Brasil terá ações e políticas relacionadas aos direitos humanos avaliadas na ONU

A Justiça Global, junto com organizações parceiras, enviou onze informes para contribuir com o processo de revisão periódica. Os documentos chamam a atenção para violações de direitos humanos relacionadas a megaeventos esportivos, segurança pública, megaprojetos, sistema prisional, comunidades indígenas, tradicionais e quilombolas e proteção dos defensores de direitos humanos.

Amanhã, sexta-feira 25 de maio, o Brasil passará pelo segundo ciclo de avaliações sobre a situação dos direitos humanos no país, realizado no âmbito da Revisão Periódica Universal (RPU ou UPR, em inglês) do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Estarão reunidas em Genebra missões diplomáticas e organizações da sociedade civil de todo o mundo, além do alto comissariado das Nações Unidas, para apresentar relatórios e avaliar o atual estágio de cumprimento das obrigações internacionais assumidas pelos 193 países que compõem a entidade. A primeira participação do Brasil foi há quatro anos, quando o país recebeu quinze recomendações.

Megaeventos, megaprojetos e comunidades tradicionais

O impacto das intervenções para a Copa do Mundo 2014 e os Jogos Olímpicos 2016 será um dos temas abordados na RPU. As remoções arbitrárias e o desrespeito aos direitos dos trabalhadores nas 12 cidades-sede dos eventos foram denunciados pelo informe. Além disso, o texto chama a atenção para os riscos da legislação de exceção produzida nesse contexto e o modelo de financiamento adotado, indicando o BNDES e o Fundo de Assistência ao Trabalhador (FAT) como seus protagonistas.

As frentes de obras de megaprojetos também têm colocado em situação de risco as populações tradicionais, povos indígenas e os ecossistemas amazônicos. Foram enviados informes sobre a mineradora Vale, os impactos da construção de hidrelétricas na Amazônia e a situação das comunidades quilombolas. “Este modelo de crescimento baseado em megaprojetos, executados pelas mesmas grandes corporações, tem acarretado graves violações de direitos humanos e sérios impactos ambientais. O Brasil será certamente questionado por isso”, disse Andressa Caldas, Diretora Executiva da Justiça Global.

As operações da Vale têm afetado principalmente a saúde da população local e o meio ambiente. Em Piquiá de Baixo, perto da usina Gusa Nordeste, moradores têm sofrido com problema de saúde. No caso das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, estudos indicam que até 70% das espécies de peixe existentes no local podem desaparecer um ano após o término das construções. Já a hidrelétrica de Belo Monte deslocará pelo menos 20 mil pessoas, incluindo duas comunidades indígenas: Juruna e Arara de Paquiçamba.

Segurança pública e defensores de direitos humanos

A questão da segurança pública também teve destaque nas revisões enviadas pela Justiça Global. O modelo de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), principal ação recente do governo do Estado do Rio de Janeiro na área, teve sua eficácia questionada. Foram feitas denúncias sobre a invasão de casas sem mandado, conflitos devido à imposição de regras arbitrárias aos moradores e a função da polícia como intermediária do acesso a serviços públicos. “Buscamos mostrar que as UPPs representam uma nova forma de controle e criminalização da pobreza, com a militarização do cotidiano das favelas e a expulsão econômica de seus moradores”, disse Sandra Carvalho, Diretora Adjunta da Justiça Global.

A intensificação das ações executadas pelas milícias nas comunidades do Rio de Janeiro foi outro assunto abordado. Segundo o informe, as milícias não têm sido o alvo de ações efetivas do governo do Estado, visto que apenas uma UPP foi instalada em área dominada por milicianos. Os locais escolhidos para instalação das UPPs também exprime a estratégia de garantir a segurança para alguns territórios específicos da cidade, próximos aos equipamentos esportivos dos grandes eventos e de áreas turísticas, sem uma visão de segurança ampla para a cidade.

Além disso, a situação dos defensores dos direitos humanos no Brasil voltou a ser denunciada. A questão já havia aparecido durante a primeira RPU, o que fez com que a Missão Permanente da Bélgica recomendasse a “intensificação dos esforços para segurança dos defensores dos direitos humanos” no país. O informe enviado citou ainda os esquadrões da morte de Pernambuco e Paraíba e o caso do assassinato de Manoel Mattos, em 2009, que vinha sendo ameaça por quase uma década por sua defesa aos trabalhadores rurais da região. O caso evidenciou a incapacidade do Estado Brasileiro no cumprimento de resoluções de organismos internacionais.

O que é a Revisão Periódica Universal

A RPU é um mecanismo do Conselho de Direitos Humanos da ONU para monitorar regularmente o cumprimento, por parte de cada um dos 193 Estados-Membros da ONU, das suas obrigações e compromissos sobre os direitos humanos. Trata-se de um processo de revisão entre Estados, a que todos os Estados-Membros das Nações Unidas são submetidos a cada quatro anos e meio, com o objetivo de melhorar a situação dos direitos humanos nos países. Uma parte importante desta revisão é o encontro de três horas e meia no Grupo de Trabalho sobre a RPU entre o Estado, observadores e os Estados-Membros participantes. Durante este debate, os Estados-Membros podem fazer perguntas e recomendações ao Estado em revisão. O resultado da revisão será um relatório que contém um resumo do processo de revisão, as conclusões e/ou recomendações, além dos compromissos voluntários assumidos pelo Estado em questão.