Sistema de abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Foto: Manoel Marques/ Imprensa MG (29/01/2015)
Sistema de abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Foto: Manoel Marques/ Imprensa MG (29/01/2015)

 

Diferentemente de outros anos, neste 2015 pouco será necessário acrescentar sobre a importância da água e sobre as consequências da sua falta. Nós brasileiros, principalmente da região Sudeste e mais ainda nós paulistas, já temos levado sustos suficientes para entender o quão vital é esse insumo.

Mas, espere um pouco, será mesmo? Todos já estamos conscientes de verdade?

Pois eis que alguns fatos recentes colocam em dúvida essa tal conscientização que seria mais do que óbvia e ululante:

Desde o ano passado, a empresa de abastecimento de água de São Paulo, a Sabesp adotou redução nas contas para quem economizasse e, posteriormente foram adotadas multas para quem gastasse mais. Junto a isso, as alarmantes notícias sobre o rápido esvaziamento de nossas represas, fez com que muita gente reduzisse o consumo. Mas eis que em fevereiro último 19% dos consumidores aumentaram o consumo de água. Entre as possibilidades aventadas para tal, está a absurda constatação de que como choveu, o problema estaria resolvido e, então, gastar mais água seria normal.

Verdade que está chovendo, mas a situação permanece crítica e se os mananciais da região metropolitana de São Paulo estão com um pouquinho mais de água, ela ainda é totalmente insatisfatória para manter o abastecimento nos períodos de seca.

Muita gente, até mesmo coleguinhas, afirmam ser culpa da imprensa que não está informando corretamente. Discordo! Se por vezes lemos, vemos ou ouvimos alguma notícia incompleta ou com fatos mal apurados, em nenhum momento li, vi ou ouvi em qualquer veículo de comunicação que o nosso problema de abastecimento de água está caminhando para uma solução. Todos continuam alertando para o perigo do alto consumo.

Então como explicar esse aumento no consumo? Só posso concluir que seja uma questão puramente de negação. Como algo que antes não tinha importância nenhuma passa a ser fundamental? Como esse insumo que custa tão pouco e é tão ordinário pode agora ter toda essa relevância?* Negação, pura negação!

Empresas e pessoas na mesma toada

O que dizer então de uma pesquisa realizada no final do ano passado realizada pelo CPDEC (Centro de Pesquisa, Desenvolvimento e Educação Continuada), em parceira com o NEIT (Núcleo de Economia Industrial e Tecnologia) do Instituto de Economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) com 137 representantes de empresas, indústrias, hospitais e hotéis no Estado de São Paulo que constatou que 94,9% delas não tem um plano de contingência para enfrentar a crise hídrica? Sendo que atividades econômicas já foram e ainda estão sendo paralisadas pelos problemas vinculados à falta de água? Mas das empresas entrevistadas apenas 12,4% possuiam sistema de reúso de água. É de causar perplexidade, não?

Essas empresas afirmaram ter tomado algumas medidas nos últimos meses, como a instalação de redutores de vazão nas torneiras, suspensão da lavagem de calçadas e de ambientes comuns, além da realização de campanhas internas entre os funcionários. Muito pouco diante da situação crítica. E por quê? Mais uma vez a negação. A busca por uma gestão da água com a máxima eficiência parece ter ficado longe de uma visão estratégica na maioria dessas empresas mesmo representando sérios riscos para as suas próprias atividades.

Situação no mundo

Aproveitando a efeméride, a ONU – Organização das Nações Unidas, lançou o Relatório Global sobre Desenvolvimento e Água 2014. O documento prevê que, em 2030, haverá necessidade de se aumentar em 35% a produção de alimentos, 40% a mais de água e 50% a mais de energia, todos interligados e interdependentes. Para isso, segundo o estudo, são necessárias a urgente adoção de políticas e marcos regulatórios capazes de reconhecer como prioridades absolutas as áreas de água e energia.

Outros dados bastantes críticos divulgados no relatório da ONU dão conta de que 768 milhões de pessoas não tem acesso à água tratada e 2,5 bilhões vivem em condições sanitárias inadequadas.

Apenas para refletir

Negar a importância da água para a nossa sobrevivência e dos cuidados e carinhos com que ela deve ser tratada é algo totalmente inaceitável. Diante de todos os fatos aqui expostos, talvez o mais representativo seja a nossa própria composição como seres. Somos, mais ou menos, compostos 75% de água! Uma proporção incrivelmente semelhante a do planeta também composto de ¾ de água. Seria uma mera coincidência? Que tal pensar nisso ao abrir a torneira?

*Afirmação válida para os paulistas e outros habitantes do sudeste que só recentemente passaram a ter problemas com o abastecimento de água. A situação é, obviamente, muito diferente em outras regiões do país, destaque para os estados do Nordeste e de dezenas de países do mundo que consideram a água uma preciosidade, acostumados que estão com a sua escassez. Vide referência ao relatório da ONU.

* Reinaldo Canto é jornalista especializado em Sustentabilidade e Consumo Consciente e pós-graduado em Inteligência Empresarial e Gestão do Conhecimento. Passou pelas principais emissoras de televisão e rádio do País. Foi diretor de comunicação do Greenpeace Brasil, coordenador de comunicação do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente e colaborador do Instituto Ethos. Atualmente é colaborador e parceiro da Envolverde, colunista de Carta Capital e assessor de imprensa e consultor da ONG Iniciativa Verde.