O Brasil, que em menos de três décadas reduziu o tabagismo de 40% para 15% de sua população, inaugura um centro de pesquisa que terá projeção mundial.
Rio de Janeiro, Brasil, 1º de abril de 2013 (Terramérica).- O Brasil deu mais um passo em matéria de prevenção do hábito de fumar com a criação do Centro de Estudos Sobre Tabaco e Saúde (Cetab). Na realidade, se pretende ir mais além. O Cetab – criado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, estatal), como parte da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca – estará dedicado a pesquisar os outros três fatores de risco das doenças crônicas não transmissíveis, além do tabagismo: álcool, sedentarismo e maus hábitos alimentares.
Em 2011, o Brasil aprovou o Plano de Ações Estratégicas para Enfrentar Enfermidades Não Transmissíveis, como câncer, diabete e doenças cardiovasculares e respiratórias. “Vamos focar nelas e fazer pesquisas sobre os fatores de risco. O cigarro aparece como um grande vilão. Seu consumo não acarreta nenhum benefício, não existe um consumo razoável de cigarros que seja inócuo, só causa males”, disse ao Terramérica a coordenadora do recém-criado Cetab, Vera da Costa e Silva.
O Ministério da Saúde destinará US$ 6,2 milhões ao plano apresentado em 2011, que prevê ações até 2022. Entre outros fins, se propõe a reduzir em 2% ao ano a mortalidade prematura de pessoas de até 70 anos por estas causas, para chegar a 2022 com 196 mortes para cada cem mil habitantes. Em 2011, essa relação era de 225 para cada cem mil.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o tabagismo a principal causa de morte evitável em todo o mundo, e estima que um terço da população mundial maior de 15 anos fuma (um em cada três adultos). A presença de mais de 4.700 substâncias nocivas na fumaça dos derivados do tabaco faz com que este vício cause cerca de 50 enfermidades.
No Brasil, o câncer de pulmão é o tipo de tumor mais letal e também uma das principais causas de morte. Na medida em que se conseguir diminuir a exposição a esses fatores será possível também reduzir estas doenças, destacou a coordenadora do Cetab. O novo centro de estudos busca trabalhar na capacitação, pesquisa e cooperação técnica, dentro e fora do Brasil.
“Queremos trabalhar com informação, educação, regulamentação e políticas públicas para a prevenção. Vamos proporcionar aos profissionais da saúde da rede pública capacitação e tratamento dos fatores de risco. Os cursos poderão ser feitos à distância”, explicou Vera. No campo da cooperação internacional o olhar está voltado a atender os países da América Latina e os africanos de língua portuguesa, o que implicará levar profissionais brasileiros aos escritórios que a Fiocruz mantém no exterior, por exemplo, em Moçambique, e, por outro lado, atrair especialistas desses lugares para o Brasil.
O Cetab pretende também apoiar a OMS e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPS). “Já tivemos bons retornos com eles como sócios internacionais, e vislumbramos possibilidades”, apontou a coordenadora. O Cetab começa com uma equipe de nove pesquisadores de áreas como economia, engenharia, farmacêutica, medicina e biologia. O tabagismo é uma epidemia e o maior fator de risco conhecido, afirmou o presidente da Academia Nacional de Medicina, Marcos Moraes.
No final da década de 1980, quase 40% da população brasileira era de fumantes. Em 25 anos, essa proporção caiu para cerca de 15%. O Brasil tem atualmente mais de 192 milhões de habitantes. “Graças às medidas de controle, conseguimos chegar a esses resultados. A indústria do tabaco sempre está muito ativa, apesar de ter consciência de que vende uma doença, e nós buscamos que o país controle sua saúde e não permita a venda de produtos prejudiciais”, disse Marcos ao Terramérica.
Marcos apontou que se nota uma queda acentuada de fumantes entre a juventude de classe média, mas há “um avanço lento, porém contínuo” de jovens fumantes procedentes de classes mais pobres. “Um dos pontos mais importantes no controle do tabagismo é aumentar o preço do cigarro. O Brasil conseguiu, no ano passado, gravá-lo de modo substancial, e, no entanto, é um dos mais baratos do mundo. Onde há pobreza há tabagismo”, enfatizou Marcos.
E acrescentou que, segundo a OMS, para cada dólar arrecadado por estes impostos, são gastos US$ 4,5 em cuidados sanitários de doenças relacionadas com o tabaco. O Brasil destina US$ 10 bilhões de seus gastos em saúde pública para tratar problemas causados pelo cigarro, enquanto arrecada US$ 3 bilhões em impostos da indústria do setor, ressaltou Moraes. Os dados sobre a evolução da quantidade de fumantes no Brasil servem para medir a eficácia da política de prevenção, mas “essa política sempre está ameaçada”, alertou.
Apesar de ser reconhecido como um exemplo no mundo, o Brasil não pode “soltar foguetes, pois é uma luta eterna”, advertiu Marcos. A criação de um centro de estudos será uma ferramenta a mais para contribuir com a rede de instituições que já atua nesta área. Frequentemente, o Brasil é solicitado a fornecer cooperação internacional e trocar experiências sobre o cumprimento do Convênio Marco da OMS para Controle do Tabaco, que orienta os países a adotarem determinadas medidas para controlar o hábito de fumar. Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da IPS.
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O tabagismo segundo a Organização Mundial da Saúde, em espanhol, inglês e francês
Convênio Marco da OMS para o Controle do Tabaco, em espanhol, inglês e francês
Organização Pan-Americana da Saúde, em inglês e espanhol
Programa Nacional de Controle do Tabagismo
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação apoiado pelo Banco Mundial Latin America and Caribbean, realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.