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O verde no voto em 22

por Samyra Crespo, especial para Envolverde –

Hoje, 22 de maio, celebra-se o Dia Mundial da Biodiversidade.

No mundo surgem as “muralhas verdes”. Aqui? Devastação.

No mundo inteiro, onde a seca, queimadas, e outros fenômenos devastaram as florestas, percebe-se enormes esforços de recomposição vegetal. Austrália, África, em todo lugar se erguem “muralhas verdes ” – bilhões de árvores plantadas – com o objetivo de enfrentar as mudanças climáticas e absorver carbono da atmosfera. Recompor paisagem e habitats: com as matas retornam os animais terrestres, a microfauna e a microflora: os fungos, líquens, depois os insetos polinizadores e em alguns anos – cerca de 20 anos se a área for intocada – temos uma boa parte da biodiversidade anterior reconstituída.

A ONU lançou este ano ” A Década da Restauração” e em todo lugar há um só mantra: plantar, plantar e plantar. Em muitos lugares estão sendo abertas grandes frentes de trabalho e o enfrentamento da pobreza está se fazendo com o plantio massivo de árvores.
Menos no Brasil. Aqui se desmata sem dó. Há dois meses são batidos tristes recordes de desmatamento na Amazônia – os mais severos em 10 anos. Em outros biomas – principalmente no cerrado sojeiro – o estrago aumenta e impiedosamente vamos preparando o caminho das queimadas – que irão chegar com precisão matemática nos meses mais secos.

Quando trabalhei com os ministros Carlos Minc e Izabella Teixeira, em Brasília (2008-2013) o Dia Mundial da Biodiversidade era data de prestação de contas à sociedade. Quantas áreas tinham sido tombadas como protegidas? Quantos serviços tínhamos colocado à disposição da conservação de animais e plantas no País? Quantos instrumentos de monitoramento desenvolvemos? O desmatamento era o terror de todos os ministros. Aumento nas taxas de desmatamento significava bilhete azul de ministro – e era acompanhado pela própria casa civil. Um atestado de competência.

A conservação da biodiversidade e dos complexos serviços ecológicos prestados por ela está no DNA do Ministério do Meio Ambiente. É quase a sua razão de ser. Daí ser chocante e abominável ter um indivíduo como Ricardo Salles à frente desta pasta ministerial.
É uma profanação inaceitável da missão do MMA.

Quando ele fala que a pauta urbana do saneamento é a sua prioridade, lança uma falácia tão rasa quanto ele. O Ministério do Meio Ambiente nunca teve o mandato desta pauta, que estava a cargo do Ministério das Cidades e do Desenvolvimento Urbano, com milhões operados pela Caixa Econômica Federal.

Que o Ministério do Meio Ambiente contribua para monitorar e melhorar a qualidade ambiental das cidades, não fazemos objeção. Sem descurar no entanto do seu papel nobre e maior – que é o de conservar nosso patrimônio ambiental de florestas e recursos naturais, garantindo que cada bioma não se degrade irreversivelmente.

O exemplo negativo do Governo Federal, que desmantela a legislação nacional de proteção, inspira governadores e prefeitos na irresponsabilidade predadora.

Em vez de criar novas áreas protegidas, os governos estaduais e prefeituras estão desafetando parques e diminuindo unidades de conservação estratégicas. Desafetar quer dizer juridicamente e na prática tirar o título de proteção para “deixar a boiada ” passar ou grileiros invadir.

É com grande tristeza que escrevo estas linhas, onde mais uma vez lamentamos o que atualmente ocorre no País.
Temos um aliado dos desmatadores, garimpeiros e exploradores da madeira ilegal; dos sojeiros e criadores de gado no poder central. Ele nomeia ministros que dizem publicamente que “manda quem pode, obedece quem tem juízo”.

Sua cartilha é clara. Nossas opções para 22 – nas eleições, também.

No voto estaremos dizendo se nosso patrimônio ambiental e nossas responsabilidades com a biodiversidade e o clima do Planeta valem alguma coisa para nós, brasileiros.

Hoje, prática e infelizmente, nada a celebrar.

(Este texto foi escrito para o site da Envolverde.)

Samyra Crespo é cientista social, ambientalista e pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins e coordenou durante 20 anos o estudo “O que os Brasileiros pensam do Meio Ambiente”. Foi vice-presidente do Conselho do Greenpeace de 2006-2008.

 

 

 

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