Historiador cultural critica a “googalização” do mundo

The Googlization of Everything, de Siva Vaidhyanathan, 296 pp., edição da University of California, R$ 61,72; em inglês, no site Livraria Cultura e na Amazon (versão impressa e para Kindle); reproduzido da Folha de S.Paulo, 26/5/2011; intertítulos do OI

Dê um google no Google e você terá mais de seis bilhões de resultados. Criado há 13 anos, o site hoje é muito mais que um buscador. É um filtro do mundo, segundo Siva Vaidhyanathan, 45, especialista em história cultural e professor da Universidade de Virgínia, Estados Unidos. Ele é autor de The Googlization of Everything and Why we Should Worry (A Googalização de Tudo e Porque Devemos nos Preocupar”), lançado em março nos Estados Unidos. Vaidhyanathan define-se como um dos primeiros usuários do site e teve a ideia do livro depois que soube de um plano do Google de digitalizar bibliotecas universitárias.

“Parecia muito controle para uma empresa só. Fiquei preocupado e resolvi investigar a companhia e a nossa relação com ela.” Em entrevista à Folha, ele fala como o Google é onipresente, onipotente e onisciente “mas isto não faz com que seja benevolente”. Para o autor, devemos sempre nos perguntar: “Por que essa lista de resultados, e não outra?”

Vivemos em um mundo “googalizado”, além de globalizado?

Siva Vaidhyanathan– Sim, as duas coisas. A tecnologia é parte da cultura, ela nos influencia da mesma forma que nós a influenciamos. E o Google é mundial. Ainda não é universal, mas está a caminho de ser.

Qual a consequência dessa “googalização”?

S.V.– Cada vez mais, o Google muda a forma como vemos o mundo e como julgamos a informação. Para muitos, o site é fundamental para tomar decisões e muitos dependem dele para isso. Mais do que isso: o Google gere a nossa reputação. Ele gerencia as fontes de informação que encontramos. E as formas de comércio.

E revolucionou a internet?

S.V.– Certamente. Antes do Google, a World Wide Web, que era apenas uma função da internet entre muitas outras, era incontrolável. Era difícil de navegar e, muitas vezes, desagradável. O Google fez da web um meio razoável e organizado. Ele deixou a minha vida e a vida de muitas pessoas mais fácil.

Isso não é positivo?

S.V.– Pode ser. É uma boa empresa e faz um bom trabalho. Mas é uma empresa. Não devemos adorá-la só porque faz um bom trabalho. Devemos respeitá-la, mas não adorá-la. E o que ela fez de positivo no passado não determina necessariamente o que vai acontecer no futuro.

Mas adoramos o Google?

S.V.– Existe uma certa mística em torno dele. As pessoas usam o site sem saber como ele funciona e sem questionar os resultados. A maioria o usa cegamente.

Por isso você fala em desmistificação?

S.V.– As pessoas precisam perceber que o Google é falível porque é uma empresa construída e dirigida por seres humanos. E deve lucrar. Este é o primeiro objetivo. Nós cometemos um grande erro ao esquecermos isso e confiarmos cegamente. O Google fez muitas coisas boas para o mundo, mas isto é uma feliz coincidência.

Então como devemos usá-lo?

S.V.– Quanto melhor entendermos como ele funciona, melhor poderemos corrigir a tendência que ele tem de nos dar respostas rasas, resultados rápidos que são projetados para ajudar a consumir coisas, em vez de entender coisas. O Google é bom para uma pesquisa rápida, perguntas triviais. Não é bom para a profundidade, questões complexas, como debates científicos ou políticos.

Você acha que as pessoas deveriam parar de usar o site?

S.V.– Elas podem fazer várias buscas diferentes. E devem começar a procurar e conhecer serviços que atendam necessidades específicas, como pesquisa científica ou dúvidas em saúde. E podemos voltar a usar as bibliotecas públicas regularmente. Profissionais treinados ainda são o melhor jeito de encontrar informações úteis sobre assuntos complexos.

Como você vê o futuro do Google e da internet?

S.V.– A internet certamente mudou nossas vidas quase instantaneamente. Mas nós podemos perder a liberdade e a abertura que ela nos permite se não lutarmos para preservá-la. Há governos e empresas que gostariam de controlá-la. Uma saída é termos alternativas múltiplas de pesquisa e esforços do governo para sistemas de informações claros e abertos.

* Publicado originalmente no site Observatório da Imprensa.