O futuro do Brasil está no céu e não no subsolo

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Atualizado em 20/09/2017 às 18:09, por Dal Marcondes.

Por Nathália Clark e Silvia Calciolari – 

Com abundância de fontes renováveis no país, governo brasileiro insiste em investir em energias do passado, ofertando blocos para exploração de petróleo e gás, que financiam a crise climática, fomentam a corrupção e enfraquecem as economias mundo afora

Fato  já constatado até por especialistas do setor , a era do “ouro negro” está definitivamente ficando no passado. O mundo tem experimentado um processo de renovação energética sem precedentes, onde as energias renováveis estão desempenhando um papel crucial e essencial, já que as reservas fósseis estão se esgotando. Ambientalmente sustentáveis, socialmente justas e economicamente viáveis, fontes como solar, eólica e de biomassa têm se tornado cada vez mais baratas e populares. Com  o planeta em alerta  vermelho por conta de eventos cada vez mais severos causados pelas mudanças climáticas, projetos ligados a combustíveis fósseis como carvão, petróleo e gás se tornaram investimentos de alto risco.

Por serem os principais emissores dos gases que causam o efeito estufa, os combustíveis fósseis estão diretamente relacionados ao financiamento da crise climática global. A fim de evitar essa associação e cumprir com o compromisso assumido em Paris em 2015, países no mundo todo têm investido seriamente na transição de suas matrizes energéticas. Ainda assim, governos como o do Brasil, cuja abundância em recursos naturais encontra poucos paralelos, contraditoriamente insistem em priorizar fontes fósseis em detrimento das renováveis. No próximo dia 27, a Agência Nacional do Petróleo e Gás (ANP) vai contra os apelos globais por um novo modelo de desenvolvimento econômico-energético e intensifica a agenda de leilões de blocos para exploração de petróleo e gás no país.

“A cada dia, as pessoas estão cada vez mais ligando os pontos entre empresas que investem em fósseis e o caos climático e as injustiças socioambientais . Mas não é só isso. Essa indústria também está associada a casos de corrupção junto aos governos nacionais em vários países”, alerta Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora da 350.org Brasil e América Latina e coordenadora nacional daCOESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida.

“No Brasil, a Operação Lava Jato revelou os esquemas de propina mostrando que essas empresas fazem de tudo para controlar o mercado no qual pretendem investir, agindo sem transparência e com truculência. Chega de fertilizar o subsolo brasileiro com corrupção”, enfatiza Nicole.

Corrupção e caos climático

Desde 2013 a Coalizão Não Fracking Brasil esteve presente diversos em leilões e mandou um claro recado para os investidores: Desenvolvimento só com renováveis. Foto: COESUS/350Brasil

A 14ª Rodada de Licitações irá ofertar  287 blocos em 11 bacias sedimentares  marítimas e terrestres. Das  36 empresas  que foram aprovadas para participar do certame, mais 60% são estrangeiras e pelo menos cinco delas estão envolvidas em casos de corrupção. Empresas como a  Shell  e  ExxonMobil, por exemplo, compartilham casos de esquemas ilícitos envolvendo o governo nigeriano . A esta última ainda se soma o histórico agravante de  ter omitido conhecimento  sobre as mudanças climáticas há mais de meio século.

Já a empresa  Petronas, da Malásia, teve um de seus executivos preso por suspeita de superfaturar  uma operação de exploração de petróleo. A Rosneft, empresa de petróleo comandada pelo governo russo, está  sob investigação em um caso que levou o ministro do desenvolvimento econômico a ser preso . Outras empresas, como a  indiana Cairn Energy , são acusadas de espionagem por obter informações privilegiadas do governo sobre negociações com empresas estrangeiras interessadas em investir na Índia.

Casos recentes, como os esquemas de propina da Petrobras e da Queiroz Galvão, no Brasil, demonstram como a corrupção da indústria fóssil está em várias parte do mundo. São empresas dispostas a tudo para conseguir controlar o mercado, em aliança com governos corruptos que agem  sem qualquer transparência, consulta e diálogo  para com as suas populações, e menos ainda com as comunidades diretamente impactadas por esses empreendimentos.

Para o engenheiro Juliano Bueno de Araújo, coordenador de campanhas climáticas da 350.org e fundador da COESUS, “a ANP age de forma irresponsável, sorrateira e criminosa ao não explicitar no edital da 14ª Rodada a autorização para gás não convencional, colocando em risco a vida, a segurança alimentar e hídrica de milhões de brasileiros. Dessa forma eles estão enganando o povo brasileiro, e isso nós não vamos aceitar.”

Energias responsáveis

Além da falta de transparência, a indústria fóssil também usa e abusa da falsa e ilusória promessa de progresso e desenvolvimento, com geração de renda e empregos, para limpar a sua imagem junto à sociedade. Mas o Rio de Janeiro, sede do leilão e o maior produtor de petróleo e gás do país, é uma prova viva do contrário. Vivenciando uma das mais graves crises econômicas de sua História recente, o estado que mais depende do dinheiro sujo dos fósseis amarga as piores taxas de crescimento econômico do Brasil.

“O Rio de Janeiro é o exemplo cabal de falência de uma indústria que está com os dias contatos em todo o mundo, aliada à corrupção e reprodutora de um modelo ultrapassado de geração de energia. Isso sem falar que a cidade está vulnerável aos impactos das mudanças climáticas, como aumento do nível do mar, deslizamentos, doenças epidêmicas, entre outras ocorrências que atingem toda a população“, atesta Juliano.

Em oposição a essa realidade, um novo horizonte se amplia com o  crescimento exponencial  das energias limpas. Hoje, o setor de renováveis emprega mais de oito milhões de pessoas, sendo a China a campeã, com 3,5 milhões de empregos, e o Brasil vem em segundo lugar, com quase um milhão de trabalhadores no ramo.

Com grande potencial, o Brasil deve estimular e atrair investimentos para a produção de equipamentos para a geração de energia renováveis – solar, eólica e de biomassa. “Já há estudos que comprovam que a indústria de baixo carbono gera 18 vezes mais empregos que a fóssil e, depois de instalada, proporciona a geração de energia 40% mais barata”, completa o engenheiro.

“Neste momento, o mundo passa por um difícil teste de eventos climáticos catastróficos. As pessoas precisam saber que o presente e o futuro do planeta dependem de uma única decisão: deixar os fósseis no chão de uma vez e olhar para o céu priorizando a energia livre, responsável, com justiça ambiental e climática”, finaliza Juliano.

 

 

 


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