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Os menores também sofrem com a mudança climática no Caribe

Estudantes da escola primária de Buccament, em São Vicente, recebem presentes de alunos do sexto grau do primário de Green Bay, em Antiga, após as terríveis inundações que afetaram esse país insular, Dominica e Santa Lúcia. Foto: Desmond Brown/IPS
Estudantes da escola primária de Buccament, em São Vicente, recebem presentes de alunos do sexto grau do primário de Green Bay, em Antiga, após as terríveis inundações que afetaram esse país insular, Dominica e Santa Lúcia. Foto: Desmond Brown/IPS

 

Castries, Santa Lúcia, 26/8/2014 – Ao se desenhar as estratégias para lidar com a mudança climática, é comum se esquecer das crianças, apesar de terem menos recursos para se defenderem em situações problemáticas. Segundo David Popo, diretor da Unidade de Política Social da Organização de Estados do Caribe Oriental (Oeco), “é muito comum ao falarmos de reduzir a pobreza não vermos as crianças, são invisíveis em termos de desenvolvimento”.

“Não acontece só em Santa Lúcia, mas em todo o Caribe”, pontuou Popo à IPS. Além disso, mencionou um painel facilitado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que concluiu que a mudança climática tem uma série de consequências negativas para os menores em matéria de educação, redução da pobreza e outras formas de desenvolvimento social.

O projeto Incentivando a Região a Atuar Diante da Mudança Climática (Oeco-RRACC) apoia Santa Lúcia mediante a criação de uma plataforma com o sistema de informação geográfico (SIG), que permitirá mapear a infraestrutura hídrica para melhorar a gestão e os serviços para a população.

“Este instrumento, a plataforma da SIG, além de mapear a infraestrutura da ilha, creio ser muito importante que faça correlações com o que acontece com as pessoas, especialmente as crianças”, afirmou Popo, pois frequentemente não são levados em conta nos planos de mitigação. “Podemos bem imaginar o impacto em termos de educação, saúde e outras consequências no lar, especialmente em áreas e famílias pobres. Se não há água na casa, os pais não poderão mandar os filhos à escola”, ressaltou.

O projeto RRACC é uma iniciativa conjunta da secretaria da Oeco e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid) para ajudar os países caribenhos a lidar com a mudança climática.

Um informe do escritório do Unicef para Barbados e o Caribe oriental, Children and Climate Change in the Small Islands Development States (Sids) of the Eastern Caribbean (Infância e Mudança Climática nos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento – Peid – do Caribe Oriental), diz que a tendência dos últimos 30 anos na região reflete uma mudança significativa no ambiente devido à mudança climática.

O documento prevê que a mudança climática atinja os menores e suas famílias pela perda ou redução da renda devido às consequências deste fenômeno sobre a agricultura, a pesca e o turismo, mas também pelo risco de deslocamento. Metade da população vive a 1,5 quilômetro da costa, devido ao aumento de doenças transmitidas por vetores ou água contaminada, e pela separação familiar devido às migrações propiciadas pelas dificuldades que existem em alguns países.

David Popo, diretor da Unidade de Política Social da Organização de Estados do Caribe Oriental (Oeco). Foto: Desmond Brown/IPS
David Popo, diretor da Unidade de Política Social da Organização de Estados do Caribe Oriental (Oeco). Foto: Desmond Brown/IPS

 

O estudo também menciona a perda de horas de aula devido às emergências durante a época de temporais, o fato de os direitos das crianças não serem contemplados na maioria das políticas e dos planos de emergência, o impacto psicológico do temor contínuo dos desastres naturais e a consequente separação familiar e migração. O Unicef afirmou que os menores, um grupo especialmente vulnerável, suportaram um desproporcional peso dessa carga.

O ministro de Ambiente de Anguila, Jerome Roberts, declarou à IPS que a resposta da região ao desafio que apresenta a mudança climática deve incluir os menores. A história fará seu julgamento, acrescentou. Também alertou que, “se não conseguirmos construir resiliência para nos adaptarmos aos possíveis impactos, corremos o risco de entregar em consignação às futuras gerações de Anguila, e a toda região da Oeco, um desastre irreversível”.

Roberts disse que, “como ministro responsável pela educação e pelo ambiente, seria negligente da minha parte não destacar a necessidade de garantir que Anguila ofereça uma educação de qualidade sobre a mudança climática”. E apontou que “nosso enfoque deve incentivar métodos inovadores que integrem a educação sobre mudança climática nas escolas. Além disso, temos de garantir a melhoria de nossos programas de educação não formal por meio da mídia, das redes sociais e das associações para construir uma consciência pública sobre este fenômeno”.

Roberts acrescentou que por ser uma ilha pequena Anguila é muito suscetível aos possíveis impactos da mudança climática, como secas e inundações devido à elevação do nível do mar, entre outros. “Estamos conscientes de que a ameaça da mudança climática é séria, é urgente e aumenta”, reconheceu o ministro, que elogiou as instituições de ensino que já criaram hortas próprias e suas comunidades, bem como incentivou as que ainda estão em processo de criá-las.

“Sei que estudantes aprenderam sobre a fragilidade de seu ambiente participando dessas iniciativas. De fato, os projetos de conservação permitem que as crianças obtenham conhecimentos de primeira mão sobre a delicada natureza de seu ambiente”, acrescentou Roberts.

Popo, naturalmente, insistiu que a mudança climática não vai desaparecer e que as previsões indicam que suas consequências vão piorar. “Todos conhecemos os últimos eventos climáticos, a seca de 2009, o furacão Tomas de 2010 e, claro, a última tempestade, a da véspera do Natal de 2013, que além de realçar vários de nossos problemas de desenvolvimento, mostrou a necessidade de se construir capacidades, bem como de planejar os efeitos negativos adicionais sobre os recursos de nossa ilha”, ressaltou.

Uma criança de dois anos figura entre a dezena de pessoas mortas quando a tempestade arrasou o Caribe oriental, destruiu cultivos, casas e sustentos em sua passagem por três dos menores países do mundo (São Vicente, Santa Lúcia e Dominica). Um menino de 12 anos também foi arrastado pela corrente e continua desaparecido.

A tempestade despejou mais de 300 milímetros de água em São Vicente em cinco horas, acima da média mensal de chuvas. Isso causou deslizamentos e a cheia de mais de 30 rios e riachos. Centenas de casas foram destruídas. Além disso, arrastou 14 pontes e a ala pediátrica do principal hospital ficou totalmente inundada com água até a cintura.

Sonia Johnny, embaixadora de Santa Lúcia nos Estados Unidos, disse que seu país foi atingido por chuvas torrenciais durante 24 horas, salpicadas por raios e trovões. “Como disse um menino, pensamos que era o fim do mundo. Ninguém em Santa Lúcia havia visto chuvas tão fortes como essas”, destacou. Envolverde/IPS