Sociedade

Instituto Patrícia Galvão lança relatório com análise da cobertura da imprensa sobre feminicídio e violência sexual

A abordagem romantizada e a desresponsabilização do autor pelo crime foram a tônica da cobertura dos feminicídios nos veículos analisados; nas notícias sobre violência sexual, o comportamento da vítima ganha destaque.

Ao longo de seis meses (01/10/2015 a 31/03/2016), foram monitorados mais de uma centena de portais e sites noticiosos, sendo que, ao final, foram selecionados 71 veículos representativos das cinco regiões do país. A amostra foi composta por 1.583 matérias sobre homicídios de mulheres e 478 sobre crimes de estupro.

Da análise da amostra de matérias coletadas no monitoramento é possível afirmar que, em relação à cobertura dos assassinatos de mulheres, prevaleceram matérias sobre a morte em si, sem informações sobre quem era aquela mulher, se já havia buscado ajuda, recorrido ao Estado para se defender de violências anteriores ou se tinha medida protetiva, entre outras questões que podem apontar falhas nas políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres.

Motivação para o feminicídio

A maioria absoluta dos textos não aborda as reais motivações para o crime; nos que tentam apresentar um motivo, a maioria aponta como causas do assassinato: ‘ciúmes’, ‘violenta emoção’, ‘defesa da honra’, ‘inconformidade com a separação’, autor ‘fora de si’, ‘transtornado’ ou ‘sob efeito de álcool’. É importante discutir esse padrão que tem sido frequentemente adotado pela imprensa, porque transfere a culpa para a vítima, por seu comportamento e/ou atitudes.

Imagens desrespeitam vítimas e familiares

Em 15% das matérias analisadas que continham imagens de vítimas houve exibição de corpos – em sua maioria de mulheres negras – sem qualquer tratamento. Quando isso ocorre é importante ressaltar que, além do vilipêndio pela crueldade da morte, há a revitimização pela exposição midiática. Em relação às mulheres trans e travestis, a cobertura tende a ser ainda mais desrespeitosa. Além de serem comuns a exposição do nome de registro (e não do nome social) e imagens de corpos dilacerados ou jogados no chão, é frequente a associação à suspeita de prática criminosa (roubo, furto ou ameaça), não se abordando a discriminação social de gênero, a transfobia ou a possibilidade de um crime de ódio.

Culpabilização também da vítima de violência sexual

Nas matérias analisadas sobre a cobertura da violência sexual, constatou-se que também persistem abordagens que reforçam a cultura de violência contra vítimas, atribuindo a elas a culpa pela violência que sofreram, pois teriam, segundo essa avaliação, ‘provocado’ o estupro, uma distorção sempre associada à sensualidade ou ao exercício da sexualidade, uso de álcool ou drogas ou algum outro comportamento considerado ‘inadequado’ a uma mulher.

Sobre a publicação

Com redação da jornalista Luciana Araújo, especialista em mídia e violência de gênero e raça, a publicação foi produzida no âmbito do projeto “Monitoramento e Análise da Cobertura Jornalística sobre Feminicídio e Violência Sexual contra Mulheres”, desenvolvido pelo Instituto Patrícia Galvão com apoio da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, e visa não apenas contribuir para o debate sobre o papel da comunicação no enfrentamento da violência de gênero, mas especialmente dialogar com profissionais de imprensa e comunicadores em geral sobre cuidados importantes para que não incorram na revitimização de mulheres ou familiares das vítimas de violência de gênero e até mesmo em desvios em relação aos códigos de ética da categoria e dos meios – cuidados que são importantes também para preservação do próprio jornalista.

Clique aqui para saber mais e aqui para acessar na íntegra a publicação “Imprensa e Direitos das Mulheres: papel social e desafios da cobertura sobre feminicídio e violência sexual”. (#Envolverde)