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O novo capítulo do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), elaborado pelo Grupo de Trabalho III (WGIII): Mitigação e Mudanças Climáticas, destaca uma mensagem importante: Ainda é possível limitar o aumento médio da temperatura global a 2°C, desde que o mundo reduza rapidamente as emissões e mude o mix de energia atual.

Para chegar a essa conclusão o grupo teve que analisar mais de mil caminhos potenciais de redução de emissões e fazer diversas modelagens utilizando as mais recentes pesquisas e tecnologia. Em suma, o relatório novamente traz apontamentos para mudança na trajetória das emissões atuais, para limitar o aquecimento superior a 2°C, e evitar cada vez mais eventos extremos perigosos, como incêndios florestais, aumento do nível do mar, ondas de calor e outros impactos climáticos.

Quais foram as principais mensagens desse relatório? Qual seria o esforço de redução de emissões necessárias para conter o aquecimento descontrolado? Seis pontos principais tratam disso.

1. Sem uma ação explícita, a temperatura poderá ser maior do que 4°C de aquecimento.

Mesmo que todos os países cumpram seus compromissos de redução de emissões atuais, estamos longe de um caminho que limita o aumento da temperatura média global a 2°C acima dos níveis pré-industriais. Na verdade, na ausência de esforços para além dos já existentes, o aquecimento da superfície média global seria entre 3,7ºC e 4,8°C acima dos níveis pré-industriais.

2. Limitar o aquecimento a 2°C ainda é possível.

Já ultrapassamos mais do que 50% do nosso “orçamento de carbono” ou carbon budget – a quantidade de emissões de carbono que podemos emitir -, mas ainda há chance de limitação do aquecimento em 2°C. No entanto, o Relatório do WGIII conclui que, ao adotar medidas agressivas que reduzam rapidamente as emissões, é tanto técnica e fisicamente viável ficar dentro do nosso orçamento de carbono.

3. Ficar dentro do “orçamento” de carbono (carbon Budget) requer uma ação imediata.

O relatório ressalta que esta é a década crítica da ação climática. As emissões até 2030 vão determinar o quão realista será para o mundo mudar para um caminho de baixas emissões.

Ações tardias exigirão investimentos sem precedentes para reduzir mais tarde as emissões. Por exemplo, se as emissões alcançarem um nível de 55 gigatoneladas de CO2e em 2030, precisaremos reduzir as emissões globais em um nível de 6% entre 2030 e 2050, em média, para limitar o aquecimento a 2°C. A título de referência, em 2010, estávamos em 49 gigatoneladas de emissões de CO2e.

Torna-se extremamente complicado e caro ficar dentro dos 2ºC na medida em que precisaremos adotar tecnologias potencialmente arriscadas – como bioenergia combinada com captura e armazenamento de carbono (BECCS).

4 . Nós precisamos eliminar as emissões inteiramente no longo prazo.

Os modelos climáticos mostram que, para limitar o aumento da temperatura a 2ºC, as emissões globais terão de cair em até 39% em relação aos níveis de 2010 até 2030, e até 72% em relação aos níveis de emissões de 2010 até 2050.

Talvez o ponto mais crítico seja que o relatório conclui que, para a maioria dos cenários que dão a chance provável de limitar o aquecimento a 2ºC, é que as emissões de GEE devam ser zeradas em 2100, o que exige a eliminação das emissões de gases de efeito estufa. Obviamente, esse cenário é irreal nas condições de hoje.

5 . Todas as regiões do mundo precisarão tomar ações.

Além de reduzir as emissões nas escalas locais, nacionais e regionais, a cooperação internacional será essencial. Não há uma fórmula de como o mundo pode atingir as reduções de emissões necessárias. Mas está claro que requer um esforço internacional.
A cooperação internacional pode determinar direitos e responsabilidades para a ação climática nacional, como os países têm diferentes capacidades para reduzir as emissões e se adaptar aos impactos climáticos.

6. Mudar para um caminho de baixas emissões requer uma transformação em grande escala.

Limitar o aquecimento exigirá mudanças em larga escala para sistemas de energia e, potencialmente, o uso do solo. Para alcançar essas mudanças, aproveitando as opções tecnológicas e comportamentais existentes, seria necessário:

  • Descarbonizar a maioria da geração de eletricidade até 2050.
  • Eliminar progressivamente a produção de carvão sem a captura e armazenamento de carbono tecnologia (CCS).
  • Aumentar a nossa fonte de energia de baixo carbono (como solar, eólica, hidrelétrica, CCS) por cinco vezes ao longo dos próximos quatro décadas.
  • Mudar os padrões de consumo, como a redução do desperdício de alimentos e mudança de dietas.
  • Alterar para tecnologias industriais mais eficientes. Isso poderia reduzir a intensidade energética do setor industrial em 25% considerando que o setor é atualmente responsável por uma parte considerável das emissões globais de GEE.

 

* Luiz Serrano é gerente de projetos em sustentabilidade na KeyAssociados e especialista em mudanças climáticas, finanças ambientais e economia de baixo carbono.