Além dos trópicos

Variáveis que dificultam a descoberta de tratamentos para doenças como malária e dengue, que não estão mais restritas aos países mais pobres, são destacadas por cientistas na FAPESP Week. Foto: JVInfante Photography/Wilson Center)(foto: JVInfante Photography/Wilson Center

Agência Fapesp – Na última sessão da Fapesp Week, realizada de 24 a 26 de outubro de 2011, em Washington, Sergio Schenkman, professor titular do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), apontou o cenário atual da pesquisa em doenças tropicais, com ênfase na doença de Chagas.

“Essas doenças são conhecidas como negligenciadas e o são por falta de interesse econômico direto. Empresas farmacêuticas não estão interessadas e poucas pessoas acabam trabalhando com essas doenças. Mas o Trypanosoma, parasita causador da doença de Chagas, não ocorre apenas em países da América do Sul, mas também na África, Europa, Ásia e mesmo nos Estados Unidos. Ou seja, doenças como essas não são mais problemas apenas dos países mais pobres, mas também dos mais ricos”, destacou. Schenkman coordena o Projeto Temático “Organização celular na diferenciação e no ciclo celular de Trypanosoma” (http://www.bv.fapesp.br/pt/projetos-tematicos/1918/organizacao-celular-diferenciacao-ciclo-celular), financiado pela Fapesp.

“O sequenciamento do genoma do Trypanosoma cruzi e de outros tripanossomos, em 2005, forneceu instrumentos importantes para que possamos atingir o controle de doenças como a de Chagas, principalmente no sentido do desenvolvimento de novas drogas. Entretanto, há muitos desafios que precisamos superar, devido à biologia complexa e ainda desconhecida desses parasitas”, disse.

 

“Nossa abordadem tem sido identificar sinais que são usados pelos parasitas para induzir ou controlar essas adaptações. Precisamos compreender as condições exigidas para o estabelecimento do parasitismo, isto é, dos mecanismos que controlam seu desenvolvimento dentro do hospedeiro”, disse.

O grupo coordenado por Schenkman tem investigado os sinais que fazem com que o tripanossomo passe por transformações específicas e se desenvolvam em função do ambiente encontrado nos seus diferentes hospedeiros.

Na mesma sessão sobre doenças tropicais, Elodie Ghedin, professora assistente no Departamento de Biologia Computacional e de Sistemas na Universidade de Pittsburgh, apresentou resultados de estudos feitos com nematoides parasitas que causam doenças como a filaríase.

Também conhecida por elefantíase ou filariose, o engrossamento da pele e tecidos subjacentes é causado por vermes como Wuchereria bancrofti e Brugia malayi, este último particularmente estudado pelo grupo de Ghedin. “A filaríase linfática atinge mais de 80 países que compreendem cerca de um quarto da população mundial”, disse.

Ghedin e equipe estudam o desenvolvimento de nematoides parasitas, comparando como vermes que infectam o homem se desenvolvem em comparação com outros que vivem livremente no ambiente.

“O Brugia malayi mantém uma relação simbiótica com uma bactéria, a Wolbachia, e essa relação representa um alvo potencial para o estudo de terapias”, disse.

A origem e a evolução da diversidade em parasitas de malária foi o tema da palestra de Marcelo Urbano Ferreira, professor de Parasitologia no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.

“Diferentemente de outros tipos de patógenos virais e bacterianos, que induzem imunidade de longo prazo após uma primeira infecção, os parasitas da malária exigem vários anos de exposição continuada para que ocorra uma proteção imune parcial”, disse Ferreira.

Ferreira e seu grupo realizam pesquisa de campo em Remansinho (AM), em um Amazonian International Center of Excellence in Malaria Research (ICEMR), financiado pelo National Institutes of Health (NIH) do governo dos Estados Unidos. “O local que estudamos, não por coincidência e nem por surpresa, está dentro de uma grande área desflorestada”, disse.

Nikolaos Vasilakis, da University of Texas Medical Branch, falou sobre dengue, destacando que não se trata mais de uma doença restrita a um ou outro país ou continente, mas a todo o mundo. “Antigamente, os vírus levavam anos para passar de uma região a outra, mas hoje, com a facilidade nos transportes, isso pode ocorrer em horas”, disse.

“Os vírus causadores da dengue são, de longe, os patógenos arbovirais mais importantes nas zonas tropicais, colocando em risco de infecção quase um terço da população mundial. Como o homem é o único vertebrado recipiente do vírus da dengue, isto implica que não há outros modelos animais para estudar a doença”, disse.

 

* Publicado originalmente no site da Agência Fapesp.