Economia

“A economia deve nos servir, não o contrário”

John Schmitt. Foto: Cortesia do entrevistado
John Schmitt. Foto: Cortesia do entrevistado

Seattle, Estados Unidos, 5/1/2015 – Desde a época da universidade, John Schmitt esteve “muito interessado nas questões de justiça econômica e desigualdade econômica”. Teve um período de aprendizado dentro do movimento sindical dos Estados Unidos, onde investigou as campanhas de organização de vários sindicatos. Agora é um autor influente sobre empregos mal remunerados, que reorientou a forma como os políticos e economistas compreendem o tema.

Schmitt é economista do Centro para a Pesquisa Econômica e Política em Washington. Também é professor visitante na Universidade Pompeu Fabra, de Barcelona, e foi bolsista Fulbright na Universidade Centro-Americana José Simeón Cañas, de El Salvador. Tem diplomas da Universidade de Princeton e da London School of Economics.

O correspondente Peter Costantini da IPS entrevistou John Schmitt por telefone e e-mail, entre agosto e dezembro de 2014.

IPS: Entre as receitas políticas para reduzir a desigualdade de renda e levantar o piso do mercado de trabalho, onde se encaixa o salário mínimo?

JOHN SCHMITYT: Creio que o salário mínimo é muito importante. Concretamente eleva os salários de muitos trabalhadores de renda baixa e média, e também estabelece o princípio de que nós, como sociedade, podemos exigir que a economia seja sensível às necessidades sociais. É uma declaração legal, quase palpável, de que temos o direito de exigir que a economia nos sirva e não que seja servida por nós. Não é a solução em si mesmo, mas é um primeiro passo importante. Nos Estados Unidos, dois dos três últimos aumentos do salário mínimo foram assinados por presidentes republicanos, com um importante apoio dos democratas no Congresso. Assim, trata-se de uma instituição muito norte-americana, que tem uma longa história de apoio bipartidário. E é um primeiro passo fácil. É algo que temos neste país desde a década de 1930, e tem amplo apoio político. Habitualmente, nas pesquisas recebe um apoio muito acima dos 50%, mesmo entre os republicanos. E na população em geral tem apoio de 65% a 75% dos eleitores. E é eficaz em fazer o que se supõe que deve fazer, que é aumentar o salário dos trabalhadores na base inferior. Recompensa os que trabalham. Quase todo o mundo concorda que, se alguém trabalha muito, deve receber uma quantidade digna de dinheiro em troca. Também não implica nenhuma burocracia governamental além de um mecanismo de aplicação relativamente menor. Porque todo o mundo sabe o que é um salário mínimo. Existe uma norma social e a esperança de que os que trabalham devem receber pelo menos o salário mínimo.

IPS: Nos anos 1990 começou-se a questionar o velho argumento de que o aumento do salário mínimo reduz o emprego entre os trabalhadores com baixa remuneração.

JS: Foi chamado de Nova Investigação do Salário Mínimo. Muitos economistas da época investigaram a experiência dos Estados que haviam elevado o salário mínimo e descobriram que os aumentos estatais pareciam ter pouco ou nenhum efeito sobre o emprego. Isto causou uma grande controvérsia, que ainda está em curso. O modelo dos textos de estudos sobre como funciona o mercado de trabalho é uma simplificação excessiva. Pode ser útil em alguns contextos, mas não para entender uma coisa bastante complicada: o que acontece quando o salário mínimo sobe. Uma ideia fundamental é que nem os empresários e nem os empregados operam em um mercado de trabalho competitivo. Existe a possibilidade de os empresários realizarem ajustes em outras dimensões, além de demitir os trabalhadores: elevam os preços um pouco ou reduzem as horas de trabalho. E, do ponto de vista de um trabalhador, se elevam seu salário em 20% e reduzem suas horas em 5% ou 10%, ainda está melhor, não? Porque se paga mais dinheiro por menos tempo de trabalho. Assim, há muitas maneiras para as empresas se adaptarem à alta do salário mínimo, além das demissões.

IPS: Do ponto de vista do trabalhador, este ainda sai beneficiado. O emprego de baixa renda é muito instável por si só.

JS: Um ingrediente importante aqui é a rotatividade de pessoal. Uma nova pesquisa analisa muito bem o que acontece com as taxas de rotação trabalhista antes e depois do aumento do salário mínimo, e encontra uma redução substancial das mesmas para diferentes tipos de trabalhadores. Uma análise diferente se refere a uma lei de salário digno aprovada pelo aeroporto de São Francisco há alguns anos. Encontraram uma redução de 80% na rotatividade do pessoal encarregado da equipagem após a alta. A mudança é muito cara, inclusive se forem trabalhadores com salários baixos. Ocupar uma vaga pode custar entre 15% e 20% do custo anual desse trabalho. As pessoas que têm de fazê-lo são gerentes, que têm tempo mais caro. E, enquanto isso, você está perdendo clientes. Assim, se o salário mínimo reduz a rotatividade trabalhista, do que há cada vez mais evidência, então pode explicar em grande parte porque vemos tão pouco impacto do aumento do salário mínimo no emprego.

IPS: O que acontece quando as cidades aumentam o salário mínimo?

JS: Tenho muita fé no processo democrático. Quando uma cidade decide fixar o salário, muita gente participa: empresários, trabalhadores, sindicatos, organizações da comunidade, os trabalhadores de baixa renda, acadêmicos locais. Acredito que este seja um motivo pelo qual não vemos grandes consequências no nível do emprego: o processo, em geral, conduz a um salário que é uma grande melhoria diante do que havia e dentro do alcance que a economia local pode se permitir. Creio que, provavelmente, nos equivoquemos pelo lado da precaução e não pelo lado de ir muito longe. Envolverde/IPS