COP19 - Os caminhos da Conferência do Clima

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Varsóvia, Polônia – Estes dias em Varsóvia foram realmente intensos. Acompanhar uma Conferência do Clima não é tarefa fácil. Para dar conta das rodadas de negociações, reuniões, conferências de imprensa, e tudo mais, a gente chega a ficar o dia inteiro sem comer, sem dormir, mas totalmente conectado com esse mundo das negociações internacionais. Pode parecer cansativo, mas é gratificante fazer parte desse processo depois do tanto que trabalhamos para chegar até aqui. Por isso, gostaria de praticamente encerrar a minha participação na COP19 (A Conferências da ONU sobre Mudanças Climáticas que acontece em Varsóvia, Polônia, de 11 a 22 de novembro) relatando como foi o nosso processo ante, durante e o que queremos para depois.

Pré-COP

Após elaborarmos um processo de capacitação em diferentes cidades do Brasil de forma independente e consultar os presentes sobre qual deveria ser o posicionamento trazido por aqueles que tivessem a oportunidade de vir à COP19, buscamos garantir a vinda de jovens brasileiros através de diferentes organizações a Varsóvia – com altíssimo custo entre passagem, hospedagem e alimentação – de diversas formas. Sem experiência com captação de recursos, conseguimos viabilizar nossa vinda através de organizações que já éramos parte (Viração Educomunicação, Plant for the Planet, Fundação Luterana, YMCA, entre outras), de uma campanha de financiamento coletivo (crowdfunding) realizada pelo Engajamundo, patrocínio de instituições estrangeiras e demais tentativas. Pessoalmente, apliquei para o projeto Adopt a Negotiator, da ONG Global Call for Climate Action, e fui selecionada entre 1300 candidatos – junto a outros 11 jovens de diferentes países e regiões do mundo – garantindo minha presença em Varsóvia.

O Chefe da Delegação Brasileira, Embaixador José Marcondes, se mostrou desde o início aberto a feedbacks e opiniões por parte da sociedade civil, e, conforme propõe o nome do projeto, considero que consegui adotar um negociador aqui na COP19. Buscamos uma aproximação com os negociadores desde a nossa participação na reunião pré-COP organizada pelo Itamaraty, em Brasília, e tentamos desenvolver um bom relacionamento com a Delegação Oficial, no intuito de influenciar de forma positiva o posicionamento do Brasil na COP19. O governo brasileiro tem também, a partir de agora, o dever adotar a juventude brasileira!

Atuação em Varsóvia

Apesar das baixíssimas expectativas em relação ao encontro anual da UNFCCC (Convenção Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas), chegamos à Conferência com nossos objetivos claros: nos articularmos junto à juventude brasileira e latinoamericana aqui presente para influenciar a agenda do governo brasileiro e garantir que a voz dos jovens de países em desenvolvimento (chamados de Global South dentro da YOUNGO, coalização de juventude da UNFCCC) fosse levada em consideração nos posicionamentos da juventude global. A produção de conteúdos em português – já que praticamente tudo é escrito em inglês – para informar a juventude e a sociedade civil como um todo no Brasil sobre o que está rolando aqui na COP, também estava entre nossos objetivos.

Já na reta final da COP19, faltando apenas três dias para o fim das negociações, a Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira veio garantir a demonstração do devido apoio do governo brasileiro à pauta das mudanças climáticas. Durante toda a primeira semana, buscamos uma aproximação com os negociadores, que já estavam se mostrando abertos e dispostos a ouvir a juventude e a sociedade civil como um todo. No início da segunda semana, durante o briefing da Ministra do Meio Ambiente, chegou a hora de mostrarmos que não estamos aqui para brincar e começamos a elaborar uma carta de posicionamento a ser entregue a ela.

Nosso delegado Iago Hairon pediu a palavra e fez referência à frase da ministra durante sua introdução de que nós fazíamos “parte da plataforma do MMA aqui na Conferência”. Ao dizer que viemos de forma independente e que ficamos contentes em saber que esta plataforma existe e que podemos contar com o apoio do Ministério daqui para frente. O baiano foi aplaudido por todos os presentes ao soltar a frase de efeito “um mosquito sozinho não tira um rinoceronte do lugar, mas vários mosquitos juntos conseguem mudar o caminho de um rinoceronte. Nós somos os mosquitos e estamos aqui para mudar a direção deste rinoceronte!”. Deste momento em diante, a Delegação Jovem do Brasil foi reverenciada algumas vezes, sendo aplaudida novamente a pedidos do Embaixador Marcondes.

Apesar de as questões relacionadas a mudanças climáticas nacional e internacionalmente serem muitas, pontuamos na carta algumas das mais importantes para nós. A questão das consultas à sociedade civil – uma das propostas do Brasil nesta COP – e a importância de que este processo seja efetivo, transparente, amplo e inclusivo, contemplando a sociodiversidade brasileira, tal como os povos indígenas, comunidades tradicionais, quilombolas, juventude e crianças. Outro ponto levantado foi o necessário avanço em mitigação e compromisso com metas obrigatórias, além da incorporação do mecanismo de loss and damage (perdas e danos) em toda a discussão de adaptação, a qual deve, por sua vez, ser fortalecida. Pontuamos também os anseios dos povos indígenas, especialmente em relação à proteção de suas terras, e nossa posição contrária ao uso de mecanismos econômicos como solução para o problema da exploração indevida de nossas florestas e biodiversidade. O Brasil está entre os cinco maiores emissores do mundo e investimentos em projetos como o Pré Sal, entre outros nos setores de agricultura, indústria e energia, vão totalmente contra a necessária política de combate à mudança do clima, por isso, é urgente que o governo promova a consistência interna entre suas políticas de desenvolvimento e os desafios das mudanças climáticas tanto no âmbito da política energética como da agropecuária, defendendo pequenos agricultores, agricultura familiar e a agroecologia. O aumento de 28% da taxa de desmatamento no último ano, ressaltando que esse crescimento se deu após a aprovação do novo Código Florestal, sinaliza, mais uma vez, para a necessidade urgente de coerência entre o que é preciso fazer para combater as mudanças climáticas e os rumos das políticas e dos investimentos domésticos.

Possíveis consequências

Além do apoio demonstrado pela própria ministra à juventude para as próximas COPs, a parlamentar Vanessa Grazziotin propôs a aprovação de um projeto para a viabilização da presença de jovens nestes espaços e foi condecorada pelo Embaixador Marcondes, que garantiu sua contribuição efetiva para assegurar a existência de tal projeto. Sim, isto é motivo para celebração, mas estamos ansiosos para ver estas promessas serem cumpridas de forma integral e, para isso, entregamos à ministra hoje a carta com o posicionamento apresentado anteriormente, e fomos convidados a uma reunião em seu gabinete ao retornarmos ao Brasil.

A partir do nosso processo de capacitação, da articulação que fizemos entre a juventude brasileira antes de vir para Varsóvia, e de nossa presença “agitando” a Conferência – nas palavras do próprio Embaixador – o governo tem demonstrado uma maior inclinação a nos apoiar dentro das conferências de clima. O contato estabelecido entre os jovens presentes nesta COP e o Conselho de Juventude e com a recém nomeada Assessora de Juventude do MMA também apontam para uma maior abertura que, a partir da determinação e perseverança dos jovens aqui presentes em fazer nossas demandas sejam levadas em conta, pode significar uma boa oportunidade de aproximação com o governo brasileiro. Esperamos que toda a experiência vivenciada pelos jovens brasileiros aqui na COP19 sirva de inspiração para a nossa juventude que deseja se engajar nestes processos e ansiamos pelo prometido apoio do governo para nossa participação nas próximas conferências do clima.

Confira aqui a carta que entregamos à ministra.

* Raquel Rosenberg é repórter da Agência Jovem de Notícias, projeto encabeçado pela ONG Viração Educomunicação.