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Abuso sexual deixa meninas sem educação

Escola primária em Goroka, Papua Nova Guiné. Foto: Catherine Wilson/IPS

Goroka, Papua Nova Guiné, 3/5/2012 – O assédio sexual contra meninas e adolescentes em Papua Nova Guiné é um dos fatores que impedem este país insular de eliminar as desigualdades de gênero no ensino primário e secundário. A meta, incluída nos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, prevê erradicar as desigualdades em todos os níveis do ensino até 2015.

A Constituição deste país garante a participação equitativa de homens e mulheres no desenvolvimento nacional, mas fatores políticos, culturais, sociais e de infraestrutura impedem que meninas e adolescentes permaneçam dentro do sistema, o que se reflete na falta de representação feminina na força de trabalho, na governança e nos processos de tomada de decisões.

Em uma lista de 187 países, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) coloca Papua Nova Guiné na posição 153 por sua situação em matéria de igualdade de gênero. As moças costumam avançar no sistema educacional, em média, até o décimo grau, enquanto os homens vão dois anos além, finalizando o ensino secundário, segundo o Departamento de Educação. Contudo, a diversidade cultural e geográfica deste país faz com que a situação varie segundo a região.

Na Região Autônoma de Bougainville, onde prevalecem as sociedades matrilineares, a escola tem 16.120 mulheres e 16.821 homens matriculados. Em Terras Altas Orientais, há 51% de meninos escolarizados e 36,5% de meninas. Em 2008, havia 7.127 rapazes e 5.872 moças no terceiro ano primário. No entanto, no 12º ano eles eram notória maioria, 494 contra 180.

Nesta província de Terras Altas, cuja capital é Goroka e onde a maioria da população pratica uma agricultura de subsistência e a renda média é baixa, as meninas estão em uma situação particularmente desvantajosa, sobretudo pela falta de escolas. “O mau estado dos centros de ensino, especialmente nas áreas rurais, é um obstáculo importante para conseguir resultados equitativos no âmbito educacional”, indicou Arnold Kukari, líder do programa de pesquisa em educação básica universal, do Instituto Nacional de Pesquisa.

Betty Hinamunimo, da organização não governamental Care International, afirmou que, entre os fatores que prejudicam a educação feminina, estão “a distância e as barreiras culturais e sociais, como o medo das famílias de enviá-las às cidades, onde não têm garantias sobre sua segurança”. A Care trabalha em coordenação com o Departamento de Educação. Em Papua Nova Guiné, as meninas têm um alto risco de sofrerem violência sexual e doméstica, de sofrerem assédio sexual nas escolas e exploração comercial, e de contrair o vírus HIV, causador da aids, o que coloca em risco sua saúde e educação.

“Quando fizemos um estudo sobre violência contra meninas e meninos, em 2005, as meninas de escolas rurais disseram que eram assediadas por professores e seus colegas, especialmente durante o trajeto de casa até a escola” e vice-versa, disse Ume Wainetti, do Centro de Ação Contra a Violência Sexual e Familiar (FSVAC), com sede em Port Moresby. Muitas das adolescentes entrevistadas para essa pesquisa já eram mães.

Entre as barreiras culturas e sociais que as mantêm fora do sistema educacional está a de serem encarregadas dos cuidados familiares, das responsabilidades domésticas e das práticas matrimoniais tradicionais, que permitem que as meninas se casem aos 12 anos. O Centro Internacional de Pesquisa sobre a Mulher estima que um terço das meninas do Sul em desenvolvimento se casam antes dos 18 anos e que antes dos 20 estão cuidando de seus filhos.

O Plano Estratégico de Igualdade de Gênero 2009-2014 destaca a necessidade de desenvolver atividades nas escolas do país para sensibilizar o pessoal e criar consciência sobre os problemas de violência sexual.

Philip Afuti, presidente da Associação de Professores de Papua Nova Guiné nas Terras Altas Orientais e da escola primária de Goroka Norte, se dedica ao tema da igualdade de gênero e disse que 80% dos profissionais são mulheres. A escola tem 630 estudantes homens e 535 mulheres. “Queremos que elas tenham as mesmas oportunidades que os homens na educação. Ambos devem colaborar na construção da nação. Papua Nova Guiné só se desenvolverá quando ambos estiverem capacitados”, opinou Afuti.

O governo nacional divulgou este ano uma política de educação subsidiada, que deu resultados na matrícula feminina. As alunas não pagam matrícula desde a pré-escola até a 10ª série secundária, e as das 11ª e 12ª séries só pagam 25% do total. “Aumentamos a quantidade de mulheres. Inclusive, algumas das que haviam abandonado a escola há alguns anos voltaram”, comemorou Afuti. “No entanto, na atual conjuntura, o sistema educacional não tem capacidade de absorver todos nem de fornecer quantidade suficiente de professores para garantir uma educação de qualidade”, observou Kukari.

Além disso, os mecanismos de apoio às meninas que sofrem abuso sexual são inadequados. “Se há forma de reparar esses delitos, não são comunicados aos estudantes nem aos pais. É uma desgraça os professores não poderem fazer nada a respeito antes que os pais apareçam na escola para bater em quem assediou seus filhos”, lamentou Wainetti. As meninas capacitadas, que “ficam adultas saudáveis, produtivas e com poder, são uma força positiva para a mudança política, econômica e social”, segundo o Centro Internacional de Pesquisa sobre a Mulher. Envolverde/IPS