Ambiente

Agenda pós-2015 deve priorizar água e saneamento, pedem ONGs

Soldados distribuem água em Daca, em Bangladesh. Foto: Kibae Park/ONU
Soldados distribuem água em Daca, em Bangladesh. Foto: Kibae Park/ONU

Por Thalif Deen, da IPS – 

Nações Unidas, 20/5/2015 – Praticamente todas as grandes conferências internacionais concluem com um “programa de ação”, conhecido no jargão da Organização das Nações Unidas (ONU) como “documento final”, precedido por uma declaração política na qual 193 Estados membros se comprometem religiosamente a cumprir seus compromissos.

Porém, mais de 620 organizações não governamentais, em uma aliança sobretudo de ativistas internacionais da água, se queixam de que a declaração política proposta para a Agenda de Desenvolvimento Posterior a 2015 da ONU pretende marginalizar a questão da água e do saneamento para um lugar secundário.

A aprovação da agenda de desenvolvimento, e a dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), está prevista para uma reunião de cúpula de líderes mundiais que acontecerá na sede das Nações Unidas em Nova Iorque entre 25 e 27 de setembro.

Meera Karunananthan, ativista da organização Projeto Planeta Azul, disse à IPS que, como mais de 600 ONGs de todo o mundo reclamam que os Estados membros modifiquem a declaração política proposta, é evidente que a água continua sendo um problema-chave para milhões de pessoas.

“Qualquer agenda de desenvolvimento está condicionada à disponibilidade de recursos de água doce, e na medida em que o mundo luta contra a crise cada vez mais grave de escassez de água doce a competição pelo acesso à ela já está causando conflitos em todo o planeta”, lembrou Karunananthan.

A aliança inclui as organizações WaterAid, Food and Water Watch, Council of Canadians, Global Water Institute, Earth Law Alliance, Indigenous Rights Centre, Right 2 Water, Curch World Service, Mining Working Group, End Water Poverty e Projeto Planeta Azul.

Lucy Prioli, da WaterAid, disse à IPS que há mais de 2,5 milhões de pessoas que vivem sem saneamento básico e outras centenas de milhões que não têm acesso à água, por isso é fundamental que ambos estejam “à frente e no centro da declaração pós-2015”, como direitos humanos. “A comunidade internacional nunca conseguirá sua ambição de acabar com a fome mundial se também não for abordada a desnutrição, que é causada pela água contaminada e por falta de saneamento”, acrescentou.

A Assembleia Geral da ONU, com 193 Estados membros, reconheceu em 2010 que a água e o saneamento são direitos humanos básicos. Entretanto, 40% da população mundial não têm acesso a saneamento adequado e 25% carecem de água potável.

Em um informe conjunto de 2012 os órgãos de inteligência dos Estados Unidos prognosticaram um futuro sombrio com conflitos étnicos, tensões regionais, instabilidade política e até assassinatos em massa. “Nos próximos 10 anos, muitos países importantes para os Estados Unidos quase seguramente sofrerão problemas de água, por escassez, má qualidade ou inundações, que contribuirão para o risco de instabilidade e fracasso do Estado e para o aumento das tensões regionais”, alertou o documento, conhecido como National Intelligence Estimate.

A agenda econômica pós-2015 proposta pela ONU, que inclui os ODS, não deve fechar os olhos para estes conflitos previstos, afirmou Karunananthan. Pelo contrário, deve ser proativa e salvaguardar a água para o ambiente e as necessidades essenciais da população, reconhecendo expressamente o direito humano à água e ao saneamento, acrescentou.

“Se queremos evitar os erros do passado que levaram ao estrepitoso fracasso no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) com relação ao saneamento, é importante que os ODS estejam firmemente arraigados em um contexto baseado nos direitos humanos”, ressaltou Karunananthan.

Os oito ODM, estabelecidos em 2000, vencem no final deste ano, quando serão substituídos pelos ODS. O primeiro ODM, o da erradicação da pobreza extrema e da fome, estabeleceu como meta concreta reduzir até o final de 2015 pela metade a população mundial sem acesso à água potável e ao saneamento básico, com relação aos níveis de1990.

A aliança quer assegurar que as necessidades da humanidade e o ambiente tenham prioridade na estratégia de gestão dos recursos hídricos promovida pelos ODS. Segundo as ONGs, “a agenda de desenvolvimento posterior a 2015 apresenta uma oportunidade importante para cumprir os compromissos assumidos pelos Estados membros em 2010”.

A declaração será um documento de aspirações políticas que incluirá a agenda pós-2015 e a dos ODS. Espera-se que um rascunho do documento seja publicado no final deste mês. Alguns Estados membros da ONU destacaram a necessidade de a agenda ser “justa, equitativa, transformadora e centrada nas pessoas”. As organizações argumentam que a inclusão da água e do saneamento como direitos humanos na declaração pós-2015 é vital para a realização deste objetivo.

Entre os ODS propostos há 17 objetivos e 169 metas que incluem uma ampla gama de assuntos de desenvolvimento sustentável, como erradicação da pobreza e da fome, melhora da saúde e da educação, que as cidades sejam mais sustentáveis, combate à mudança climática e conseguir uma gestão sustentável da água e do saneamento para proteger os oceanos e as florestas.

Dos 17 objetivos propostas, o primeiro objetiva erradicar a pobreza e o segundo a acabar com a fome, conseguir a segurança alimentar e melhor nutrição, e promover a agricultura sustentável.

O objetivo número três busca assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar de todos em todas as idades. O quatro procura garantir uma educação de qualidade includente e equitativa e promover oportunidades de aprendizagem permanente para todos e todas.

O objetivo cinco fala da igualdade de gênero e do empoderamento das mulheres e meninas, e o seis garante a disponibilidade da água e de saneamento e sua gestão sustentável.

O objetivo sete aspira garantir o acesso a uma energia confiável, sustentável, moderna e a preços acessíveis, enquanto o oito comenta o crescimento econômico sustentado, inclusivo, e o emprego pleno, produtivo e digno para todos e todas.

O objetivo nove fala da construção de infraestrutura resistente, promove a industrialização inclusiva e sustentável e fomenta a inovação, enquanto o 10 propõe a redução das desigualdades dentro e entre os países.

O de número 11 aponta para cidades e comunidades inclusivas, seguras, resistentes e sustentáveis, e o 12 para a garantia de padrões de consumo e produção sustentáveis. O 13 exorta no sentido de tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e suas consequências, e o 14 busca conservar e utilizar os oceanos, os mares e os recursos marinhos de forma sustentável para seu desenvolvimento.

O objetivo 15 fala em proteger, restaurar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, a gestão sustentável das florestas, a luta contra a desertificação e o fim da degradação do solo e da perda de biodiversidade. O 16 promove sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, o acesso à justiça para todos e instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.

Por fim, o 17 procura fortalecer os meios de aplicação e revitalizar a aliança mundial para o desenvolvimento sustentável. Envolverde/IPS