COP19: A ligação entre REDD+ e os indígenas: dois diferentes pontos de vista

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Expansão agrícola, conversão de áreas em pastagens, desenvolvimento de infra-estrutura e muitos outros cenários de degradação ambiental dificultam os objetivos do plano ADP (Protocolo Durban) para 2020, que tem sido discutido nesta COP. O plano deve entrar em vigência a partir de 2020, uma vez que o Protocolo de Kyoto já perdeu sua validade e mostra-se completamente antitético à necessidade de reduzir as emissões de gases que provocam as mudanças climáticas.

Uma das discussões aqui no evento é sobre a criação de um valor financeiro para o carbono armazenado pelas florestas: esta ação é chamada de REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal). A iniciativa é definida como aquela que oferece incentivos financeiros para os países em desenvolvimento preservarem suas florestas e investirem no uso de uma “pequena” quantidade de carvão em prol do desenvolvimento sustentável.

Na manhã do dia 13 de novembro, participamos de um evento paralelo, que contou com a participação de representantes de povos indígenas, Juan Carlos e Roberto, que vivem na Floresta Amazônica; e de negociadores do Canadá, Suíça e Peru, que discutiram sobre o REDD+. No dia seguinte, tivemos outra reunião com Camila Cunha Moreno, ambientalista que representa a Carta de Belém, uma instituição brasileira que contempla uma gama de ONGs em favor dos indígenas e de pessoas que vivem em comunidades tradicionais. Ela nos apresentou uma visão muito crítica e preocupante sobre a proposta de REDD+, a qual explicaremos mais adiante.

No primeiro encontro, os dois delegados latino-americanos expressaram sua preocupação com a situação complexa e perigosa, que vem piorando, e que pode ter implicações dramáticas para os indígenas, uma vez que muitos podem ser forçados a mudar radicalmente seu estilo de vida. A proposta expressa pelos representantes indígenas inclui: a elaboração de um “Primeiro Plano de Vida Plena” para todos os povos e territórios envolvidos, com o objetivo de melhorar seu modo de vida; a defesa do território como condição necessária e imediata; a salvaguarda dos 24 ecossistemas da floresta; a redução de fundos públicos voltados para o setor financeiro privado; a redução efetiva de gases de efeito estufa para evitar uma falta de responsabilidade no mercado de créditos de carbono.

O indígena Roberto sublinha que o mecanismo de REDD+ é uma política mundial proposta principalmente pelos países industrializados que pretendem utilizar a Floresta Amazônica como um sumidouro de carbono em troca de uma compensação financeira aos estados possuidores dessas florestas. Roberto também especifica que a principal ameaça ambiental nas terras andinas é a presença de “Piratas do carbono e que os estados não estão assumindo o controle deste mercado”. Os indigenas pretendem transformar esta ameaça em uma oportunidade de introdução da questão sobre a preservação da Floresta Amazônica na agenda da ONU.

Os delegados indígenas querem ter uma representação oficial no processo de negociação na COP20, que será em Lima (Peru). Eles pretendem fazer valer sua posição e esperam que: “haja um plano de ação concreto, em vez de palavras voando para esfriar o planeta e resolver o problema das emissões de carbono”. Roberto diz confiante: “nós poderemos realmente fazer a diferença em Lima”.

Neste momento, para resumir as duas horas de conversa com Camila, podemos dizer que o sistema capitalista está tentando transformar recursos naturais, tais como o ar, em um mercado, o chamado “mercado verde”, especialmente após a crise financeira de 2008. “O sistema quer expandir sua atuação e, pela lógica pela qual o REDD+ está sendo negociado, haverá a possibilidade de serem vendidas horas de polinização de abelhas!”.

Ela explica que a compra de créditos de carbono, ou dos créditos de REDD+, pela lógica do “offset”, permite às empresas poluirem em uma área e deixarem o custo da poluição e devastação para as comunidades locais, com o argumento de que estão compensando suas emissões de carbono através da compra de créditos em algum lugar distante. “As florestas tropicais, que são as últimas áreas naturais públicas restantes no mundo, estão sendo vendidas para empresas que querem utilizar madeira, a fim de produzir biodiesel e biomassa, além de explorar os minerais do solo.”

Outro ponto é que, dependendo de como o REDD+ for definido pode-se por em risco o conhecimento dos povos das florestas e das comunidades tradicionais, bem como a diversidade de saberes. Esse tipo de conhecimento não é considerado pelos negociadores como um tipo de tecnologia; mesmo sabendo que a maioria de nós não é capaz de sobreviver por um só dia nas florestas tropicais; ou de encontrar medicamentos nesse complexo ecossistema; nem mesmo sabemos como conseguir comida sem ser indo a um mercado. Assim, esses povos também têm o direito de viver da maneira que desejam, têm o direito de simplesmente viver, sem fazerem parte de qualquer mercado.

Camila diz que o discurso sobre REDD+ é bonito, mas que quando verificamos seus detalhes, podemos obter resultados muito ruins, especialmente se a sociedade civil e os governos não intervirem na forma como muitos pretendem definir esta proposta. Outro ponto perigoso é o conceito de floresta considerado pelo plano, onde estão inclusas monoculturas de eucalipto transgênico com o uso de produtos químicos perigosos. “E muitos dos países em desenvolvimento já possuem grandes áreas de biodiversidade devastada por essas plantações, cujo o objetivo é produzir biodiesel e biomassa, considerados energia sustentável, por ser renovável. Essas plantações expulsam as populações tradicionais das terras, assim como seus milhares de anos de conhecimento acumulado”.

Para repetir a metáfora usada pelo embaixador Marcondes de Carvalho usada em uma das reuniões com a delegação brasileira: “A dificuldade mora nos detalhes”. Por isso devemos procurar a informação oficial, mas também as críticas, antes de construirmos nosso ponto de vista ou propagarmos um discurso. É preciso ainda buscar que o REDD+ seja implantado de maneira mais justa, o que o Brasil e outras associações civis estão tentando fazer. A briga é dura!

* Carlotta Dolzani, Sara Cattani e Emilia Merlinisão do Observatório SOStenibile e participam da cobertura especial da Agência Jovem de Notícias projeto encabeçado pela ONG Viração Educomunicação, que pretende levar propostas da juventude para serem contempladas pelos negociadores brasileiros durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP19).

** Para acompanhar a cobertura jovem da COP19 acesse também:  www.agenciajovem.org e www.redmasvos.org. Os conteúdos serão produzidos em português, espanhol e italiano.