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Jovens cubanas emigram com sua futura descendência

Duas jovens mães cubanas passeiam com seus filhos por uma avenida de Havana. Foto: Jorge Luis Baños/IPS
Duas jovens mães cubanas passeiam com seus filhos por uma avenida de Havana. Foto: Jorge Luis Baños/IPS

 

Havana, Cuba, 13/2/2014 – Depois de visitar por duas vezes seu pai e seu irmão nos Estados Unidos, graças ao passaporte espanhol que obteve em 2009, a cubana Sissy Ramos decidiu unir-se a eles definitivamente, embora com isso continue adiando seu desejo de ser mãe. Ser mulher e jovem são duas características da atual emigração cubana, o que deixa este país caribenho, de quase 11,2 milhões de habitantes, com uma população cada vez mais envelhecida e que perde parte de suas gerações de substituição.

Antes de tomar o avião para as Ilhas Cayman e depois para os Estados Unidos, onde a Lei de Ajuste facilita, desde 1961, a residência de cubanos que chegam ao seu território, esta engenheira programadora de 27 anos abraçou sua mãe e seu noivo com a esperança de reencontrá-lo brevemente. “Viajo antes para ir economizando até que apareça a via para ele também sair. Queríamos casar e ter filhos depois de formados, mas sem casa própria e com salários de 365 pesos (US$ 13) mensais, que não permitem nos manter, é preferível que nasçam em outro país”, explicou Sissy à IPS, dias antes de sua partida.

Apesar de o Decreto Lei 302, de janeiro de 2013, que revogou as restrições governamentais para a saída do país ou retorno logo após ter perdido a residência, Sissy sente que, com esse passo, perderá suas raízes. “Aqui nasci, me criei, tenho amizades e estão minha mãe e meu padrasto, com mais de 60 anos. Não queria ir, mas para ter um futuro melhor e garantir o da minha descendência não posso ficar em Cuba”, afirmou. “Lá penso em trabalhar no desenvolvimento de programas de computador, que é bem pago e tem demanda. Assim, pouco a pouco poderei levar o restante da família”, acrescentou.

Emigrar é uma aspiração frequente entre mulheres jovens devido à crise econômica permanente que se vive em Cuba desde a década de 1990, quando acabou o bloco socialista da Europa do Leste, do qual o país dependia. Como no resto do Sul em desenvolvimento, a emigração cubana é cada vez mais feminina. Em 2012, das 46.662 pessoas que partiram, 52% eram mulheres, a cifra mais alta depois das 60 mil que partiram em 1980, quando foi aberto para este fim o porto de Mariel, produto de tensões migratórias entre Cuba e Estados Unidos.

Por outro lado, o grupos etário com mais emigrantes vão de 20 a 40 anos, uma tendência que se mantém, segundo Antonio Aja, diretor do Centro de Estudos Demográficos da Universidade de Havana. Bolsas acadêmicas, contratos de trabalho, casamento com estrangeiro, reunificação familiar ou visitas pessoais das quais não se regressa são algumas das vias utilizadas para ir viver no exterior. Atualmente, 44,9% das famílias cubanas têm a mulher como chefe, por serem as que mais contribuem para as despesas, mesmo tendo companheiros.

A isso se soma que as mulheres representam 64% dos profissionais universitários, pontuou à IPS a socióloga Marta Núñez. “A maioria prefere emigrar sozinha e representam a principal fonte de renda para si e suas famílias, às quais sempre enviam dinheiro”, destacou esta professora da Universidade de Havana, entre os resultados de uma pesquisa sobre a migração de 2009.

“Não quero me complicar com companheiro ou que minha avó de 85 anos fique doente e eu tenha que ficar. Parto para dois anos de mestrado no México e, se quando terminar ainda não puder viver da minha profissão em Cuba, cruzarei a fronteira para os Estados Unidos”, revelou à IPS uma jornalista de 27 anos que pediu para não ser identificada.

Embora se trate de uma tendência mundial, a saída das mulheres em idade fértil é sentida de outro modo nesta ilha com saldo migratório negativo desde 1960, que influi na queda da população, junto com a baixa natalidade e o aumento da expectativa de vida. Durante os últimos cinco anos emigraram cerca de 39 mil pessoas por ano, a maior média desde os primeiros anos da Revolução, iniciada em 1959. Os motivos da grande emigração vão desde a busca de uma melhoria econômica e vital, com novos espaços trabalhistas e rendas, até a reunificação familiar, detalhou Antonio.

Também se nutre da rejeição à forma de vida imposta pelo sistema comunista cubano. “Chamar o emigrante cubano de caso político é incorreto, mas tampouco é puramente econômico”, disse o especialista em migrações. Segundo Antonio, “os cubanos carregam uma história de mobilidade fora da fronteira muito importante e essa mentalidade faz com que – diante da crise – as pessoas decidam partir”.

Há nascidos em Cuba em mais de 150 países, a maioria nos Estados Unidos, onde o último censo populacional registrou cerca de 1,8 milhão de pessoas originárias de Cuba, 50,8% mulheres. Em termos absolutos, Cuba só representa 3,4% do total de emigrantes da América Latina, mas sua diáspora chama a atenção “para a densidade populacional do país”, destacou Antonio. “E sua dinâmica demográfica é um desafio” nacional, acrescentou.

As emigrantes cubanas se caracterizam por planejar a maternidade “uma vez inseridas nas sociedades de consumo”, afirmou a demógrafa Gretel Marrero em um artigo publicado no anuário de 2011 do Centro de Estudos de Migrações Internacionais da Universidade de Havana. Seria preciso tomar medidas para favorecer o interesse de mulheres e homens jovens em projetar seu futuro e sua descendência em Cuba, disseram à IPS várias fontes consultadas.

É o que faz Yaimé Alberdi, uma contadora de 23 anos que quer formar sua família em Cuba. “Não tenho em mente a maternidade até os 30, mas gostaria que fosse onde nasci, sem tanta violência e que minha família possa me ajudar”, afirmou. Ela aproveitará as novas regulamentações migratórias para visitar este ano uma tia que vive no México desde 2005 e, talvez, trabalhar para trazer algum dinheiro, mas até agora seus planos incluem o retorno.

Nos dez primeiros meses de 2013, após entrar em vigor a reforma migratória, viajaram para o exterior 184.787 pessoas. Das 66.510 que foram para os Estados Unidos, 60% ainda não regressaram, segundo declarou à revista CubaHoy, Lamberto Fraga, da Direção de Imigração e Estrangeiros.

População em números

18,3% dos habitantes têm 60 anos ou mais, um ponto percentual maior do que o segmento abaixo de 14 anos. Em 2012, nasceram 11,3 pessoas para cada mil habitantes, 1,5 a menos do que em 2011. A fecundidade é a mais baixa da América Latina: menos de dois filhos por mulher. Fonte: Censo de População e Moradia 2012. Envolverde/IPS