Clima

Café e banana contra a mudança climática

O produtor de café Joshua Wamukota tem um terreno no centro de Uganda e é um dos muitos que plantam café e banana juntos, uma prática climaticamente inteligente. Foto: Wambi Michael/IPS
O produtor de café Joshua Wamukota tem um terreno no centro de Uganda e é um dos muitos que plantam café e banana juntos, uma prática climaticamente inteligente. Foto: Wambi Michael/IPS

Por Wambi Michael, da IPS – 

Kampala, Uganda, 4/1/2016 – Os agricultores de Uganda plantam cada vez mais café, principal produto de exportação, com banana, cultivo alimentar básico, como forma de enfrentar as consequências da mudança climática neste país africano.No densamente povoado monte Elgon, na cadeia Ruwensori, os pequenos agricultores plantam os dois cultivos juntos, apesar das recomendações do sistema de extensão agrícola colonial para separá-los no centro e oeste do país, onde se acreditava que a terra era abundante.

Entretanto, com a crescente pressão populacional e a mudança climática, isso já não é possível. Estudos do Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IITA) e de outras instituições mostram que os agricultores de Uganda conseguem 50% mais de renda ao combinar o cultivo de café com o de banana, em lugar de optar por apenas um.Realizado em mais de 30 distritos de Uganda, o estudo mostra que a produção de café se manteve quando combinada com o cultivo de banana, o que também permitiu elevar a renda dos agricultores.

Segundo o agrônomo Piet Van Asten, do IITA em Kampala, a região onde se cultiva a variedade de café Arábica, no monte Elgon, conseguiu rendimento de US$ 4,441 mil anuais por hectare quando combinado com o cultivo de banana, acima dos US$ 1,728 mil e dos US$ 2,364 mil que se obtêm quando se planta somente banana e café, respectivamente.Nas áreas onde se planta a variedade de café Robusta, no sul e sudoeste de Uganda, a renda anual por hectare de cultivos associados gira em torno dos US$ 1,827 mil, mais do que os US$ 1,286 mil obtidos com a monocultura.

Van Asten e outros pesquisadores do Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT) sugerem que o cultivo associado também pode ajudar os agricultores a enfrentaras exigências impostas pela mudança climática. A perspectiva de que a temperatura média em Uganda aumente dois graus Celsius na próxima década, o que vai gerar chuvas irregulares, terá impacto negativo no café, principal cultivo comercial deste país.

O café gera cerca de 20% da arrecadação com exportações e é a principal fonte de renda dos pequenos agricultores. Tanto a variedade Robusta quanto a Arábica precisam de clima tropical fresco que só é encontrado nas maiores altitudes, em geral acima dos 1.400 metros.

Segundo o estudo, se não se adaptarem ao sistema, as áreas abaixo dos 1.300 metros provavelmente ficarão inutilizadas para a produção da variedade Arábica. As que estão entre 1.300 e 1.700 metros ficarão comprometidas se os agricultores não mudarem as práticas atuais que usam as variedades tradicionais e utilizam poucas tecnologias para criar sombra e conservar a água.

A associação dos dois cultivos resulta em uma alternativa promissora. A sombra da bananeira pode reduzir a temperatura nos cafezais em dois graus ou mais. Além disso, a cobertura permanente, o sistema de raiz e o húmus da banana evitam a erosão e a degradação do solo em terrenos acidentados. Os pesquisadores sugerem que plantar banana em campos de café também ajuda a mitigar os efeitos da mudança climática, ao capturar dióxido de carbono do ar que, através do húmus enriquece as reservas de carbono do solo.

A banana é um produto básico importante e gerador de renda em Uganda, e é fundamental para a segurança alimentar. Esse país tem um dos maiores consumos de banana por pessoa do mundo. É produzida o ano todo, o que permite gerar uma renda modesta, mas contínua, ao contrário do café, produzido um ou duas vezes ao ano.A evidência mostra que plantar café à sombra das bananeiras melhora a qualidade do grão. Também se comprovou que diminui o surgimento da praga ferrugem do café em 50% em plantas que não estão à sombra, muito importante em um contexto de aumento de doenças pela elevação da temperatura.

Nicholas Muhangu, que produz café Arábica no monte Elgon, leste de Uganda, destacou à IPS que plantar os dois produtos ao mesmo tempo no mesmo terreno duplicou suas vantagens. Além disso, “a bananatambém é importante como alimento e é o único cultivo que prospera nessa área”, acrescentou.Ele afirmou que cultivos como milho não funcionam bem na região, por ser muito fria, e porque demora para amadurecer. “Uma pessoa não pode dizer que é um agricultor se não plantar café e banana. Temos pequenos terrenos e é preciso cultivá-los juntos”, explicou.

Van Asten e seus colegas investigaram o motivo de o cultivo associado de café e banana não estar generalizado no país e concluíram que uma das desvantagens é que aumenta a competição por água, nutrientes e luz. “Mas pode-se resolver isso com boas práticas agrícolas, integrando insumos como fertilizantes e nutrientes orgânicos”, ressaltou. Muhangu concordou, afirmando que “só é preciso assegurar que as bananas estejam adequadamente podadas para evitar as folhas desnecessárias e os dois cultivos poderão coexistir confortavelmente”.

George Wanakina, que trabalha no distrito de Mbale, em uma das áreas onde se cultiva café e banana, contou à IPS que essa combinação faz parte do estilo de vida e do conhecimento dos agricultores locais e que é passado de geração a geração. “Só precisamos de formas de difundir o conhecimento autóctone a outras partes do país, agora que há o apoio de pesquisas científicas que provam que esse pode ser um mecanismo para enfrentar a mudança climática”, destacou.

George William Bazirake, cientista do Instituto de Pesquisa Industrial de Uganda, afirmou à IPS que a casca da banana e a casca e folhas do café podem ser uma opção climaticamente inteligente para reter nutrientes no solo.

Uma análise do IITA no leste de Uganda revela que aumenta a proporção de plantações com cultivos associados nos últimos cinco anos; 85% dos agricultores atualmente mantêm pelo menos uma área de seus terrenos com cultivos de café e banana combinados. O estudo também mostra que metade dos produtores de café no centro e no oeste do país ainda se dedica à monocultura.

O IITA estuda os benefícios da associação de cultivos de café e banana em Burundi, República Democrática do Congo, Ruanda e Uganda desde 2006.Os benefícios incluem: maior fertilidade do solo ao fornecer material para o húmus, proteção do solo e do pé de café das temperaturas extremas, melhor qualidade e produção de café, manejo do risco com a renda, intensificação sustentável de pequenos terrenos, gestão da água, proteção da erosão e escorrimento quando há chuvas abundantes.

O governo ainda não adotou oficialmente a prática porque há múltiplos atores e a não regulamentação em matéria de adaptação à mudança climática, o que atrasa sua aceitação.Porém, os últimos estudos e as publicações internacionais incluem referências ao cultivo associado de café e banana como uma prática climaticamente inteligente. Ruanda, por exemplo, registrou significativa mudança de atitude quando o governo começou a promover o cultivo associado. Envolverde/IPS