (OIT). A passagem para uma economia verde poderá gerar entre 15 milhões e 60 milhões de empregos adicionais em todo o planeta nas próximas duas décadas, podendo tirar milhões de pessoas da pobreza, afirma o estudo Trabalhando para um Desenvolvimento Sustentável.

Apenas entre dez e 15 indústrias respondem por 70% a 80% das emissões de CO2 nos países industrializados, destaca o informe. E estas indústrias empregam apenas de 8% a 12% da força de trabalho. Mesmo adotando políticas para conseguir grandes reduções das emissões, apenas uns poucos perderiam seus empregos. “A sustentabilidade ambiental não mata empregos, como às vezes se diz”, ressaltou o diretor-geral da OIT, Juan Somavia. “Pelo contrário, se é manejada de forma adequada, pode derivar em mais e melhores empregos, em redução da pobreza e inclusão social”, acrescentou. Envolverde/IPS