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Especialistas reclamam reconhecimento do Brasil como potência mundial

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Dilma Rousseff recebeu, em março, Barack Obama no Palácio de Planalto.
Washington, Estados Unidos, 15/7/2011 – Os Estados Unidos precisam admitir que o Brasil é uma potência global e tratá-lo como tal, afirma um informe divulgado em Washington pelo influente Council on Foreign Relations. Tal tratamento deve incluir um apoio total do governo de Barack Obama à pretensão brasileira de obter um assento permanente em um Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) ampliado, afirma o documento de 109 páginas intitulado “Global Brazil and U. S. – Brazil Relations” (O Brasil Global e as Relações Estados Unidos-Brasil), apresentado ontem à imprensa.

“Um apoio formal de Washington a Brasília ajudaria a superar a suspeita do governo brasileiro de que o compromisso norte-americano com uma relação madura e entre iguais não passa de retórica”, afirma o documento elaborado por um grupo de 30 especialistas presididos pelo ex-presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn, e pelo ex-secretário de Energia, Samuel Bodman.

Entre outras recomendações, o informe cobra uma “comunicação aberta e regular” entre presidentes e altos funcionários dos dois países, a criação de um escritório de assuntos brasileiros no Departamento de Estado e de um mecanismo de alto nível no Conselho de Segurança para coordenar as muitas agências deste país que tratam com o Brasil, e a eliminação das tarifas sobre a importação do etanol brasileiro, um elemento de permanente irritação nas relações bilaterais.

“O Brasil superou seu status de país maior e mais rico em recursos da América Latina, para situar-se entre as potências fundamentais do mundo”, afirma o texto. “As autoridades norte-americanas devem reconhecê-lo como ator global, tratar sua emergência como uma oportunidade para os Estados Unidos e trabalhar com ele para desenvolver políticas complementares”, acrescenta.

Esse reconhecimento exige que Washington aceite a ideia da independência de Brasília em matéria de política externa, inclusive em assuntos como a questão internacional referente ao programa nuclear do Irã, que o Brasil tentou solucionar no ano passado junto com a Turquia, causando aborrecimento ao governo de Obama.

“Como os Estados Unidos nunca superaram a ideia de que o Brasil deveria alinhar-se com suas políticas, não lidou com as diferenças sobre este problema, como o fez com muitas outras que Washington mantém com outras nações do bloco Brics” (Brasil, Rússia, Índia, China), afirmou David Rothkopf, ex-membro do Conselho Nacional de Segurança e um dos redatores do informe. Rússia e China já têm assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU, e Obama apoiou no ano passado a candidatura indiana.

“Este tipo de duplo discurso é a fonte do ceticismo de Brasília quanto à sinceridade com que os Estados Unidos saúdam seu avanço”, escreveu Rothkopf em seu blog. A publicação do documento constitui “o mais recente tremor de uma mudança tectônica na forma como Washington observa o papel das potências emergentes”, acrescentou. Há mais de uma década, especialistas e instituições, como a Brookings Institution e a Inter-American Dialogue, cobram do governo norte-americano mais atenção ao Brasil e às suas políticas.

Um mês depois da posse do ex-presidente George W. Bush, outro grupo de trabalho do Couincil on Foreign Relations, no qual predominavam investidores, empresários, lobistas e ex-diplomatas, publicou uma carta aberta exortando Bush a estabelecer “uma estratégia de alto nível e um diálogo estratégico e cooperativo com o governo brasileiro”. “O Brasil é muito importante em tudo o que está acontecendo na América do Sul para manter uma política de benigno abandono”, advertia a carta, ignorada pela administração Bush que logo se viu mais preocupada com o que acontecia no Oriente Médio e na Ásia meridional.

Entretanto, o que era certo sobre o Brasil na América do Sul há uma década aplica-se cada vez mais ao mundo. O Brasil desempenha um papel-chave em um leque de assuntos que vão desde a mudança climática e a energia até segurança alimentar, luta contra a pobreza, a paz e a segurança internacionais, afirma o documento. É que o Brasil “é e continuará sendo uma força integral na evolução de um mundo multipolar”, segundo o informe. “É o quinto maior território, tem a quinta maior população e a oitava economia” e caminha para ser a quinta em poucos anos, acrescenta.

O governo Obama parece estar assumindo as rédeas com maior seriedade, apesar das diferenças que manifestaram diante do golpe de Estado de 2009 em Honduras, nas negociações secretas entre Estados Unidos e Colômbia para ocupar várias bases militares nesse país, e a política para o Oriente Médio. Esses elementos levaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a expressar sua crescente decepção com Obama pouco antes de entregar o cargo a Dilma Rousseff.

A investidura de Dilma representou uma oportunidade para relançar a relação, e, em sua visita de março ao Brasil, Obama levou nada menos que sete ministros e outros altos funcionários. “A viagem de Obama foi animadora, bem como sua afirmação de que a ascensão do Brasil constituía um elemento de interesse para os Estados Unidos”, disse a embaixadora em Brasília, Donna Hrinak, que falou ontem à imprensa junto com a diretora do grupo que redigiu o informe, Julia Sweig.

Contudo, para desgosto de sua anfitriã, Obama se absteve de assinar formalmente a candidatura do Brasil ao Conselho de Segurança, como fez no caso da Índia quando viajou no ano passado a Nova Délhi. “Os brasileiros querem um assento no Conselho de Segurança e a eliminação das taxas sobre seu etanol”, disse o presidente do Inter-American Dialogue, Michael Shifter.

A velocidade com que Washington deveria dar o primeiro passo dividiu o grupo que redigiu o documento. Nove deles desejam que “comece o trabalho diplomático” para assinar a candidatura do Brasil a membro permanente do Conselho de Segurança. Porém, a maioria pediu um apoio imediato, seguido de consultas com outros países da região e de um “intenso diálogo” com Brasília sobre “assuntos de governança regional, multilateral e global”. Esta opção, segundo o grupo minoritário, corre o risco de gerar “reações adversas de aliados importantes dos Estados Unidos na América Latina, que veriam a escolha do Brasil como um bloqueio às suas próprias ambições multilaterais”.

Outro grupo, de cinco redatores (Hrinak, Sweig e Rothkopf, entre eles), acredita que a recomendação de um apoio imediato seguido de consultas tampouco irá tão longe quanto deveria. “É uma mensagem equivocada ao Brasil e ao mundo. Se os Estados Unidos apoiam, como disse Obama, estruturas de liderança das instituições internacionais que refletem melhor as realidades do mundo, deve apoiar sem mais demora a candidatura do Brasil”, acrescentaram. Envolverde/IPS