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Mudança climática sacode presente e passado em Barbuda

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Biólogo marinho e ambientalista John Mussington e a arqueóloga Sophia Perdikaris. Foto: Desmond Brown/IPS

 

Codrington, Barbuda, 3/7/2014 – A diminuta ilha caribenha de Barbuda, com 1.800 habitantes, adapta-se à mudança climática, que resultou em uma força tão avassaladora que não perturba apenas os vivos, mas também os mortos que ocuparam a área há vários séculos. A arqueóloga norte-americana Sophia Perdikaris disse que, quando o furacão George atingiu a região em 1998, fez muito mais do que concentrar a atenção na faixa costeira que está desaparecendo.

“Comecei a vir a Barbuda porque o furacão expôs muito material arqueológico e tentamos resgatá-lo. Um esqueleto humano de 450 anos depois de Cristo ficou exposto na área chamada Seaview”, contou Perdikaris à IPS. “De fato, parte do material arqueológico, que agora temos no novo museu, foi escavado pelo furacão George”, acrescentou.

Perdikaris, professora de antropologia no Brooklyn College, da Universidade de Nova York, explicou que os achados procedentes de Barbuda refletem as alterações nas condições climáticas quando no norte da Europa se vivia a época da Pequena Idade do Gelo. “Estão aparecendo em Barbuda achados semelhantes a histórias contadas na Groenlândia, Islândia e na costa norte da África”, afirmou a arqueóloga. “Portanto, esta não é apenas uma pequena ilha do Caribe, mas uma parte importante de eventos climáticos maiores dos dois lados do Atlântico”, acrescentou.

Segundo Perdikaris, uma das coisas que a população local enfrenta é “uma grande palavra; mudança climática, o que significa realmente e como afeta a vida das pessoas e o que podem fazer para mudar isso?”. Mas ressaltou que a população local tem capacidade de adaptação. “Encontramos soluções com ajuda da extraordinária experiência da população local porque são os melhores especialistas em seu ambiente”, acrescentou.

“Procuramos reunir informação para saber quais são nossos desafios e como avançamos para conseguir buscar os recursos econômicos e a tecnologia para concretizar” iniciativas, detalhou Perdikaris. “Monitoramos a erosão em muitas partes da ilha e também fazemos análise da água dos poços para saber se é potável ou se mudou a salinidade. Todos estes esforços são para avaliar os três aquíferos que estão sob Barbuda”, afirmou.

Outro projeto desenvolvido na ilha é a aquaponia, combinação de aquicultura e hidroponia (cultivos em soluções minerais em lugar da terra), no contexto do reconhecimento de que a mudança climática provavelmente colocará em risco a segurança alimentar de Barbuda.

“Os recursos marinhos diminuem. É um problema cultivar quando há seca ou se existe apenas água salobra para regá-los, por isso desenvolvemos infraestrutura para a aquaponia”, disse a especialista. Perdikaris afirmou que a mudança climática obrigou a população local a fazer alguns ajustes em sua forma de vida e tomar medidas para garantir seu futuro.

“Na medida em que as geleiras derretem devido às altas temperaturas, o que afeta o resto é o aumento do nível do mar, o que acarreta várias consequências”, explicou Perdikaris. “Em uma ilha baixa como Barbuda, uma de nossas principais preocupações é qual superfície da ilha e com qual rapidez ficará sob a água. Quando o nível do mar sobe, as águas não avançam apenas sobre a terra, mas também sobre os arrecifes de coral”, afirmou.

O biólogo marinho e ambientalista John Mussington disse que o alerta dos cientistas a respeito de a ilha de 161 quilômetros quadrados ser um dos lugares mais vulneráveis pelas consequências da mudança climática, não é ignorado. “Barbuda é plana. O ponto mais alto pouco passa de 30 metros. Agora, com a mudança climática, as previsões falam que o mar sobe vários metros. Quando se observa a topografia atual desta ilha, se vê que um terço é de lagoas e mangues”, afirmou.

“Outro terço é o que denominamos terras baixas. Uma das coisas que certamente acontecerá devido à mudança climática é que o terço de mangues será tragado pelas terras baixas e restarão dois terços de mangues”, disse Mussington à IPS. “Então, nos restarão pouco mais de 54 quilômetros quadrados de terras úteis. Essa é a realidade que enfrentamos”, ressaltou.

A cultura de Barbuda se sustenta sobre “o conceito de viver da terra”, o que, segundo o especialista, rapidamente se converte em algo do passado com o avanço da mudança climática. “Queremos manter o fato de que a tradição de Barbuda é que as pessoas vivam da terra, e uma das coisas que enfrentaremos em termos dos desafios que apresenta a mudança climática é que já não poderemos fazer isso”, acrescentou Mussington.

“Se quisermos sobreviver, teremos de superar esses desafios, daí a direção que tomamos para poder continuar nos alimentando com o consumo inteligente de proteínas e verduras”, acrescentou. Toda a população é treinada na tecnologia da aquaponia, um sistema de produção de plantas e peixes em um ambiente simbiótico.

“Em 2012 sonhamos em ajudar Barbuda garantindo que podemos manter nossa fonte de proteínas em forma de pescado, bem como produzir verduras, apesar do que acontecer e do que está ocorrendo com a mudança climática. Com a tecnologia da aquaponia, da qual somos pioneiros, temos em nossos tanques 4.500 tilápias”, afirmou.

Mussington insistiu que “devemos encontrar soluções para continuar vivendo da ilha. Por isso a aquaponia se mostrou ser uma das coisas que promovemos porque o resultado final da mudança climática é que nossos arrecifes de coral sofrerão e nossas praias mudarão”. Envolverde/IPS