Asma, ou bronquite asmática, é uma doença muito comum. A pessoa apresenta crises de reação exagerada, tipo alérgica, com manifestação centrada nas vias aéreas. A diminuição drástica do diâmetro dos brônquios reduz a quantidade de ar que atinge o pulmão, levando à falta de ar e sensação de sufoco e chiado no peito. Em casos mais graves pode levar à morte. Em crianças, é a principal causa médica de incapacidade. Fora das crises, o paciente fica praticamente normal. Seu tratamento é dividido na abordagem das crises e em tratamento de manutenção para o período entre as crises. O tratamento da asma, atualmente, deve ser implementado passo a passo e os corticoides (anti-inflamatórios) administrados por inalação são considerados a primeira escolha.
Esses medicamentos são muito eficazes, desde que a aderência do paciente ao tratamento seja adequada. Hoje foi publicado, na prestigiosa revista médica New England Journal of Medicine, um estudo que poderá trazer novas opções para o cuidado rotineiro de doentes asmáticos. Os pesquisadores ingleses avaliaram a eficácia de novos medicamentos que bloqueiam a reação inflamatória típica da asma e que podem ser tomados pela boca. Sobre essa pesquisa, conversamos com doutor Daniel Deheinzelin, pneumologista do Núcleo Avançado de Tórax do Hospital Sírio-Libanês, e professor livre-docente da USP.
CartaCapital: Quais são os novos medicamentos estudados contra a asma?
Daniel Deheinzelin: Numa pesquisa patrocinada pelo Programa de Avaliação de Tecnologia da Saúde inglês (UK Health Technology Assessment Programme), o doutor D. Price e colaboradores estudaram uma classe de remédios denominada antagonistas do receptor de leucotrienos. Leucotrienos são importantes substâncias mediadoras do processo inflamatório envolvido na asma. Compararam sua eficácia com os tratamentos inalatórios de corticoide rotineiramente utilizados na prática médica.
CC: Esse é o primeiro estudo com os antagonistas do receptor de leucotrienos em asma?
DD: Não. Estudos comparando essas duas classes já haviam sido feitos. Alguns apontaram os corticoides inalatórios como mais eficazes, outros não mostraram diferenças significativas entre os remédios.
CC: Qual é a originalidade do estudo atual?
DD: A grande diferença desse novo estudo é que ele foi feito no “mundo real”. Os pacientes foram incluídos por médicos do serviço de saúde inglês. O paciente era sorteado para receber corticoide inalatório ou antagonista do receptor de lecotrienos. Os pacientes foram seguidos de forma rotineira por médicos durante dois anos. Um tempo de observação bem maior do que a maioria dos estudos prévios. Os cientistas queriam saber se os dois esquemas de tratamento seriam equivalentes, quanto à eficácia. Pelas características do serviço de saúde inglês, foi possível medir a aderência ao tratamento, já que os remédios são fornecidos pelo próprio serviço. Assim foi possível medir a quantidade de remédio efetivamente fornecida a cada paciente e comparar com a quantidade prevista no período do estudo.
CC: Quais foram os principais resultados observados?
DD: Ao fim de dois anos o controle dos sintomas foi semelhante com as duas classes de medicamento. No entanto, a aderência ao tratamento foi muito diferente. Os antagonistas do receptor de leucotrienos, administrados na forma de pílula e tomados uma vez ao dia, tiveram uma aderência adequada por 65% dos pacientes. Os corticoides inalatórios, administrados na forma de spray duas vezes ao dia, foram usados corretamente por somente 41% dos pacientes. Essa diferença, estatisticamente significativa, pode explicar a semelhança da resposta.
CC: Qual seria a mensagem mais importante desse estudo, para a população brasileira?
DD: Mais do que comparar a eficácia, aparentemente semelhante, de duas classes de remédios diferentes em condições muito controladas, esse estudo mostra que no “mundo real” a aderência dos pacientes ao tratamento é baixa, e que pode ser um problema maior em crianças. Ela varia de acordo com a forma como o tratamento é administrado e segue sendo um grande problema de saúde pública. O serviço de saúde inglês está absolutamente correto em patrocinar estudos desse tipo.
*Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.