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Escolas do Curdistão sem alunos e ocupadas por refugiados

Após fugir do Exército Islâmico, Kamal Faris e sua família encontraram abrigo em uma escola de Erbil, capital do Curdistão iraquiano, em setembro deste ano. Foto: Annabell Van den Berghe/IPS
Após fugir do Exército Islâmico, Kamal Faris e sua família encontraram abrigo em uma escola de Erbil, capital do Curdistão iraquiano, em setembro deste ano. Foto: Annabell Van den Berghe/IPS

 

Erbil, Iraque, 15/10/2014 – “Tivemos dez minutos para abandonar nosso povoado”, contou Kamal Faris, de 33 anos, que fugiu com toda sua família de Sareshka para esta capital da região autônoma do Curdistão iraquiano devido ao avanço do grupo extremista Exército Islâmico (EI), que já deixou mais de 1,8 milhão de refugiados. Uma pequena minoria encontrou abrigo temporário com familiares em outras cidades mais seguras, mas a maioria dos refugiados não tem essa opção, e famílias inteiras ficaram sem teto da noite para o dia, entre elas a de Faris.

Aula em uma escola de Erbil, capital do Curdistão iraquiano, transformada em abrigo para refugiados em razão do avanço do Exército Islâmico, em setembro deste ano. Foto: Annabell Van den Berghe/IPS
Aula em uma escola de Erbil, capital do Curdistão iraquiano, transformada em abrigo para refugiados em razão do avanço do Exército Islâmico, em setembro deste ano. Foto: Annabell Van den Berghe/IPS

Após a pior odisseia de sua vida, Faris chegou a Erbil com a esposa, os filhos, sua mãe e um irmão cego. “Éramos dez pessoas. Tivemos que nos apertar em um pequeno automóvel Opel e nos afastarmos o mais rápido possível. Deixamos tudo, todas nossas coisas”, contou, mostrando seus pés com sandálias simples, único calçado que conseguiu pegar.

“As crianças iam, cada uma das três, sentadas no colo de outros, com seus rostos pálidos de medo. Me quebrou por dentro vendo-as assim”, acrescentou Faris. Em circunstâncias normais, o trajeto de carro entre Sareshka e Erbil demora três horas. Mas não há nada de normal nesta área atualmente.

“Estivemos sentados por cinco horas em um automóvel, mortos de calor, todos fugiam. As estradas estavam lotadas e nosso carro não podia ir à velocidade habitual porque tinha muita gente a pé”, recordou Faris. “A cada obstáculo ouvíamos o chassis do motor roçar o asfalto. Mas ninguém se mexia por medo de o carro quebrar por causa do peso”, acrescentou.

Quando chegaram, como foi nas férias de verão, as escolas que costumavam estar cheias de meninos e meninas haviam se convertido em abrigos provisórios para os refugiados. Na escola de Ishtar, onde Faris se alojou com a família, ele e outras pessoas na mesma situação esperavam que fosse uma solução provisória e que logo poderiam retornar às suas casas.

“Pensei que seria temporário, dois ou três dias, no máximo”, lamentou Wazira, esposa de Faris. Mas já passou um mês e continuam ali, com dezenas de outras famílias, lotando as salas de uma escola no centro de Erbil.

Uma escola de Erbil, capital do Curdistão iraquiano, convertida em abrigo para refugiados em razão do avanço do Exército Islâmico, em setembro deste ano. Foto: Annabell Van den Berghe/IPS
Uma escola de Erbil, capital do Curdistão iraquiano, convertida em abrigo para refugiados em razão do avanço do Exército Islâmico, em setembro deste ano. Foto: Annabell Van den Berghe/IPS

Há três semanas deveria ter começado o novo ano escolar, mas as cerca de 700 escolas do Curdistão, transformadas em acampamentos para refugiados, não puderam receber os estudantes. Pensando, como todo mundo, que seria uma situação provisória, o governo iraquiano não encontrou alternativa. Assim, há mais de meio milhão de crianças sem poderem ir à escola.

“Apesar dos esforços das autoridades iraquianas, as crianças que estão morando nas escolas, bem como os que deveriam estar assistindo aulas, não têm acesso à educação”, lamenta Tina Yu, diretora da organização Save the Children no Iraque. Sua principal preocupação é que poderá passar semanas, ou até meses, antes de se resolver o problema.

A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou um comunicado solicitando às suas agências humanitárias que fizessem o possível para ajudar o governo a encontrar um abrigo adequado para as famílias de refugiados, com sorte, antes de começar o inverno boreal. Mas, para as pessoas nessa situação, ficar até o inverno é muito tempo. “Só queremos voltar para casa, o mais rápido possível”, afirmou Wazira. Envolverde/IPS