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Os sons do silêncio oficial

Madri, Espanha, 4/4/2012 – Os trabalhadores da Espanha continuam a não serem ouvidos em sua demanda por diálogo com o governo para discutir a reforma trabalhista e a política de fortes restrições ao gasto, dois assuntos cruciais diante da grave crise econômica que afeta o país e o resto da União Europeia (UE).  O secretário-geral da União Geral de Trabalhadores, Cándido Méndez, disse à IPS que o objetivo das organizações sindicais não é confrontar, mas negociar e buscar soluções. A greve, como a grande manifestação de 29 de março, é considerada “um meio, não um fim”, destacou.

Por isso “enviamos duas cartas ao primeiro-ministro, Mariano Rajoy, porque o mais importante é uma negociação e que possamos corrigir profundamente a reforma”, acrescentou o líder da UGT, próxima ao opositor Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE). “É curioso que enquanto a senhora Merkel (Angela Merkel, chefe do governo alemão) se reúne com os sindicatos, neste país as organizações de trabalhadoras não foram convocadas uma única vez para falar com Rajoy desde sua posse”, em 21 de dezembro do ano passado, acrescentou.

O desemprego na Espanha, no final de 2011, chegava a 22,8% da população economicamente ativa. O mais alto da UE e suas principais vítimas são os jovens. além disso, o governo aprovou há alguns dias o novo orçamento nacional, no qual se contempla, entre outros ajustes, uma redução de quase 17%, em média, no gasto dos ministérios e aumento do imposto de renda das pessoas físicas e das tarifas dos serviços públicos, como energia elétrica e gás, além do congelamento dos salários dos funcionários públicos.

Com o argumento de movimentar o campo trabalhista, o governo decretou uma reforma da lei trabalhista que limita a dois anos a vigência dos contratos de trabalho e, em caso de demissão, substitui a indenização de 45 dias por ano trabalhado por uma de 33 dias. O decreto, validado no dia 8 de março pelo Parlamento em primeira instância, será debatido nos próximos meses, podendo ser alvo de emendas. Também modificou a demissão objetiva, de forma que as empresas que registrarem perdas, ou três trimestres consecutivos de queda na renda poderão rescindir contratos com apenas uma compensação de 20 dias por ano trabalhado.

A secretária-geral da Confederação Europeia de Sindicatos, a francesa Bernadette Ségol, essa reforma trabalhista “não é boa para a paz social nem trará emprego”. Por outro lado, o presidente da Confederação de Empresas Europeias (Business Europe), Philippe de Buck, entende que Rajoy “tomou todas as medidas necessárias para melhorar a situação, tanto recapitalizando os bancos, como consolidando a política fiscal. Por isto, agora o governo precisa de tempo para aplicar estas reformas e ver seus resultados.

No entanto, Rajoy, do Partido Popular, não só deixa de abrir diálogo com os sindicatos como acusa seu antecessor, o socialista José Luis Rodríguez Zapatero, de nada ter feito para evitar a crise. “Gastar mais do que entra não é bom e no fim acaba gerando problemas”, como foi o gasto de 2011 do governo socialista, que chegou a “25 bilhões de euros (US$ 33 bilhões) além mais do que havíamos nos comprometido com nossos sócios da UE”, afirmou Rajoy ao fim de uma reunião de seu partido, no dia 2, em Madri.

Méndez destacou que a reforma pretendida pelo governo “não resolverá o problema do desemprego no curto e nem no médio prazos e, pelo contrário, o agravará, tanto que o próprio governo já reconheceu que este ano se perderá mais 600 mil empregos”. E acrescentou que “a geração de postos de trabalho não se dá por uma troca na legislação trabalhista, mas pelo impulso da atividade econômica”.

Para o líder sindical, o primeiro-ministro só tem a opção de mudar. “Deveria fazer agora e com participação do parlamento e, se assim não for, terá que fazer de maneira vergonhosa, porque se encontrará com uma resposta social e números de desemprego que o desacreditarão a tal ponto que as mobilizações serão o menos importante”, alertou Méndez.

Enquanto isso, o governo segue seu rumo. Em seu discurso perante a direção de seu partido, Rajoy cobrou que os governantes das comunidades autônomas e das municipalidades sejam parte ativa nos esforços de redução do déficit público. Nessa linha, afirmou que “agora não é o momento de fazer autopistas, nem aeroportos, nem outras coisas” no setor da construção, tradicionalmente um dos que mais absorve mão de obra.

A linha de ação do governo do PP motivou a resposta da secretária-geral do PSOE, Elena Valenciano, que afirmou que agora na Espanha “a vida é mais cara, o emprego mais precário, a demissão mais barata e os impostos mais altos”. Para Valenciano, os primeiros cem dias de governo de Rajoy foram “muito frutíferos” para “reduzir direitos, para os fraudadores, para o setor mais integrista da Conferência Episcopal Católica e para o setor mais ultraliberal da Confederação da Espanha de Organizações Empresariais, mas não para o conjunto dos cidadãos”. Envolverde/IPS