Sidney, Austrália, 23/1/2015 – A completar este ano o prazo fixado para cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) das Nações Unidas, os países insulares do Pacífico avaliam seus êxitos e fracassos na abordagem de suas metas. As ilhas desse oceano concretizaram enormes avanços em matéria de redução da mortalidade infantil.
Mas a pobreza e a igualdade de gênero são as duas áreas onde há brechas maiores. Apenas dois dos 14 Estados que integram o Fórum das Ilhas do Pacífico (Ilhas Cook e Niue) seguem rumo ao cumprimento dos oito ODM.
Organizações importantes da região consideram que os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos para depois de 2015 pela Organização das Nações Unidas (ONU) têm mais probabilidades de êxito na abordagem dos singulares desafios de desenvolvimento que os pequenos Estados insulares enfrentam. Entretanto, enfatizam que converter esses objetivos em realidade exige a participação dos países industrializados, bem como se concentrar na implantação.
“A principal crítica às Metas do Milênio foi a falta de consultas, o que derivou em uma série de objetivos desenhados principalmente para abordar as prioridades de desenvolvimento da África subsaariana e depois aplicados a todos os países pobres”, pontuou à IPS o diretor-executivo do Instituto de Políticas Públicas do Pacífico (PIPP) em Vanuatu, Derek Brien.
O Oceano Pacífico tropical abriga 22 Estados e territórios insulares diversos, onde no total vivem dez milhões de pessoas. A maioria deles possui populações predominantemente rurais, muito expostas a eventos climáticos extremos e distantes dos principais mercados mundiais. A falta de trabalho é cada vez maior em muitos países, o que impacta especialmente na perspectiva dos jovens, que representam mais da metade da população da região.
Brien acredita que os ambiciosos ODS, que serão acordados formalmente em uma cúpula da ONU a ser realizada em setembro em Nova York, foram elaborados com “insumos muito mais amplos e consultas generalizadas”. “De uma perspectiva do Pacífico, é algo especialmente bem-vindo ver que são propostos novos objetivos sobre mudança climática, oceanos e recursos marinhos, crescimento econômico inclusivo, fomentando sociedades inclusivas pacíficas e criando instituições capazes e receptivas que estejam baseadas no império da lei”, acrescentou.
A maioria dos Estados modernos independente surgiu na região há, relativamente, pouco tempo, nos últimos 45 anos. Daí o PIPP argumentar que o progresso em matéria de desenvolvimento também depende de se continuar criando instituições estatais efetivas e a liderança necessária para a boa governança e a provisão de serviços. Os novos objetivos mundiais, que prometem enfrentar os subornos e a corrupção em geral, além de melhorar os sistemas judiciais, apontam para essas aspirações.
Enquanto 11 Estados insulares do Pacífico ainda têm que conseguir a igualdade de gênero, são bem-vindos os objetivos pós-2015 relativos a eliminar a violência contra mulheres e meninas e os casamentos precoces e forçados, bem como proteger o igual direito das mulheres de possuir e controlar bens.
Por exemplo, em Papua Nova Guiné, a maior ilha do Pacífico, dois terços das famílias são protagonistas de fatos violentos, e até 86% das mulheres sofrem abusos físicos durante a gravidez, segundo a organização Child Fund Australia. As melhorias também enfrentam obstáculos por arraigados estereótipos sobre os papéis femininos na esfera doméstica, bem como pela discriminação trabalhista. Na maioria dos países, o emprego não agrícola das mulheres representa menos de 48%.
Nos próximos anos, o principal desafio para a região será a abordagem das cada vez maiores penúrias econômicas. A desigualdade e a exclusão aumentam nas ilhas do Pacífico, devido a uma série de fatores, entre eles as pressões exercitas sobre os meios tradicionais de subsistência e as redes de seguridade social pela influência da economia monetária mundial, baseada no mercado, afirmou no ano passado o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Segundo o Banco Mundial, mais de 20% dos ilhéus do Pacífico não podem custear suas necessidades básicas, enquanto apenas entre 30% e 50% da população têm emprego em Fiji, Micronésia, Kiribati, Ilhas Marshall, Nauru, Samoa, Tonga e Tuvalu.
Rex Horoi, diretor da Fundação dos Povos do Pacífico Sul, uma organização não governamental com sede em Fiji, concorda que os ODS são relevantes para as necessidades de desenvolvimento das comunidades locais, mas apontou que para cumpri-los será necessário haver pensamento inovador.
Por exemplo, ao considerar o uso sustentável dos ecossistemas terrestres e marinhos, “é preciso biólogos marinhos trabalhando por um lado e depois especialistas em biodiversidade e ambientalistas trabalhando por outro. Não evoluímos quanto a tentar solucionar os problemas humanos com um enfoque integrado de desenvolvimento”, pontuou Horoi.
Ele também pede a elaboração de planos tangíveis de implantação, alinhados com estratégias nacionais de desenvolvimento, para acompanhar todos os objetivos, e associações mais integradas entre governos e outros atores, como a sociedade civil, o setor privado e as comunidades, para torná-los realidade. Ao mesmo tempo, cumprir a agenda ampliada pós-2015 depositará uma considerável pressão sobre os limitados recursos dos pequenos Estados insulares em desenvolvimento.
“Muitos pequenos países insulares se esforçam para cumprir uma multiplicidade de acordos internacionais, compromissos políticos e requisitos de informações adicionais”, destacou Brien. “Há uma necessidade urgente de racionalizar e integrar muitos dos processos paralelos que fixam coletivamente a agenda mundial. A nova agenda deverá fazer precisamente isso, e não somar-se à carga burocrática”, acrescentou.
O PIPP acredita que os países industrializados também devem ser responsáveis pelos novos objetivos. A organização ressaltou que “os numerosos impactos transnacionais dos Estados de alta renda estão se diversificando e inclusive reduzindo as oportunidades de desenvolvimento em países de baixa renda”, por exemplo, não conseguir reduzir as emissões de carbono, a pesca excessiva por parte de frotas estrangeiras e a evasão fiscal em que incorrem multinacionais dedicadas à extração de recursos.
Brien considera que, “retoricamente, estão sendo feitos todos os ruídos corretos nesse sentido” junto à ONU, que promove os ODS como universalmente aplicáveis a todos os países. “Porém, não está claro como isso se traduzirá na implantação. Persiste uma divisão entre ‘em desenvolvimento’ e ‘desenvolvido’ que talvez ainda esteja muito centrada em uma agenda de ajuda mais do que em uma agenda de desenvolvimento”, enfatizou. Envolverde/IPS