A HydroAysén é um duopólio que deixa fora do mercado os atores que querem participar com outras fontes de energia, afirma nesta entrevista a especialista Sara Larraín.
Santiago, Chile, 23 de maio de 2011 (Terramérica)..- O projeto hidrelétrico de HidroAysén, na Patagônia do Chile, está causando “uma crise de credibilidade na institucionalidade e na figura do presidente Sebastián Piñera”, disse ao Terramérica a ecologista Sara Larraín. Milhares de chilenos estão mobilizados contra um projeto que fragmentará seis parques nacionais, 11 reservas nacionais, 26 sítios prioritários de conservação, 16 mangues e 32 áreas protegidas privadas, na austral Patagônia e em outras sete regiões, segundo seus críticos.
No dia 9 deste mês, a Comissão de Avaliação Ambiental da região de Aysén aprovou o mega projeto HidroAysén, formado por capitais espanhóis, italianos e chilenos, para construir cinco hidrelétricas que vão gerar, juntas, 2.750 megawatts, transmitidos por uma rede elétrica que atravessará oito regiões. Os protestos se multiplicaram em várias cidades e mobilizaram mais de 30 mil pessoas na capital, que foram duramente reprimidas pela polícia com gás lacrimogêneo e carros lançando jatos de água.
O governo direitista de Piñera apoia o projeto pela necessidade de duplicar a produção de energia nos próximos anos, a fim de manter o crescimento anual do produto interno bruto estimado em 6%. Contudo, apesar da luz verde para o plano, Sara Larraín, detida e maltratada pela polícia por ocasião dos protestos, acredita que “estamos apenas começando a batalha”.
TERRAMÉRICA: Por que a aprovação da HidroAysén causa tanta rejeição?
SARA LARRAÍN: Afeta o coração da Patagônia chilena, com cinco centrais elétricas para gerar 2.700 megawatts e levá-los por uma linha de transmissão de dois mil quilômetros diretamente para Santiago e as mineradoras da região de Atacama.
TERRAMÉRICA: O governo argumenta que a aprovação respeitou a legislação ambiental. Por que você afirma que houve um processo irregular?
SL: No processo de avaliação ambiental da HidroAysén, o procedimento pelo qual a autoridade entrega as autorizações setoriais para os projetos, foram cometidas várias irregularidades desde 2008. Primeiro, foi acolhido no processo um projeto que não tinha informação da linha-base. Teve duas mil observações de órgãos públicos e 11 mil da participação da sociedade. Pelo menos quatro documentos dos serviços foram alterados semanas antes da votação. O secretário regional ministerial do Meio Ambiente teve que renunciar, porque, obviamente, não iria aprovar um procedimento desse tipo, e quatro funcionários públicos que deveriam votar tiveram que se abster porque tinham conflito de interesses com a empresa. Além disso, na avaliação não foram consideradas as observações da participação da cidadania. E na manhã do dia da votação, o ministro do Interior, Rodrigo Hinzpeter, afirmou que este projeto deve ser aprovado. Então, existe um conjunto de irregularidades que implicam uma violação do estado de direito, demonstrando como são os procedimentos transparentes no Chile. E isto representa o fracasso da institucionalidade ambiental, que acaba de ser reformada com a criação de um ministério, uma superintendência e um serviço de avaliação ambiental independente, mas que com este projeto mostrou não ser independente.
TERRAMÉRICA: A legislação ambiental chilena é muito branda?
SL: O problema é a manipulação da institucionalidade ambiental, porque a institucionalidade inclui a participação da sociedade, mas aqui não se leva isto em conta e não é vinculante.
TERRAMÉRICA: Como a HidroAysén influi no mercado energético chileno e na necessidade de ampliar sua matriz?
SL: Este projeto se baseia no monopólio dos direitos de água que tem a Endesa Itália e a Colbún (empresa pública privatizada em 1997 e adquirida em 2005 pelo grupo chileno Matte). Com base nos direitos que conseguiram em virtude do Código de Águas do governo militar (1973-1990) estão inundando dois rios da Patagônia: Pascua e Baker. Por outro lado, como as duas empresas têm presença majoritária no sistema elétrico interligado central, com o projeto HidroAyséan, passarão a dominar de 70% a 90% da geração. Isto constitui um duopólio privado que deixa fora do mercado o restante dos atores que querem participar com outras fontes de energia. A isto se soma uma série de promessas de Piñera, como chegar a 20% de energias renováveis até 2020, que não são cumpridas. O governo não está patrocinando nenhum projeto nessa direção. Tudo já está feito, simplesmente existe uma crise de credibilidade na institucionalidade e em Piñera.
* A autora é correspondente da IPS.
LINKS
“É preciso buscar alternativas para as represas de Aysén”
Mobilizados contra as megarrepresas – 2009, em espanhol
Campanha contra represas e contra o relógio – 2008, em espanhol
Projeto HidroAysén, em espanhol e inglês
Patagônia Chilena sem Represas, em espanhol, inglês e italiano
Programa Chile Sustentável, em espanhol
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.