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Fukushima não assusta a Índia

Nova Délhi, Índia, 2/5/2011 – A tragédia de Fukushima, no Japão, não fez a Índia desistir de construir o maior complexo nuclear do mundo em Jaitapur, na costa ocidental, embora o governo tenha anunciado que imporá um rígido regime de segurança. “O projeto de Jaitapur será implementado em etapas, e a primeira incluirá dois reatores de 1.650 megawatts”, diz uma declaração oficial divulgada após uma reunião de alto nível realizada na semana passada com a participação do primeiro-ministro, Manmohan Singh. Será feita uma avaliação de impacto ambiental dos reatores, que serão importados da França, antes de começarem as operações em 2019, acrescenta o comunicado.

Inicialmente, estava previsto que o projeto no Estado de Maharashtra contaria até 2018 com seis reatores de 1.650 megawatts (MW), fornecidos pela companhia francesa Areva. A iniciativa não sairia por menos de US$ 12 bilhões. A mesma empresa também fornecerá o urânio para que possam funcionar. Cada reator terá seu próprio sistema de segurança independente e serão operados e passarão por manutenção em separado, informou o ministro do Meio Ambiente, Jairam Ramesh, após a reunião do dia 26 de abril. “Em Fukushima houve uma falha em cadeia dos reatores e é isto o que preocupa as pessoas em relação a Jaitapur”, afirmou.

O governo também anunciou que aprovará uma lei para criar a Autoridade Reguladora Nuclear autônoma que substituirá a Junta Reguladora de Energia Atômica, muito criticada por sua falta de independência em relação ao poderoso e hermético Departamento de Energia Atômica. “É muito bom”, afirmou A. Gopalakrishnan, cientista e ex-presidente da Junta Reguladora, que há anos realiza uma cruzada contra o funcionamento secreto desse órgão.

Gopalakrishnan disse à IPS que espera que a lei “proporcione a transparência e a responsabilidade suficientes, pois é a melhor maneira de prevenir algo como o ocorrido em Fukushima”. Vários “incidentes” na Índia foram abafados apenas porque o setor nuclear civil está incluído na Lei de Segredos Oficiais, que remonta à época colonial, explicou o cientista. O comunicado oficial também diz que se buscará assistência com a Equipe de Revisão de Segurança Operacional da Associação Internacional de Energia Atômica e que “será usada a melhor perícia disponível para garantir os mais altos níveis de segurança”.

O governo informou que em breve anunciará novos pacotes para compensar as pessoas afetadas pela expropriação de terras para instalação do parque nuclear, em resposta aos protestos na região de Jaitapur, lançada por organizações defensoras de agricultores e pescadores. “O governo de Maharastrha e a Corporação de Energia Nuclear da Índia Limitada negociam um generoso pacote de compensação que logo será divulgado”, diz a nota oficial.

Os enfrentamentos entre manifestantes e policiais, há cerca de 10 dias, deixaram um morto e 20 feridos. O direitista partido regional Shiv Sena também declarou que não deixará que nenhum parque nuclear seja instalado em Maharastrha. Cidadãos ilustres enviaram, em março, uma petição ao primeiro-ministro pedindo uma revisão independente da segurança das instalações nucleares da Índia e uma moratória sobre futuras atividades atômicas.

Entre os signatários estão o ex-chefe da Marinha da Índia, Lakshminarayan Ramdas; o ex-vice-reitor da Universidade de Delhi, Deepak Nayyar; os historiadores Mushirul Hasan, Romilda Thapar e Ramachandra Guha; os economistas Amit Bhaduri e Jean Dreze, além de escritores, como Arundhati Roy e Nayantara Sehgal. A geração centralizada de energia nuclear fomentou o hermetismo e levou ao surgimento de uma “elite de tecnocratas irresponsáveis, não democráticos e com interesses criados”, afirmou Ramdas.

O governo reiterou seu plano de quadruplicar a produção de energia nuclear, passando dos atuais 4.650 MW para 20 mil MW até 2020, argumentando que o país tem uma enorme necessidade e que é uma importante fonte alternativa limpa. Os 20 reatores existentes são pequenos, de construção local e baixa produção, e representam menos de 3% da matriz energética.

Esta situação é atribuída ao embargo a materiais e tecnologia que pesa sobre a Índia, por explorar de forma clandestina um dispositivo nuclear em 1974. No entanto, tudo mudou depois que as nações do Grupo de Fornecedores Nucleares (GSN) ofereceram uma isenção especial e específica para este país, não signatário do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, para reiniciar o comércio internacional de material nuclear. A decisão seguiu o histórico Acordo de Cooperação Nuclear Civil Índia-Estados Unidos, de 2008.

Gopalakrishnan é favorável ao “avanço necessário” para expandir a energia nuclear, mas se coloca contra o projeto de Jaitapur porque está baseado em considerações políticas que não consideram questões de segurança a respeito dos Reatores Pressurizados Evolutivos (RPE) da Areva, não testados. O primeiro reator RPE, em construção em Oliluoto, na Finlândia, está envolvido em um litígio por questões de segurança. Algo semelhante acontece com o segundo, fabricado em Flamanville, na região francesa da Normandia, que chegou a colocar em risco o futuro da Areva. “O acordo com a Areva foi uma troca pelo apoio da França à isenção especial que o GSN deu à Índia”, afirmou o cientista. Envolverde/IPS