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Recrudesce a repressão contra manifestantes

Rabat, Marrocos, 7/6/2011 – Cada vez mais pessoas saem às ruas da capital do Marrocos exigindo o fim da repressão e a adoção de reformas democráticas. “Estamos aqui para protestar contra o assassinato de Khaled al-Amari”, disse na manifestação do dia 5 um morador de Rabat, de 40 anos, que não se identificou por medo das autoridades. “Também estamos aqui porque exigimos dignidade, democracia e liberdade. Essa repressão deve acabar”, acrescentou.

No dia 2, Khaled al-Amari, de 30 anos e membro do principal grupo opositor marroquino, morreu após ser duramente golpeado por policiais durante um protesto na cidade de Safi. As autoridades negam que sua morte seja consequência direta de violência policial, embora testemunhas digam o contrário.

A repressão contra os protestos pacíficos no Marrocos agravou-se nas últimas semanas. No dia 5, a multidão chegou da Cidade Velha de Rabat pela avenida Muhammad VI, carregando fotografias do rosto ensanguentado de Khaled al-Amari. “Abaixo o despotismo. Queremos liberdade e dignidade”, “Queremos paz e liberdade”, gritavam os manifestantes. Em vários trechos da marcha se davam as mãos, sentavam na rua e mostravam símbolos de paz. “Exigimos democracia e dignidade’, disse Mohammed Aghmaj. “A polícia não está sendo violenta hoje porque houve um mártir. Mas sabemos que foi violenta no passado”, acrescentou, referindo-se à relativa calma na manifestação do dia 5.

Os protestos são parte do que se denomina Movimento 20 de Fevereiro, liderado em sua maioria por jovens que exigem reformas democráticas e o fim da repressão e da corrupção no governo, bem como medidas contra a pobreza e a desigualdade. Os protestos seguem o exemplo dos levantes da Primavera Árabe no Oriente Médio e Norte da África. Há reuniões frequentes que terminam com manifestações em todo o país. Muitos acreditam que o aumento da repressão tem o objetivo de frear os protestos devido ao referendo de 1º de julho sobre uma reforma da Constituição. A consulta foi uma concessão do rei Muhammad VI ao Movimento 20 de Fevereiro.

“A polícia recebeu ordens de quebrar pernas e cabeça dos manifestantes”, afirmou Mohamed Elboukili, da Associação Marroquina de Direitos Humanos. “Trata-se de uma situação muito perigosa. Segundo a lei, a polícia deve solicitar por três vezes que as pessoas se retirem e dar-lhes tempo de fazer isso. Mas os policiais não seguem essa norma. Atacam e batem nas pessoas. Em nossa opinião, isto não respeita o direito de se manifestar pacificamente”.

A repressão também atinge os jornalistas. No mês passado, a rede de televisão árabe Al Jazeera foi obrigada pelo governo marroquino a cessar suas operações de transmissão desde Rabat. Rachid Nini, editor do jornal El-Massa, foi mandado para a prisão por causa de seus artigos criticando os serviços de segurança, a lei antiterrorista e a corrupção no governo. A Anistia Internacional condenou a prisão, qualificando-a de “grave ataque à liberdade de expressão”. No dia 1º, dezenas de partidários se reuniram no centro de Rabat para exigir a libertação de Nini.

A Associação Marroquina de Direitos Humanos recebeu informes de que a polícia começou a ir às casas de manifestantes para ameaçá-los. “Agora estão intimidando e vigiando as pessoas”, disse Elboukili. Isto contrasta drasticamente com o tratamento policial aos que apoiam a monarquia, que também foram às ruas no dia 29 de maio, quando aconteceu uma marcha pela avenida Muhammad VI diante da sede do parlamento, na qual os participantes entoavam músicas favoráveis ao rei e carregavam seu retrato.

A mobilização aconteceu com total permissão da polícia, e os jornalistas podiam se movimentar com liberdade. Um participante da marcha, que não quis se identificar, contou que “esta manifestação tem autorização, ao contrário das outras”, numa referência às marchas do Movimento 20 de Fevereiro.

Tudo isto ocorre no contexto de um convite da Arábia Saudita ao Marrocos para integrar o chamado “clube de reis”, o Conselho de Cooperação do Golfo, que tenta proteger os interesses dos monarcas contra os levantes da Primavera Árabe. O Marrocos é uma monarquia constitucional no papel, pois na prática todo poder está consolidado nas mãos do rei, que pode designar e destituir o primeiro-ministro e o gabinete, bem como dissolver o parlamento e assumir poderes de emergência.

Muhammad VI é um estreito aliado dos Estados Unidos, que exporta armas para Rabat para que mantenha sua ocupação militar no Saara Ocidental. O rei foi elogiado pelo governo de Barack Obama por sua suposta moderação e reformas democráticas. “As coisas precisam mudar em meu país”, disse um morador de Casablanca, de 35 anos, que não se identificou. “Esta repressão assusta meus filhos. Precisamos fazer muitas coisas. Precisamos de educação e liberdade e o fim da pobreza. O povo do Marrocos exige uma mudança. Não vamos tolerar esta repressão”, acrescentou. Envolverde/IPS

* Publicado sob acordo com a Al Jazeera