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Desmatamento e prostituição infantil nas florestas das Ilhas Salomão

Maddlyn Maelofa (à direita) e meninas da aldeia de Huahai, nas Ilhas Salomão. Foto: Catherine Wilson/IPS
Maddlyn Maelofa (à direita) e meninas da aldeia de Huahai, nas Ilhas Salomão. Foto: Catherine Wilson/IPS

 

Auki, Ilhas Salomão, 5/12/2013 – O desmatamento é a principal indústria das Ilhas Salomão, um arquipélago localizado no Pacífico sul, com 80% de sua área coberta por florestas tropicais. Embora a madeira represente 60% de seus ganhos a título de exportação, a maioria das comunidades locais não vê os benefícios.

E quando os custos sociais para quem vive nas proximidades dos locais destinados ao corte incluem maior desigualdade, mais alcoolismo, debilidade da governança tradicional e violação dos direitos humanos, como a exploração sexual infantil com fins comerciais, há motivos para que os habitantes da ilha afirmem que suas vidas estão piorando.

Atualmente, sete madeireiras da Malásia operam perto de Huahai, aldeia de 500 moradores na região rural de Arekwa, na ilha de Malaita, na província de mesmo nome. Mas a comunidade já está farta do desmatamento, que a cercou durante uma década e que a cada ano atrai novos operadores. “As empresas estão se beneficiando, mas estão destruindo os recursos de nossa comunidade”, disse à IPS, em Huahai, Maddlyn Maelofa, a líder da União de Mães para a região de Arekwa.

Porém, sua principal preocupação é o destino dos meninos e meninas da aldeia. Os cortadores “convidam meninas de 13 e 14 anos para seus acampamentos. Às vezes, eles dizem que vão passar filmes, mas nós não sabemos o que acontece”, contou Maelofa. Ela sabe que há pelo menos dez meninas envolvidas, e muitas delas engravidaram. “Também vi uma mulher levar sua filha adolescente até um barco de cortadores. A embarcação chegou para recolher as toras e a mulher foi vender (prostituir) sua filha”, afirmou.

Nas províncias de Makira, Isabel, Ocidental e Malaita, quatro das nove que integram as Ilhas Salomão, foram identificados casos de exploração sexual de menores por parte de cortadores de árvores estrangeiros. Em 2007, o Centro de Cuidados Cristãos da Igreja da Melanésia na capital, Honiara, divulgou um informe sobre assunto na província de Makira.

Com base em um estudo de 12 aldeias e 41 entrevistas individuais, o Centro documentou os casos de 73 meninas e meninos que haviam sofrido exploração sexual, e os de 12 meninas vendidas em casamento para trabalhadores migrantes do setor de corte de árvores. Metade delas tinha menos de 15 anos. A prostituição infantil prevalecia em cada comunidade com vítimas de 11 a 19 anos de idade, e as meninas ou suas famílias recebiam recompensas em dinheiro ou mercadorias.

Um porta-voz do Conselho de Mulheres de Malaita destacou que uma consequência trágica é o aumento de adolescentes grávidas e uma geração cada vez maior de crianças sem pai. Muitas famílias não podem se dar o luxo de manter os filhos ilegítimos – acrescentou – especialmente quando os cortadores voltam aos seus países de origem deixando para trás as meninas que fecundaram.

Na década de 1990, as empresas internacionais dedicadas ao corte de madeira obtiveram numerosas concessões no país, enquanto um conflito civil que duraria cinco anos (1998-2003) gerava instabilidade política. A extração de madeira, dominada por empresas do sudeste asiático, logo chegou a níveis insustentáveis, diante da enorme demanda de recursos naturais gerada com o rápido desenvolvimento das economias asiáticas.

A corrupção, os limitados recursos do governo para controle das operações de corte e uma escassa presença policial em áreas rurais afastadas das Ilhas Salomão contribuíram com a impunidade corporativa. As penúrias socioeconômicas e a falta de educação em comunidades insulares isoladas, onde 23% da população vive abaixo da linha de pobreza, também são fatores na exploração.

Segundo o informe do Centro de Cuidados Cristãos, “os cortadores estrangeiros apresentaram uma oportunidade para que os jovens tivessem acesso a dinheiro e produtos que normalmente estariam fora de seu alcance”. Além disso, o estudo concluiu que, para as famílias, a perspectiva de receber dinheiro também determinava que os pais não impedissem a exploração.

Entre outros problemas sociais figuram os casamentos precoces e a prática de exigir dote, que implica entregar dinheiro ou bens à família de uma menina prometida em casamento. Estima-se que neste país 3% das meninas e dos meninos se casam com a idade legal de 15 anos, e 22% aos 18 anos.

Aaron Olofia, presidente do Subcomitê de Proteção à Infância do Ministério da Saúde em Honiara, disse à IPS que foi criado um Grupo de Trabalho Contra a Exploração Comercial e Sexual de Crianças (Tacsec), para responder às recomendações do relatório. Entre outras coisas, o estudo propôs gerar maior conscientização entre as comunidades, empoderar pais e filhos, criar serviços de apoio local mais efetivos e consultas com as empresas madeireiras.

“Nos comprometemos com as comunidades e os acampamentos de cortadores”, pontuou Olofia. “As comunidades concordaram em criar pequenos grupos de trabalho integrados por chefes e líderes religiosos para explorar a melhor maneira de abordar o problema”, acrescentou.

O grupo de trabalho contatou várias empresas que posteriormente introduziram sanções para os trabalhadores que participassem da exploração infantil. As medidas incluíam multa de US$ 10 mil e regresso forçado ao país de origem. Contudo, por falta de financiamento o Tacsec não pôde implementar os castigos previstos. As leis existentes nas Ilhas Salomão proíbem “deflorar” meninas menores de 13 anos e atrair adolescentes menores de 15 para a prostituição.

Uma avaliação do código penal para os crimes sexuais, realizada este ano pela Comissão de Reforma Legal, recomenda incluir também como infrações induzir menino ou menina a participar da exploração sexual comercial e receber um benefício gerado a partir da prostituição ou exploração infantil. Além disso, propõe castigos a pais, mães ou tutores que permitirem que isso aconteça.

Longden Manedika, diretor do não governamental Fundo de Desenvolvimento das Ilhas Salomão, também acredita que é preciso dar a mulheres e meninas papéis mais significativos e poderosos na tomada de decisões nas aldeias e no desenvolvimento rural. O Conselho de Mulheres de Malaita promove a criação de normas comunitárias para proteger os direitos humanos nesse âmbito, antes que as empresas madeireiras ingressem em uma área, bem como a melhora da alfabetização nas aldeias e a tomada de consciência sobre a exploração infantil nas escolas locais.

Os moradores da aldeia de Hauhai também exploraram alternativas econômicas sustentáveis para a extração de madeira. Quase três quartos das pessoas que vivem ali são empregados por firmas locais da indústria do coco. “Elaboramos óleo de coco e o exportamos”, explicou Maelofa. “Os donos da fábrica o vendem, mas quem cultiva os cocos também se beneficia, porque vendem seu fruto para a fábrica”, acrescentou.

Agora a comunidade não vê motivos para continuar o corte de árvores em sua área. “No ano passado, uma empresa tentou operar aqui e eles (os chefes) não permitiram, e a empresa foi embora. Agora nossos chefes não permitem o corte de madeira aqui”, destacou Maelofa. Envolverde/IPS