Avaliação levanta dúvidas sobre políticas climáticas brasileiras

BAU projetada e as metas de emissões comparadas com a mitigação potencial e os resultados de esforços compartilhados / Agência Alemã de Meio Ambiente

Incertezas quanto aos números e tendências do setor de uso da terra brasileiro preocupam pesquisadores internacionais que avaliaram a ambição das metas climáticas e as oportunidades de mitigação nos países emergentes.

Devido aos crescentes níveis de emissão de gases do efeito estufa, as economias emergentes, como Brasil e China, desenvolveram desde o início das negociações climáticas internacionais um papel cada vez mais elementar no esforço global para limitar o aumento das temperaturas a 2ºC.

Pensando nisso, a Agência Alemã de Meio Ambiente encomendou um estudo realizado pela empresa Ecofys, pelo Instituto Wuppertal e pela ONG Climate Analytics, que avaliou o quão ambiciosas são as promessas de corte nas emissões dos países emergentes em comparação às emissões ‘business as usual – BAU’.

Os compromissos de China e Índia, por exemplo, parecem estar próximos ou até acima das emissões BAU estimadas, portanto há boas chances de serem cumpridos ou superados. México e Coreia do Sul têm metas um tanto ambiciosas, que exigirão um desvio substancial da trajetória BAU.

O compromisso da África do Sul de corte de 34% das emissões em relação ao BAU é forte, mas o país tem fornecido dados incertos tanto em relação à meta quanto aos níveis de BAU, não permitindo uma avaliação definitiva, ponderam os autores.

Mas o preocupante é a conclusão que o relatório traz sobre o Brasil:

“Problemas similares – ainda mais sérios – vem do Brasil, onde a incerteza associada às emissões do uso da terra, mudança de uso da terra e florestas (LULUCF, na sigla em inglês) são altas demais para nos permitir determinar se o alcance do nível de emissões prometido seria uma melhoria significativa em relação ao nível BAU”.

O relatório chamado ‘Economias Emergentes – potenciais, compromissos e fatias justas de redução dos gases do efeito estufa’ revelou também um grande potencial de corte de emissões na maioria dos países analisados – Brasil, China, Índia, México, Coreia do Sul e África do Sul.

Porém, para que as oportunidades sejam aproveitadas até 2020, ações precisam ser tomadas em breve e a maioria dos emergentes precisará de apoio significativo dos países desenvolvidos, conclui o relatório.

“Apenas com ações ambiciosas em todos os países até 2020, as emissões globais podem ser reduzidas mais custo-efetivamente a um nível que seguraria o aumento da temperatura global abaixo dos 2ºC”, coloca.

Em relação à equidade na repartição das responsabilidades de corte nas emissões, uma questão extremamente – se não a mais – sensível nas negociações internacionais, os autores concordam que seria preciso mais empenho da China e “potencialmente” do Brasil.

Os autores ainda notam a dificuldade de avaliação dos quesitos e comparação entre países, já que as metas geralmente são relativas a linhas de base, sujeitas a mudanças, ou dependem do crescimento do PIB, cujas previsões são altamente incertas.

Brasil

O relatório nota que desde 2009, quando foi estabelecida a Política Nacional de Mudanças Climáticas, houve uma revisão da linha de base sobre a qual a meta de corte nas emissões é determinada. O nível da linha de base foi aumentado, o que deixou a meta menos estrita com o passar dos anos, ao contrário do que ocorreu na Coreia do Sul, onde o nível foi corrigido para baixo.

As altas incertezas relacionadas ao LULUCF levam o país a ter um quadro misto nessas análises. A amplitude das emissões BAU também prejudica a avaliação do impacto de ações de mitigação.

“Apesar de o compromisso de corte de emissões entre 36-39% abaixo dos níveis BAU até 2020 parecer ambicioso à primeira vista, existem incertezas imensas conectadas à situação dos dados”, alertam os autores.

Presumindo que a média dos diferentes cenários BAU é uma aproximação verdadeira (a figura mostra em cinza a amplitude dos cenários de linha de base), as ações potenciais classificadas pelo relatório como ‘sem arrependimento’ (com custos negativos, ou sem custos) e ‘co-benéficas’ (tem custo positivo moderado ou alto com co-benefícios significativos que baixam o custo total para a sociedade) já superariam a meta brasileira.

A literatura revisada para o estudo mostrou pouco potencial de corte de emissões no setor de energia e alto potencial na redução no desmatamento, porém que este último teria um custo moderado.

As maiores oportunidades fora do setor de uso da terra estão nas indústrias e são baseadas em melhorias na eficiência energética e no uso de biocombustiveis “sustentáveis”.

O potencial de mitigação com custo negativo é muito pequeno no país, especialmente voltado para medidas em reflorestamento/aflorestamento, solos agrícolas e eficiência energética nas indústrias, coloca o relatório.

O relatório ainda comenta que dado o perfil das emissões brasileiras, o instrumento político mais importante seria a legislação florestal, porém que em abril de 2012 o Congresso aprovou emendas “altamente controversas”, as quais devem dificultar o alcance dos compromissos nacionais de corte nas emissões e no desmatamento.

A separação dos compromissos referentes ao LULUCF e aos demais setores melhoraria a transparência e aumentaria os incentivos, sugerem os autores.

“Considerando as incertezas relacionadas à estimativa da evolução das emissões até 2020, o compromisso brasileiro parece não ser muito ambicioso. O nível de emissões resultante de algumas projeções alternativas para o BAU seria maior do que os níveis oficialmente prometidos”, explica o relatório.

“Mas mesmo presumindo que a média BAU das diferentes projeções é uma estimativa condizente com a evolução real, a meta resulta apenas na redução de entre 14-16% e poderia ser implementada com custos moderados segundo todos os estudos revisados”, concluem os autores.

* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.