Um desenho para a São Paulo do século XXI

images (5)1Como queremos que seja a São Paulo dos próximos 16 anos? Essa é a pergunta que o Plano Diretor deve responder nas próximas semanas, quando passa por audiências públicas antes da votação definitiva no plenário da Câmara Municipal. Em tempos de escassez de água, persistente desigualdade social e eventos climáticos extremos, essa questão depende fatalmente da nossa capacidade de diminuir os efeitos e se adaptar às mudanças do clima. É preciso inverter o saldo: de “buraco negro” sugador veloz dos recursos naturais para uma cidade produtora de serviços ambientais. A transição exige um desenho de resiliência.

Foram mais de 724 contribuições da sociedade civil, colhidas em cerca de 50 audiências públicas, e ainda 443 documentos recebidos pela relatoria na Câmara Municipal. Nosso mandato enviou recomendações desde o início da tramitação e testemunhou os avanços na direção de uma cidade mais sustentável e inclusiva.

Os eixos de mobilidade levam ao coração de um Plano Diretor Estratégico (PDE) que prevê uma cidade compacta – com o adensamento populacional – e multicêntrica – com estímulos para aproximação entre os locais de emprego e moradia. Ao evitar os deslocamentos e estimular a multimodalidade, o projeto combate a principal fonte de emissão de gases-estufa na cidade: o transporte individual motorizado. Outra fonte de emissões importante, o lixo, também deve ser compulsoriamente reduzida com o acolhimento do Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos.

Ao aumentar o número de parques e garantir sua preservação como Zonas Especiais de Proteção Ambiental, o PDE também prepara uma cidade mais capaz de capturar carbono, combater as ilhas de calor e a poluição do ar, além de tornar o solo mais permeável e, assim, aumentar nossa capacidade hídrica. Antes de voltar ao plenário, entretanto, o Plano precisa reincorporar o único parque que havia saído do projeto: o Parque Manancial do Paiol, na região de Parelheiros.

A zona sul da cidade, aliás, precisa ser incentivada a conservar sua vegetação e, para isso, o PDE prevê o mecanismo de Pagamento por Serviços Ambientais. Afinal, quem conserva áreas naturais colabora para qualidade do ar e da água na cidade. Outra chance de essa região contribuir para a redução de emissões está no estímulo à produção local de alimentos, através do Plano de Desenvolvimento para a Zona Rural previsto no PDE.

Economia local significa mais do que diminuir os deslocamentos e a dependência de recursos externos à região. Resiliente, ela também preza por abundância em vez de escassez. Com isso, implica no incentivo à cultura e aos bens intangíveis. O PDE também responde a essa necessidade ao fortalecer as Zonas Especiais de Preservação Cultural e ao criar territórios culturais na cidade, instituindo o primeiro na região central.

Entre tantas conquistas, o PDE ainda merece ajustes. Entre eles, destaca-se a necessidade de aumentar a quantidade de Zonas Especiais de Interesse Social nos eixos de adensamento e pensar seu concílio com as áreas de proteção ambiental, através de critérios de construção sustentável. Afinal, não podemos esperar uma cidade compacta e inclusiva sem uma participação distribuída das diferentes classes sociais.

Também é necessário estabelecer prazos e competências para a elaboração dos planos decorrentes do PDE, que, a partir das suas diretrizes, vão legislar sobre abordagens específicas. Será quando deveremos discutir um Código de Edificações com critérios ambientais, um Programa de Recuperação de Fundos de Vale e, obrigatoriamente, um Plano de Mata Atlântica que balize a revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo.

Agora, a sociedade precisa fazer vigília por um Plano Diretor que conserve o interesse público ouvido no processo. E tanto as forças políticas que governam a cidade hoje quanto as que pretendem governá-la daqui 16 anos devem se propor a um pacto suprapartidário em prol do melhor Plano Diretor possível. Não podemos permitir que interesses menores de setores do mercado façam mudanças obscuras no apagar das luzes do plenário.

Com o reconhecimento de que o espaço urbanizado é gerador de passivos e tem que gerar ativos ambientais, o Plano Diretor é uma oportunidade para São Paulo reduzir sua pegada ecológica e alavancar sua concepção de espaço urbano sintonizado no século XXI.

* Ricardo Young, 56, empresário, é vereador de São Paulo pelo PPS. Foi presidente do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.