O Fundo Monetário Internacional não é internacional nem democrático

Johannesburgo, África do Sul, junho/2011 – As potências europeias parecem estar decididas a perpetuar seu arbitrário “direito” de eleger o diretor-geral da Fundo Monetário Internacional (FMI) após as circunstâncias que precipitaram a renúncia de Dominique Strauss-Kahn. Apesar das afirmações feitas pelo FMI de que, agora, contrariamente ao passado, a escolha do novo diretor-geral “será feita de maneira aberta, baseada nos méritos, e transparente”, bem como o antigo compromisso de abrir esse posto para cidadãos de todos os Estados integrantes será cumprido, a maioria dos países desenvolvidos expressa clara preferência por candidatos europeus, mesmo antes das propostas abertas oficialmente no dia 23 de maio.

Entre os países em desenvolvimento e a sociedade civil prevalece a convicção de que não passam de fachada as promessas de abordar a designação do governo das instituições de Bretton Woods de maneira representativa. Os delegados das nações desenvolvidas estão em direta contravenção da recomendação explícita, que surgiu das negociações do ano passado com a sociedade civil, no sentido de a escolha ser conduzida “sem pré-seleção por parte de qualquer subgrupo de países poderosos”. Por outro lado, os argumentos apresentados por esses delegados a favor de candidatos europeus vão contra a razão e a lógica.

Em um ato de amnésia coletiva, alguns europeus argumentam que suas atuais aflições econômicas exigem a escolha de um europeu para o comando do FMI, afirmando que a objetividade era necessária no enfoque do Fundo que se seguiu à crise econômica da Ásia no final dos anos 1990. Ignoram a virada de 180 graus com os países europeus passando de contribuintes, quando a instituição foi criada após a Segunda Guerra Mundial, a receptores de ajuda, na atualidade. É um tanto irônico que a atual candidata favorita para o cargo de diretor-geral seja francesa, já que a França foi o primeiro a receber um empréstimo do FMI.

A aparente mudança de posição, declarada nas reuniões no começo deste ano, foi, na época, elogiada pelo Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz e por outros economistas progressistas, por “marcar o esforço do Fundo para se distanciar de seus antigos princípios sobre controles do capital e flexibilidade do mercado de trabalho”. Junto com a reforma do sistema de cotas, essas declarações reviveram as longamente frustradas esperanças na possibilidade de um novo FMI. O próprio Straus-Kahn defendeu uma cooperação maior para conjurar os piores efeitos da crise financeira. “Estamos, agora, em um mundo interligado que não deixa espaço para soluções locais para desafios globais, que são decididos por alguns países sem levar em conta as consequências que outros podem sofrer”, afirmou.

Tal cooperação é improvável quando se percebe que o diretor-geral serve aos interesses de uns poucos países. Como disse Jesse Griffiths, do Bretton Woods Project, “o diretor do FMI deve ser – e dever ser visto como – independente de governos poderosos e ser especialista nos problemas dos países de baixa e média rendas, nos quais acontece a maioria das operações do Fundo. Essas operações deveriam mostrar um compromisso para reduzir os níveis de desigualdade e pobreza globais”.

Os países em desenvolvimento e as economias emergentes, que contam com a maior parte da população mundial e mais da metade da produção mundial, e que estão sendo pressionados para que aumentem suas contribuições de capital, terão um peso insignificante na decisão do FMI para escolher o novo diretor-geral, a menos que desejem adotar uma firme postura coletiva a favor de um candidato de consenso.

Os países desenvolvidos com visão de futuro também fariam melhor em olhar além de seus interesses estreitos, provincianos e de curto prazo em suas opções, pois, do contrário, arriscarão uma posterior erosão da legitimidade do Fundo no momento em que a falta de confiança de seus acionistas poderia afetar fatalmente seu papel potencial na urgente reforma do sistema monetário internacional. Nas palavras da porta-voz da Oxfam, Sarah Wynn-Williams, “o único caminho para dar legitimidade e autoridade ao novo diretor-geral do FMI é por meio de uma votação aberta, com o ganhador apoiado por uma maioria de países, não precisamente por uma maioria de cotas. Chegou a hora de o FMI aceitar um enfoque aberto e baseado nos méritos para eleger seus dirigentes”. Envolverde/IPS

* Ingrid Srinath é secretária-geral da Civicus – Aliança Mundial para a Participação da Cidadania.