Resíduos industriais podem ser úteis para fabricar cerâmica

Pesquisa realizada na Escola Politécnica (Poli) da USP analisou a possibilidade de incorporar lodo de esgoto e lama vermelha, dois resíduos industriais, como matéria prima na fabricação de cerâmicas, conferindo um valor agregado a esses rejeitos. O trabalho foi realizado durante a dissertação de mestrado do engenheiro Cristian Camilo Hernández Díaz, sob a orientação do professor Antonio Carlos Vieira Coelho.

Imagem mostra o lodo de esgoto calcinado a diferentes temperaturas
Imagem mostra o lodo de esgoto calcinado a diferentes temperaturas

Segundo o engenheiro, as massas cerâmicas são usadas na fabricação de cerâmicas estruturais, ou seja, blocos maciços, tijolos e telhas. “Eles geralmente são fabricados com argilas comuns, com jazidas próximas à fabrica de produção. Decidimos utilizar lodo de esgoto e lama vermelha porque a produção desses resíduos está aumentando consideravelmente”, conta. A pesquisa Estudo da possibilidade de uso de lodo de esgoto e lama vermelha como matérias-primas cerâmicas foi apresentada na Poli no último dia 03 de maio.

O lodo é gerado no processo de tratamento de esgoto e a lama vermelha é o resíduo de um processo denominado Bayer para produzir alumina (óxido de alumínio, que é um dos componentes da bauxita, o principal minério de alumínio). “O lodo veio da planta de tratamento de esgotos da cidade de Franca, no interior de São Paulo. Já a lama vermelha é originária de uma planta industrial localizada no Pará”, informa.

Lodo de esgoto foi obtido na Estação de Tratamento de Esgotos de Franca (SP)
Lodo de esgoto foi obtido na Estação de Tratamento de Esgotos de Franca (SP)

Hernández Díaz explica que o lodo de esgoto geralmente é depositado num aterro sanitário, diminuindo a vida útil deste. A lama vermelha é levada para lagoas especiais, mas a alta alcalinidade desse resíduo gera um problema ambiental. “Em ambos os casos, os resíduos têm a possibilidade de serem usados em outras aplicações devido a seus componentes químicos, diminuindo assim a quantidade de resíduos depositados na natureza”, explica.

A pesquisa mostrou que esses resíduos poderiam ser usados como matérias-primas alternativas para outros produtos. “Assim seriam diminuídas as quantidades de resíduos a necessitarem de uma disposição final. Além disso, há um menor consumo dos recursos naturais. E quanto às propriedades tecnológicas, os produtos cumprem todos os parâmetros”, diz.

Experimentos

O engenheiro realizou a caracterização das matérias-primas quanto sua composição química, fases mineralógicas presentes e comportamento térmico. O pesquisador também avaliou as propriedades tecnológicas de corpos de prova prensados, fabricados com os resíduos e com misturas dos resíduos e argila em diferentes proporções. Essas propriedades tecnológicas são: resistência à flexão, densidade, absorção de água, porosidade e retração na secagem e na queima. Hernández Díaz ainda comparou os resíduos e suas misturas com os produtos sem adição de resíduos, quanto a vários aspectos físicos como: cor, textura e odor. Também definiu, segundo os resultados obtidos, as possibilidades de aplicações mais adequadas para os resíduos e para as misturas estudadas.

Método de disposição a úmido da lama vermelha
Método de disposição a úmido da lama vermelha

Os resíduos foram caracterizados e, baseados em estudos que já haviam sido realizados, foram escolhidas algumas proporções resíduo-argila. Depois foram determinadas as propriedades tecnológicas das misturas após queima.

Os resultados mostraram que algumas das misturas cumprem os parâmetros exigidos para os tipos de produtos estudados. A mistura que apresentou melhor relação entre a quantidade de resíduos e propriedades físicas e mecânicas foi uma mistura de 45% argila, 45% lama vermelha e 10% lodo de esgoto. Ou seja, a incorporação de resíduo é maior ao 50%.

Sobre a aplicação prática da técnica, o engenheiro afirma que seria possível. “De fato há vários artigos de testes a nível industrial e algumas casas já têm sido construídas com esse tipo de produto. Para que fosse uma produção em maior escala seriam necessárias iniciativas por parte das empresas e governos para favorecer este tipo de produção amigável com a natureza”, finaliza.

* Imagens cedidas pelo pesquisador Cristian Camilo Hernández Díaz

** Publicado originalmente no site Agência USP.